A troca de sorrisos e os apertos de mão da foto a cima sugerem um encontro caloroso e amigável entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, na segunda-feira (12). Mas fora dos flashes da imprensa as conversas tiveram tom de cobranças e reclamações.

No lado das cobranças, a executiva reforçou que as negociações de livre comércio entre Mercosul e União Europeia dependem de compromissos mais concretos do Brasil no campo ambiental e que o descumprimento pode gerar contramedidas e a possibilidade de suspensão de concessões acertadas no acordo.

E como gesto de boa vontade, Ursula anunciou 20 milhões de euros (quase R$ 110 milhões) para o Fundo Amazônia. Ela também anunciou que o bloco vai investir o equivalente a cerca de R$ 52 bilhões na América Latina e o no Caribe, além de mais R$ 10 bilhões para apoiar a produção brasileira de hidrogênio verde.

Já no lado das reclamações, Lula criticou as exigências do bloco no processo de validação do acordo com Mercosul.

“Expus à presidente von der Leyen as preocupações do Brasil com o instrumento adicional ao acordo apresentado pela União Europeia em março deste ano, que amplia as obrigações do Brasil e as torna um objeto de sanções em caso de descumprimento”, afirmou Lula, em entrevista coletiva após o encontro.

“A premissa que deve existir entre parceiros estratégicos é a da confiança mútua e não de desconfiança e sanções. Essas iniciativas representam restrições potenciais às exportações agrícolas e indústrias do Brasil”
Presidente Lula

O presidente estava se referindo a uma lei adotada no mês passado pelo Conselho Europeu. A medida proíbe que o bloco importe produtos de áreas desmatadas depois de dezembro de 2020.

A lista inclui carne, soja, papel, cacau e madeira. As empresas europeias têm um prazo de um ano e meio para se adaptar às novas regras.

Na avaliação do economista e cientista político Roberto Meneses, do Instituto de Relações Internacionais, o cabo de guerra entre Brasil e União Europeia na área ambiental é algo natural dentro de um processo de definição de regras para os dois lados.

“Como o governo Bolsonaro promoveu uma ruptura na política ambiental brasileira e fechou as portas da diplomacia ambiental, é normal que esse ponto seja agora um pilar do acordo entre os dois blocos”, afirmou.

O acordo Mercosul-União Europeia é negociado desde 1999. Vinte anos depois do início das conversas, em 2019, os blocos finalizaram as negociações comerciais e, um ano depois, os chamados aspectos políticos e de cooperação.

Desde então, o acordo está em fase de revisão, para ser assinado. A política ambiental da gestão Bolsonaro, que resultou na alta do desmatamento, dificultou a negociação.

Prazo

Apesar da troca de cobranças e reclamações, a presidente da Comissão Europeia disse, na sequência do discurso de Lula, que espera que o acordo entre Mercosul e o bloco seja concluído até o final do ano.

“Temos a ambição de terminar o acordo o quanto antes, o mais tardar até o final do ano. Acredito que há grandes vantagens para ambos os lados”, disse.

Sobre as críticas de Lula ao pedido de revisão realizado pela UE do texto em tramitação, Von der Leyen afirmou que aguardam o retorno oficial do Brasil. “Enviamos uma carta com instrumentos adicionais, e estamos muito ansiosos para sua resposta, porque queremos ouvi-lo, para saber onde temos que dar um passo em direção um ao outro.”

1999
Começo das negociações para o acordo de livre comércio entre UE e Mercosul

A pressão europeia por um compromisso mais sólido do Brasil no quesito ambiental se justifica. Durante a gestão do presidente Jair Bolsonaro, o desmatamento na Amazônia atingiu níveis alarmantes.

A adoção de políticas ambientais negligentes e a retórica que minimizava a importância da preservação da floresta foram fatores que contribuíram para o aumento significativo do desmatamento.

A flexibilização das leis ambientais, o enfraquecimento dos órgãos de fiscalização e o estímulo à exploração desenfreada dos recursos naturais foram alguns dos elementos que alimentaram essa situação preocupante.

As consequências negativas do aumento do desmatamento para o Brasil foram acentuadas pelas sanções impostas pela União Europeia.

Preocupados com a destruição da maior floresta tropical do mundo, os países europeus adotaram medidas de restrição comercial e pressionaram o governo brasileiro a tomar ações efetivas contra o desmatamento.

20 milhões foram anunciados pela UE para o fundo amazônia

As sanções incluíram a imposição de tarifas e restrições à importação de produtos agrícolas brasileiros. Além das consequências econômicas, as sanções da União Europeia também tiveram um impacto negativo na imagem do Brasil no cenário internacional.

O País passou a ser visto como um mau exemplo de políticas ambientais e desrespeito à preservação da natureza.

Europeus querem que o Brasil defina metas mais rígidas de combate à destruição da Amazônia (Crédito:Michael Dantas)