Pensar em telemarketing remete, quase que instantaneamente, à imagem de grandes galpões de call center, lotados de funcionários, estações de trabalho, centenas de computadores, atendentes com seus tradicionais headphones e gerúndios à vontade – “vou estar encaminhando”, “vou estar verificando”, “vou estar transferindo”. Quase tudo isso, menos o gerúndio, mudou. Com o isolamento social, a Atento, líder do setor de contact center no mercado brasileiro, teve de colocar em home office 72 mil dos seus 150 mil funcionários em todo o mundo – dentro desses números o Brasil tem metade dos empregados (75 mil) e um pouco mais da metade de quem entrou em trabalho remoto (37 mil). Com isso, os 70 centros de atendimento da companhia no País ficaram ociosos. “Tivemos de ir muito além da logística”, afirmou o CEO da empresa com sede em Madri, Carlos López-Abadía. “Depois do desafio inicial, agora passamos a buscar parcerias com startups para aprimorar a inovação e o desenvolvimento tecnológico.”

A digitalização dos processos operacionais e a incorporação de novas tecnologias serão essenciais para o sucesso do plano da Atento. No ano passado, a empresa investiu US$ 45 milhões na aquisição e desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial para garantir o bom funcionamento do atendimento de forma remota.

O porcentual de 48% dos funcionários em home office deve aumentar nos próximos anos, de acordo com os novas demandas de convívio social, segundo López-Abadía. E mais pessoas chegarão ao time. A Atento afirma que vai contratar mais 4 mil pessoas no Brasil este ano para trabalhar em um grande contrato, ainda sob sigilo, recém-assinado pela empresa.

Para o executivo espanhol, o investimento em tecnologia, realizado em meio à pandemia, será colhido em longo prazo, principalmente ao substituir a necessidade de grandes espaços e estruturas de atendimento. “Olhando para frente, teremos a opção de reduzir os centros físicos e os custos”, disse o executivo. “Quando existem vantagens para todos os lados, empresa, clientes e colaboradores, não há dúvidas de que as mudanças irão muito além da pandemia”.

MUDANÇA DEFINITIVA Na visão do CEO daAtento, Carlos López-Abadía, a tecnologia possibilita um novo momento para o segmento de call center, com corte de custos e consolidação do trabalho remoto. (Crédito:Divulgação)

Serviços de call center são zonas de tensão constante. Do lado do cliente, a insistência num atendimento ou a demora para uma solução são queixas comuns. Do lado dos funcionários, um campo fértil de estresse. Por esse motivo adotar o home office de forma permanente é um passo complexo e a tecnologia entra em cena, com o programa Atento@Home. Ele engloba uma estrutura baseada em inteligência artificial para a segurança dos dados dos clientes e a manutenção da qualidade do serviço.

Por um lado, a plataforma monitora a presença do funcionário através de reconhecimento facial no seu próprio laptop ou tablet. E para acompanhar os atendimentos, o supervisor, que antes estava lado a lado com os atendentes, agora tem um programa de inteligência artificial que monitora a atenção emocional durante uma conversa. Ao menor sinal de emoções mais intensas, como um leve nervosismo, o responsável recebe, de casa, um alerta, podendo monitorar o atendimento ou até mesmo intervir. “Para nós é mais importante a capacitação do profissional do que sua localização”, afirmou o CEO.

RESULTADOS Conciliar a logística com agilidade durante esse processo foi, segundo López-Abadía, um dos maiores desafios já enfrentados pela multinacional. Mais do que disponibilizar computadores e internet de alta velocidade a todos, a abrupta mudança durante a pandemia obrigou a empresa a rever suas estratégias de gestão. Como o Brasil é o maior mercado para a Atento no mundo, responsável por 40% das receitas, a forte desvalorização do real nos últimos dois anos, que perdeu cerca de 30% de seu valor frente ao dólar, derrubou as receitas por aqui. No comparativo anual de 2020 com o ano anterior, o faturamento no País apresentou queda de 26,3%, passando de US$ 827,3 milhões para US$ 609,4 milhões. Os resultados globais também sofreram o impacto da crise e resultaram em queda de 17,6% no mesmo comparativo, totalizando US$ 1,4 bilhão ao final de 2020.

O CEO prefere olhar de forma otimista. “Estamos em curva crescente desde o terceiro trimestre de 2020”, disse. “Para este ano, sabemos melhor como gerenciar as situações.” Entre os índices positivos do balanço, o executivo destaca a alta de 158,4% no Ebitda da companhia entre o terceiro e o quarto trimestres de 2020. No comparativo do ano passado com 2019, o crescimento do índice foi de 5%, totalizando US$ 161,2 milhões. Com esse bom desempenho na margem operacional, a despeito da pandemia e da disparada do dólar, a Atento aposta que operação brasileira vai se manter nos próximos anos como o principal pilar da companhia no mundo. Com ou sem crise, o que a companhia quer é estar atendendo.