Só Deus sabe o que está acontecendo com a Vasp desta vez. Na manhã da sexta-feira, 16, a Convenção Nacional das Assembléias de Deus no Brasil e no Exterior (Confader) anunciou a compra do controle acionário da empresa de Wagner Canhedo. Em um fax enviado às redações, a Confader prometeu dar detalhes, à tarde, em uma entrevista coletiva de seu presidente, o bispo Estevão Martins de Souza Coutinho, no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Na Vasp, a assessoria de imprensa da companhia passou o dia a desmentir o negócio. ?Isso não é verdade, é uma loucura. Vou chamar a polícia para essa coletiva?, afirmava o porta-voz da Vasp, José De la Peña. A confusão permaneceu até o início da noite, quando tudo parecia ter mudado. Coutinho não apareceu para a entrevista. Já Canhedo, recolhido em sua fazenda às margens do rio Araguaia, em Goiás, informou a DINHEIRO: ?As negociações existem, mas até agora não chegou nada na nossa conta?.

Toda a confusão não surgiu por acaso. Vasp e evangélicos vêm negociando há mais de um mês. Na madrugada de sexta-feira, teriam chegado a um acordo e até um cheque, no valor de US$ 20 milhões, teria sido emitido pelos pastores como forma de sinal. A causa do imbróglio foi a precipitação dos bispos. Na mesma madrugada, contrataram a assessora de imprensa Anice Aun e encomendaram a divulgação do negócio. Esqueceram, no entanto, de comunicar à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e ao Departamento de Aviação Civil (DAC), que deveriam ser os primeiros a saber. Para não sofrer represálias, a Vasp negou. E a Confader ficou falando sozinha. Nas três horas que separaram o aviso da coletiva e o encontro com representantes da Confader, a própria Anice não sabia o que dizer aos jornalistas que ligavam para o seu escritório. No último fax avisou que o presidente da Confader, o bispo Coutinho, seria substituído pelo advogado Mário Augusto Marcusso. Ao fim do texto, se eximiu de qualquer responsabilidade sobre o que acontecesse a partir daquele momento, inclusive na própria coletiva.

No meio da turbulência, uma pergunta era feita: o que é a Confader? De todas fontes ouvidas pela DINHEIRO, principalmente entre evangélicos, ninguém tinha informações sobre a convenção. O deputado federal Philemon Rodrigues se mostrou surpreso com a notícia. ?Sou pastor há mais de 40 anos e desconheço esta entidade?. O pastor Samuel Ferreira, líder de outra entidade evangélica, a Convenção Geral das Assembléias de Deus, disse que nunca ouviu falar da tal convenção. Já sobre Coutinho, o líder da Confader, as referências não são as melhores. ?Estevão é um trambiqueiro?, afirmou categoricamente o pastor Manoel Ferreira, pai de Samuel e há 45 anos na Assembléia de Deus. Ele lembra que Coutinho foi o criador no ano passado do Sindicato dos Pastores. Bem articulado, conseguiu até um registro no Ministério do Trabalho, cancelado mais tarde por pressão de uma comissão de pastores.

Entre os religiosos, há quem diga que a Confader não passaria de uma manobra da poderosa Igreja Universal do Reino de Deus. A estratégia seria criar uma entidade de fachada desviando a atenção da Receita Federal sobre a Universal. A igreja do bispo Edir Macedo, segundo fontes do setor de aviação, teve sim uma conversa com Canhedo, e só não bateu o martelo porque não pôde fazer uma auditoria na Vasp. Diante dos boatos, Macedo tratou também de desmentir, através de uma nota veiculada na sexta à noite após o Jornal da Record, emissora de sua propriedade. Na mesma sexta-feira, houve quem garantisse que entrou no caixa da Vasp um sinal de US$ 20 milhões pela compra, outros disseram que o valor inicial seria maior, de US$ 100 milhões, ou 25% do total do negócio, que seria concluído até setembro, quando o fundador da empresa se afastaria definitivamente dos negócios. O católico Canhedo confirmou que está negociando um acordo operacional para dar desconto aos evangélicos nos vôos da Vasp e disse acreditar que a conversa pode até avançar para a venda do controle acionário. ?Mas nós ainda nem chegamos nesse assunto?, garante. Ele nega que tenha conversado com a Universal antes de chegar ao pessoal da Assembléia de Deus. E acrescenta que também está conversando com empresas estrangeiras que, segundo as leis brasileiras, poderiam comprar até 20% de participação. ?Seria uma forma de a companhia ser capitalizada?, afirma Canhedo, dono de um passivo, segundo ele mesmo, de R$ 2,1 bilhões.