Aos 66 anos, a executiva Ângela Tamiko Hirata, a mulher que calçou o mundo com “as legítimas” Havaianas, gosta de dizer que a palavra impossibilidade não existe. Mesmo aposentada desde 2005, diariamente, das 9h às 19h, ela se divide em quatro funções em empresas diferentes. Ângela é diretora de marketing da rede de artigos domésticos Camicado, consultora de comércio exterior da São Paulo Alpargatas, dona de 20% das ações da Amazonlife, que fabrica acessórios de moda com produtos extraídos da Amazônia, e acionista-investidora do Suriana, escritório de importação e exportação baseado em São Paulo e que fatura cerca de R$ 2 milhões por ano. 

 

É o seu escritório que arquiteta a vinda de um dos nomes mais cultuados do mundo fashion: seu amigo e e estilista japonês Kenzo Takada. “Ele pensa em lançar produtos em conjunto com empresas brasileiras. Mas estamos em fase de negociação. Ainda não posso abrir nada”, desconversa Ângela. 

 

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A executiva trabalha em quatro empresas e ainda tem tempo para as netas

 

Em agosto, Takada esteve no País para uma palestra e falou sobre esse desejo de viabilizar parcerias comerciais com empreendedores brasileiros. Ele não pode usar sua marca de moda, Kenzo, pois a vendeu ao grupo francês LVMH. Mas criou a grife de decoração Gokan Kobo e tem o desejo de produzir uma linha de jeans. 

 

Formada em administração com ênfase em comércio exterior pela Universidade de São Paulo (USP), Ângela, a mais velha de 13 irmãos, afirma ter herdado do avô – imigrante japonês que chegou ao Brasil em 1929, após perder tudo no crash da Bolsa de Nova York – o espírito empreendedor e a hiperatividade. 

 

Sua alma incansável não foi abatida nem mesmo quando enfrentou quatro cânceres, um atrás do outro, ao longo de cerca de cinco anos. Em 2002, no auge de sua carreira à frente da diretoria de comércio internacional da Alpargatas – ela foi a primeira mulher a assumir um cargo de direção na empresa –, enfrentou o primeiro: no útero. Depois, precisou remover o cólon do intestino. 

 

A doença resolveu então atacar uma de suas mamas. Por último, um tumor na tireoide apareceu. Apesar de todos esses golpes, Ângela não suspendeu sua extensa agenda de trabalho e conciliava as sessões de quimioterapia com viagens e reuniões. “Descobri que a doença pode ser controlada pela mente. Por isso, continuei trabalhando. Trabalhar foi o que me curou”, diz. Sem se abater, Ângela realiza a cada trimestre uma bateria de exames preventivos.

 

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As novas conquistas de Ângela Hirata: seu trabalho levou o brasileiro miolo lote 43 até o Japão. 
Bolsa da braccialini feita com o látex da amazonlife (e 300 na Europa e na ásia)

 

Acumular vitórias sempre foi uma rotina para a executiva. Ela foi a única mulher a palestrar no evento HSM Group, no Forum Milan 2008 em World Business, sobre a importância do posicionamento e internacionalização de marcas. Uma situação que conheceu bem quando foi diretora da Alpargatas. 

 

Em um ano, a executiva colocou as Havaianas na vitrine da Galeria Lafayette, um dos endereços comerciais mais famosos de Paris. Depois de ter três passaportes preenchidos por carimbos de mais de 80 países, que visitou a negócios, agora, sua missão é colorir o mapa-múndi de verde e amarelo com outros produtos brasileiros. 

 

A começar pelos vinhos. Na Suriana, Ângela comercializa, com a ajuda da equipe, as bebidas de vinícolas associadas ao Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin). Seu principal cliente é a Miolo, que ela já levou a lojas nos EUA, Canadá, Colômbia, Ásia, Japão e Austrália. “Temos um clima diferente e precisamos explorar essa característica, enquanto boa parte do resto do mundo faz vinhos de climas frios.” 

 

Outro xodó da empresária é a Amazonlife, empresa controlada por Ângela e pelo italiano Paolo Del Pino. A marca foi licenciada pela grife Braccialini, de Florença, para produzir bolsas com design italiano e látex da Amazônia. Os produtos chegam às vitrines de luxo europeias e asiáticas por € 300. 

 

A mira de Ângela não está apontada apenas para os produtos nacionais. Ela também se mexe para trazer de fora produtos de excelência em suas aéreas, como o famoso tecido inglês produzido pela Liberty Art Fabrics (caracterizado por estampas de flores miúdas, inventado por Arthur Lasenby Liberty no século XIX) e o veludo italiano pontoglio, usado pelos estilistas brasileiros Ricardo Almeida e Pedro Lourenço em suas coleções.

 

Divorciada, a executiva namora um empresário estrangeiro há 20 anos. “Eu o vejo pouco, o que é saudável”, comenta. Aos 66 anos, Ângela bem que poderia curtir os filhos Emerson, 40 anos – gerente de desenvolvimento da Pênalti –, Lincoln, 33 – que trabalha com as grifes Alexandre Herchcovitch e Osklen –, e as netas Lissa, 4 anos, e Louise, 9 meses. Mas não. “Na minha idade, ainda recebo convites de trabalho”, diz. O último foi para dirigir o departamento de marketing da Camicado, que prontamente aceitou.