Quando decidiu produzir um vinho à sua maneira, o argentino Juan Pablo Lupiañez começou com uma barrica. Metade virou vinagre, como ele mesmo reconhece. Corrigidos os erros iniciais, a produção passou para 12 barricas nos anos seguintes. Nas últimas seis safras, foram 90, com um volume anual entre 10 mil e 14 mil garrafas, exportadas para diversos países, do Peru à Turquia. No Brasil, o Lupa Malbec chega pela Boca a Boca, importadora boutique do casal Franco Giorgiutti e Juliana Hage. Ele é argentino, ela, brasileira. Os dois receberam em sua casa, em São Paulo, o produtor do Lupa para uma degustação das safras de 2015 a 2018. Vendido a R$ 480, o vinho surpreende pela personalidade e elegância. Foge bastante do padrão consagrado em Mendoza, com Malbecs quase sempre fáceis de beber, com muita fruta e dulçor, baixa acidez e taninos macios.

Assessor global marketing complexo enólogo top pontuação. (Crédito:Divulgação)

No Lupa, o vocabulário é outro. Seu criador riscou do dicionário tudo de que não gosta no mundo do vinho. E estampou isso no rótulo. A primeira palavra banida é “assessor”, cargo de quem referenda o vinho, mesmo sem prová-lo, para ser comercializado. A segunda, “global”, no sentido de padronizar a bebida para atender a um gosto internacional. A terceira, “marketing”, que dispensa explicações. A quarta, “complexo”, termo que a crítica adota sem parcimônia nem clareza. A quinta, “enólogo top”, é aquele profissional cuja autoimagem se sobrepõe ao que elabora. E, por fim, “pontuação”, que segundo Lupiañez é “a maior mentira do mundo do vinho”. Pois mesmo com tanta provocação, esse winemaker que faz questão de dizer que não é enólogo tem recebido elogios pela qualidade do que engarrafa. E ele tem uma explicação na ponta da língua para suas escolhas, tanto na garrafa quanto dentro dela.

Depois de ter trabalhado na área comercial de uma grande vinícola de sua Mendoza natal, Lupiañez largou tudo para se dedicar aos vinhedos da família, plantados há mais de 60 anos em Paraje Altamira, a 1.180 metros de altitude. Ali, onde o clima é mais frio que a média da região e o solo rico em minerais, ele definiu as parcelas de vinhedos que considera de “maior caráter” para praticar uma viticultura natural, sem químicos. A vinificação é com leveduras indígenas e o tempo em barricas varia conforme as condições da safra. Depois da passagem por madeira, que dura 20 meses, o vinho permanece outros 18 em garrafa. Assim, a excelente safra 2018 só está chegando ao mercado agora. “Minha obsessão é fazer vinhos ricos. E a maior frustração, um vinho que as pessoas não queiram beber até o fim.” Esse risco o Lupa não corre.