Por José de Castro

SÃO PAULO (Reuters) – Os preços do dólar e das taxas de juros não estão tão distantes de onde deveriam, mesmo considerando o elevado prêmio de risco em ambos, já que a aguda incerteza sobre o futuro das contas públicas continua a desafiar elaboração de cenários e desestimula grandes posições estruturais nesses mercados, disse Bruno Marques, sócio e gestor dos fundos multimercados macro da XP Asset.

O dólar estava nesta sexta-feira em torno de 5,61 reais, e várias casas de análise dizem que o real ou é ou está entre as moedas mais baratas do mundo. E no mercado de DI os juros de longo prazo já se aproximam de dois dígitos, muito distantes da taxa de 2,75% da Selic atual.

“A situação do governo não é fácil. Temos visto um governo frágil e flertando com medidas não responsáveis, diria”, afirmou o gestor. “Chamam atenção a completa falta de urgência de que temos um problema fiscal muito grande e o flerte constante com o abismo.”

Marques disse que os preços de mercado já indicam para o fim de 2022 uma Selic em torno de 8%. Na curva a termo, os contratos em vencimentos mais dilatados apontam taxas entre 9% e 9,5%.

“Existe esse prêmio sobre o juro terminal, só que não é um prêmio tão extraordinário assim. Você imagina que um país de dívida alta vai estar sempre premiado”, afirmou o gestor, calculando que esse juro a mais aqui dificilmente fica abaixo do intervalo entre 150 pontos-base, 200 pontos-base.

O ganho de prêmio também é visto na inflação. Segundo ele, a inflação implícita de longo prazo já está em 5,20%, bem acima da meta.

A incerteza sobre o cenário fiscal em meio a crises “sem fim e a cada 48 horas” levou Marques e seu colega de gestão Julio Fernandes a zerarem posições em juros.

“É a primeira vez em cinco anos que não temos posição no mercado de juros. Sempre tem oportunidade; agora, não”, afirmou Marques, referindo-se aos fundos macro geridos pela dupla.

Entre fundos com mandato exclusivo para juros, há posição aplicada em DIs curtos e intermediários “para tentar monetizar esse prêmio”.

“Os prêmios são altos por fundamento. Não tem nenhuma urgência da classe política de impedir o que parece ser a morte certa. Se a gente não fizer nada, a gente vai bater no muro, a gente vai bater no muro e vai pegar fogo”, alertou. “Assusta a completa falta de urgência nesse cenário”, reforçou o gestor.

CÂMBIO COMO HEDGE

A falta de certeza para operar no mercado de juros se estende ao de câmbio, segundo Marques, e o viés atualmente é de usar o dólar como proteção.

“A gente tem tentado manter posições compradas em dólar, porque nos protegem na posição que a gente acha que é a única posição boa em Brasil, que é a posição comprada em bolsa”, afirmou o gestor. “A melhor alocação no Brasil, na nossa opinião, é comprada em bolsa e buscando proteção.”

Mesmo a alta de juros não deve reverter o curso do real, que cai 7,8% ante o dólar neste ano, num dos piores desempenhos globais.

“Acho que (a alta de) juros afeta um pouco o real, os juros até pioraram mais que o câmbio no ano, mas não acho que vai ser uma Selic de 5% que vai resolver isso. Nosso problema não é só juros, até porque o mercado já precifica isso (alta da Selic). Já tem bastante coisa no preço”, ponderou.

Para Marques, o mercado está atualmente numa situação em que se agradaria com um movimento do governo de “voltar para o zero”.

“Neste primeiro momento só de você tirar as pressões negativas o mercado já melhora. Só de não ter risco de caminhar para o lado errado já melhora”, disse, referindo-se ao cumprimento do teto de gastos e à elaboração de peças orçamentárias “não criativas”.

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