A pequena Michele de Oliveira Ferreira viveu boa parte de seus 8 anos no lixão de Carapicuíba, cidade da região metropolitana de São Paulo. Nos montes de lixo, ela catava latas com a mãe, à tarde e início da noite, e depois as vendia para aumentar a renda familiar. Sofreu com o mau cheiro e com as histórias pavorosas de que, volta e meia, pessoas mortas eram encontradas no local. Mas esta terrível realidade já não faz mais parte de suas tardes. Michele e outras 39 crianças, a maioria ex-catadoras, têm agora a oportunidade de cavucar em outro terreno, onde há dignidade e esperança. Elas foram retiradas do lixão e, desde então, aprendem a cultivar cenoura, couve-flor e mandioca na horta do projeto Oficina Pedagógica, da Fundação Orsa, do grupo do setor de papel e celulose. Em agosto, a mudança radical na infância destas crianças vai fazer um ano. Um furgão da fundação as busca todas as tardes, nos bairros pobres de Carapicuíba, para horas de lazer e de reforço escolar na sede da entidade. Com a ajuda de voluntários, elas têm momentos de animada convivência na plantação.

A Fundação Orsa, criada em 1994, tem outros 46 projetos espalhados pelo País. Faz um trabalho expressivo voltado para crianças e adolescentes, de 7 a 11 anos. Atende atualmente 14 mil jovens, todos considerados em situação de ?risco pessoal e social?. O Grupo Orsa, dono do Projeto Jari, no Pará, destina 1% de seu faturamento bruto para a entidade. Este ano, R$ 7 milhões saíram do cofre para as crianças. Os projetos vão da ajuda à criança com câncer, em programa ligado ao Instituto de Oncologia Pediátrica, da Escola Paulista de Medicina, às aulas de música dos adolescentes de Campinas, integrantes da banda Bate-Lata. ?Nossa maior gratificação é quando conseguimos transformar a vida de uma criança?, conta o vice-presidente da entidade, José Aparecido Montagnana. A missão é cultivar em todas elas a esperança. Na semana passada, depois de brincar na horta, Michele mostrou que o Grupo está colhendo bons frutos com este investimento. ?Quando eu crescer, quero ser professora?, anunciou ela. Sua amiga, Valéria Cristina da Silva, de 8 anos, surpreendeu ao dizer que deseja, no futuro, ?ajudar os pobres para que não morram de frio?. Os melhores sonhos e o nobre sentimento de solidariedade desabrocham nas ex-catadoras do lixão. Sinal de que uma boa semente foi plantada.