Por Maria Carolina Marcello

BRASÍLIA (Reuters) -O ex-secretário de Comunicação Social da Presidência da República Fabio Wajngarten evitou confirmar à CPI da Covid trechos de declarações em que responsabilizou o Ministério da Saúde pelo atraso na vacinação, publicadas pela revista Veja em abril deste ano, e relatou episódio sobre carta da Pfizer encaminhada a diversas autoridades do governo federal que ficou dois meses sem resposta.

No depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), Wajngarten afirmou que “alguém” informava Jair Bolsonaro de forma errada por “incompetência” ou “dolo”, reforçando tese em estudo pelos senadores sobre um comitê paralelo de aconselhamento do presidente da República.

O ex-secretário confirmou à CPI que a farmacêutica encaminhou no início de setembro carta ao presidente Jair Bolsonaro e aos ministros da Economia, Paulo Guedes; da Saúde, Eduardo Pazuello; e da Casa Civil, Braga Netto, além do vice-presidente Hamilton Mourão e o embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Nestor Forster. O documento, segundo Wajngarten, alertava para a necessidade de a negociação ser tocada com celeridade, diante da demanda mundial por vacinas.

Ainda assim, em novembro, a carta não havia sido respondida, motivo pelo qual Wajngarten tomou a iniciativa de entrar em contato com um representante da Pfizer em Nova York. Em seguida, o ex-secretário teria recebido telefonema do presidente da Pfizer no Brasil, Carlos Murillo, e imediatamente dirigiu-se ao gabinete do presidente da República, Jair Bolsonaro.

Bolsonaro, contou Wajngarten no depoimento, estava reunido com o ministro da Economia. Guedes teria manifestado-se favorável à compra da vacina, enquanto Bolsonaro teria sinalizado que uma vez aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), os imunizantes seriam comprados.

“Eu falei: ‘presidente, estou com o presidente da Pfizer na linha’. Ele despachava com o ministro Paulo Guedes nesse momento. O ministro Paulo Guedes fala, abre aspas: ‘É esse o caminho. É esse o caminho. O caminho são as vacinas’, fecha aspas. Paulo Guedes, ministro Paulo Guedes, conversa rapidamente com o presidente da Pfizer. E o presidente escreve num papel: ‘Anvisa. Uma vez aprovado pela Anvisa, nós vamos comprar todas as vacinas’. Uma conversa breve, uma conversa rápida, desligou, cumprimentou, e eu desci e voltei para a minha sala. Isso aconteceu no 9 de novembro”, explicou.

Wajngarten relatou ter se encontrado dias depois com Murillo. Depois, teve mais dois encontros com representantes da empresa e, por isso, nega que tenha participado ativamente das negociações ou tratado de termos ou valores. Admitiu à CPI, no entanto, que trabalhou para aumentar o volume de doses e reduzir o prazo de entrega. Também relatou que havia insegurança jurídica e que a empresa impunha três cláusulas que tornavam a decisão difícil.

A Veja traz citação de Wajgarten dizendo que a “gota d’água” para sair do governo teria sido motivada por, em meio a duelo com o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, insinuações que o chefe da Secom estaria se envolvendo em assuntos do ministério movido por “interesses pessoais inconfessos”. A revista informa que o ex-chefe da Secom reuniu-se com diretores da Pfizer, discutiu cláusulas, negociou preços, obteve compromissos de antecipação de lotes, mas o acordo não prosperou.

O ex-secretário não confirmou ter atribuído os atrasos na vacinação contra a Covid-19 a Pazuello e sua equipe, ao contrário do que sugere, inclusive, a manchete da Veja, que acabou divulgando parte do áudio da entrevsta nesta quarta-feira.

“A manchete serve para vender a tiragem, a manchete serve para trazer audiência, a manchete serve para chamar a atenção, conforme a gente conhece”, disse à CPI.

O ex-secretário se esquivou de responder quem “dificultou” as negociações para a compra das vacinas.

“Desconheço, presidente. Desconheço, senador”, disse.

“Não participei da negociação, senador, em nenhum momento”, mais de uma vez questionado sobre quem teria dificultado as negociações.

Em áudio divulgado pela Veja nesta tarde, Wajngarten teria dito, questionado se havia ocorrido negligência ou incompetência do governo, particularmente do Ministério da Saúde, segundo a revista, que foi “incompetência, incompetência; quando você tem um laboratório americano com cinco escritórios de advocacia apoiando na negociação e você tem do outro lado um time pequeno, tímido, sem experiência, é 7 a 1”.

Wajngarten afirmou que nessas conversas iniciais a Pfizer teria oferecido “irrisórias” 500 mil doses e não 70 milhões, como traz a entrevista da Veja.

Ainda sobre o episódio da Pfizer, Wajngarten disse à revista que gaurdou emails, registros telefônicos, e cópias de minutas do contrato, além de contar com testemunhas do gabinete presidencial. À CPI, no entanto, referiu-se aos emails e informou que estavam armazenados no computador funcional da Secom.

Wajngarten também tomou cuidado para não se indispor com o presidente Bolsonaro. Repetiu em diversas ocasiões que o presidente havia se comprometido a comprar qualquer imunizante que fosse aprovado pela Anvisa.

Também evitou responder objetivamente sobre comentário sobre declarações de Bolsonaro questionando os efeitos da vacina ou anunciando que não iria se submenter ao imunizante.

“Eu citei frases do presidente da República e perguntei, na avaliação do Secretário de Comunicação, de que forma essas frases impactaram a população”, disse o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL).

E o ex-secretário de Comunicação respondeu: “Eu não sei qual é o alcance de uma fala presidencial, senador. A fala de um presidente da República é carregada pelos veículos de comunicação que a exibem.”

“A população brasileira recebe inúmeras mensagens de diferentes meios e de diferentes conteúdos, senador. O discurso presidencial é um. A televisão, a narrativa, o rádio… É um complemento de informações que vai resultar na tomada de decisão da população brasileira. Impacta? Impacta. É único? Não, não é.

O senhor está perguntando objetivamente: eu sou a favor da vacina? Sou”, afirmou.

As respostas muitas vezes pouco objetivas do depoente provocaram reações e o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), o alertou que estava ali na condição de testemunha, mas poderia ser reconvocado como investigado.

Ao ser confrontado com divergências entre suas respostas, o áudio da Veja e informações colhidas pelos senadores em lives das quais o ex-secretário participou enquanto esteve afastado por estar contaminado com a Covid, Wajngarten foi lembrado por diversos senadores que poderia ser preso por faltar com a verdade na CPI.

(Reportagem de Maria Carolina MarcelloEdição de Pedro Fonseca e Maria Pia Palermo)

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