A variante Gama (P.1), surgida em novembro de 2020 na cidade de Manaus, é mais letal que a cepa originária do novo coronavírus, como aponta estudo realizado no Brasil e divulgado nesta semana. Na pesquisa, amostras de pacientes de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, coletadas entre outubro do ano passado e junho de 2021, mostraram como a introdução da P.1 na região foi extremamente rápida, deslocando outras variantes em circulação, que predominavam na região.

A cepa foi associada ao aumento de 127% de casos graves e de 162% de mortes entre março e abril deste ano na cidade do interior paulista. Estes dados são reforçados pela situação caótica de Manaus no início do ano. Nos meses de janeiro a fevereiro, a P.1 compunha 9,7% das amostras registradas na cidade. Em pouco mais de um mês, ela chegou a 96,4%.

Variante Delta: o que cada vacina pode fazer por você

Simultaneamente, essa introdução teve impacto na gravidade dos casos ao longo do tempo, especialmente entre pessoas com menos de 70 anos, grupo no qual houve aumento de 109% nos casos graves. Nos que têm mais de 70 anos, o porcentual foi de 19%.

O estudo foi realizado em conjunto pelo Laboratório de Pesquisas em Virologia da Famerp no Hospital de Base de Rio Preto, pela Unesp, pela USP e pela Secretaria Municipal de Saúde de São José do Rio Preto, além da Fundação Bill & Melinda Gates e das Universidades de Washington e do Texas. O estudo foi divulgado na plataforma medRxiv, mas ainda não passou por revisão.

A variante Gama continua sendo a cepa de maior prevalência em amostras sequenciadas no País. Apesar disso, a variante Delta tem avançado nas últimas semanas, com crescimento expressivo em locais como a cidade do Rio e a Grande São Paulo.

A pesquisa também mostrou que os casos graves e as mortes pela covid-19 foram reduzidos pela vacinação, conforme outros estudos realizados no mundo. O estudo ainda revelou que vacinados transmitem menos o coronavírus, uma vez que o sistema imune combate melhor a infecção e impede que a transmissão ocorra com cargas virais altas.

Segundo o pesquisador Wasim Syed, criador da Liga de Ômicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da USP, é preciso ter um olhar com cuidado os dados. “Interessante notar que, olhando esses dados, somos levados a pensar que a P.1 atinge, por si mesma, mais jovens do que idosos”, diz Syed. “Mas não é necessariamente verdade. Isso também aconteceu por causa da vacinação (dos idosos), que na época já vinham recebendo doses de Coronavac e Astrazeneca.”

Isso pode se traduzir também na imunidade de grupo – a chamada imunidade de rebanho -, em que vacinados protegem pessoas que não puderam tomar as doses. Syed reforça que são os imunizantes promovem esse efeito, e não o tratamento precoce.

“O interessante do estudo é ver de perto, com dados brasileiros e com cientistas brasileiros, isso tudo acontecendo”, afirma o pesquisador. “É um ótimo estudo para mostrar aos ainda negacionistas que vacinas funcionam e mortes podem ser evitadas com essa ferramenta.”