A imagem do ônibus espacial Columbia transformado em duas gigantescas bolas de fogo rasgando o céu do Texas, no sábado 1º, não causou apenas comoção pela certeza da morte dos sete tripulantes. O desastre também abalou fortemente o programa espacial, uma das maiores fontes de orgulho para os americanos, e colocou uma bilionária indústria em sobressalto. A Agência Espacial Americana (Nasa) investiga a causa do acidente e suas conclusões poderão influir no destino de dezenas de empresas e milhares de empregos. O que se sabe de concreto, por enquanto, é que fragmentos do tanque de combustível atingiram a asa esquerda, danificando a proteção térmica do Columbia. Sabe-se também que o presidente dos EUA, George Bush, fará o que puder para manter os projetos da Nasa e as receitas da indústria aeroespacial ? uma das grandes patrocinadoras de sua campanha. Respaldado por uma pesquisa do instituto Gallup, mostrando que 82% da população pedia a manutenção do programa espacial, o presidente americano George W. Bush agiu rápido. Mandou investigar a fundo o episódio. Suspendeu os vôos tripulados (a Atlantis seria lançada em 1º de março). Garantiu a continuidade do projeto do ônibus espacial ? o mais caro e que consome US$ 4 bilhões por ano ? e os demais programas tocados pela agência. Por fim, determinou uma injeção imediata de US$ 500 milhões no orçamento da Nasa, aumentando-o para US$ 15,47 bilhões. ?A jornada da América no espaço continuará?, disse Bush.

Os atrasos, porém, serão inevitáveis. As operações foram paralisadas até que as falhas do Columbia sejam esclarecidas ?, o que poderá prejudicar as principais indústrias aeroespaciais do mundo. ?Um único contrato suspenso influencia toda a cadeia de fornecedores?, disse à DINHEIRO o major Marcos Pontes, astronauta brasileiro que realiza treinamento na Nasa. Os investidores também reagiram mal à tragédia. No primeiro pregão após o acidente (na segunda-feira 3), as ações da Boeing Company e da Lockheed Martin (sócias da United Space Alliance, que coordena outras 120 empresas de médio e pequeno portes), tiveram quedas significativas. A mais afetada foi a Alliant Techsystems, cujos papéis desabaram 11,7%, enquanto as ações da Lockheed e da Boeing recuaram 2,9% e 2%, respectivamente. A Boeing, uma gigante de US$ 54 bilhões, é quem fabrica o ônibus espacial. A empresa embolsa US$ 2 bilhões por ano com os serviços prestados à agência. Já a Lockheed, que faz o tanque externo de combustível, recebe anualmente da Nasa uma bolada de US$ 700 milhões. Sua receita global atinge US$ 26,2 bilhões. A Alliant, por sua vez, produz propulsores e arrecada 18% de suas vendas totais em contratos com a Nasa. Outras como a Moog Inc., MacDonald Settwiler e Spacehab, consideradas ?nanicas? do setor, também viram seus papéis desabar. Todas, independentemente do tamanho, ficaram com a imagem arranhada.

Desgaste. Em entrevista à DINHEIRO, Jessica Rye, porta-voz da United Space Alliance, disse que a direção da companhia não definiu qualquer correção de rumo no projeto. ?Ainda é cedo para falar dos impactos que o acidente terá em nossas finanças e também da possibilidade de demissões?, argumentou. Ao que tudo indica o desgaste na imagem destas companhias deverá ser revertido em breve. Até porque seus executivos sabem que, passada a comoção e a fase mais aguda das investigações (técnicos da Nasa tentam juntar os 2,5 milhões de partes que compõe a Columbia que, na queda, espalharam-se entre a Louisiana até a Califórnia), o ritmo de trabalho só voltará ao normal após passar por fortes ajustes. Foi assim após a explosão da Challenger, em 1986, que também causou a morte de sete astronautas. As investigações foram minuciosas e os lançamentos só foram reativados após 32 meses.

Além de seus interesses específicos no espaço (que incluem programa ?Guerra nas Estrelas? e as missões não-tripuladas
para outros planetas), os EUA lideram o ambicioso projeto da Estação Espacial Internacional (ISS, sigla em inglês). Orçado em
US$ 96 bilhões, o consórcio reúne 15 países, dentre os quais o Brasil, que comprometeu-se a investir US$ 120 milhões na
fabricação de seis equipamentos, tais como módulos de carga
(pallet express) e controladores de temperatura. Em troca, o País poderá utilizar a ISS para fazer experiências, além de incluir um astronauta brasileiro no programa. ?A tragédia da Columbia não afetará o contrato brasileiro com a Nasa?, garante Múcio Dias, presidente da Agência Espacial Brasileira. Segundo ele, o projeto é vital para a indústria aeroespacial do País. ?A participação na ISS carimba o passaporte das nossas empresas para ingressarem na carteira de fornecedores da Nasa?, avalia.

Apesar do comprometimento brasileiro, o contrato assinado em 1997 ainda está na fase embrionária. Estudos conduzidos pela Embraer, no começo de 2002, indicaram que a produção de apenas um dos pallets custaria US$ 140 milhões. Por conta disso, o governo brasileiro criou uma comissão que está renegociando com a Nasa a participação brasileira. ?A situação está bem encaminhada?, limita-se a dizer Dias. A entrega dos equipamentos se dará em 2005 e sua instalação na ISS a partir de 2006. Até lá espera-se que nenhum novo acidente coloque novamente em xeque a credibilidade do programa espacial americano.