Em junho de 2018, contrariando seu falatório sobre bombardear a Coreia do Norte, o presidente dos Estados Unidos se reuniu com o ditador Kim Jong-un e assinou um tratado histórico. O norte-coreano concordou em desnuclearizar seu país em troca de uma trégua nas sanções econômicas dos EUA. Nesta semana, um segundo encontro dos dois em Hanói, no Vietnã, reforçou os compromissos de parte a parte. O bom-senso venceu o ódio. Trump não pretende começar uma guerra. E ainda deu uma aula de estratégia.

O mandatário dos EUA foi buscar em Hanói um troféu que está cada vez mais longe de ser conseguido em casa. Com minoria no Congresso e ainda sob o impacto negativo do shutdown, a paralisação dos serviços da administração federal que se estendeu por mais de um mês a partir do final de dezembro, Trump se aproveitou das necessidades do antigo inimigo para escrever um capítulo heroico em seu currículo presidencial. Depois de falhar nas negociações para obter a verba de US$ 5,7 bilhões que pretende usar na construção de um muro na fronteira dos EUA com o México, o presidente declarou “estado de emergência” como forma de impor a conta aos contribuintes.

Nenhuma das decisões foi bem recebida. Para piorar, a guerra comercial declarada contra a China tende a causar estragos na economia norte-americana. Nesse contexto, retomar o acordo para a desnuclearização da Coreia não apenas tira o foco dos problemas domésticos de Trump como o coloca novamente na liderança de uma agenda pela paz mundial. É uma tremenda sacada do ponto de vista estratégico. Jair Bolsonaro não é Trump e ainda tem pouco tempo de experiência como presidente. São apenas dois meses no cargo, e parte de seu mandato ficou com o vice, o general Hamilton Mourão.

A expectativa da maioria dos brasileiros, porém, era que esses primeiros meses do novo governo bastassem para trazer boas notícias. E elas têm sido raras – ao passo que as ruins proliferam. Em grande parte, isso decorre do fato de o governo Bolsonaro ainda não ter definido sequer um plano de comunicação social. Assim como fez ao longo de sua campanha, o presidente segue usando o Twitter para se comunicar com os fãs, criticar a imprensa e mandar recados tanto para aliados quanto para opositores. Há até quem o aplauda por isso.

O expediente, contudo, não tem ajudado a aumentar a popularidade do presidente. Divulgada na terça-feira 26, uma pesquisa feita pela Confederação Nacional do Transporte em pareceria com o Instituto MDA revela que a avaliação pessoal de Bolsonaro é positiva para 57,5% da população. O número não se distancia do total de eleitores que votaram no candidato do PSL: 55,13%. A julgar pelos números, Bolsonaro agregou apenas uma pequena parcela de não-eleitores sobre a base de apoio que acumulara durante a campanha. Ele soube vencer a eleição com a ajuda do Twitter, não poderá se valer dele se quiser ser um chefe de Estado. E aqui entra a melhor das lições de Trump.

Caso agisse apenas segundo seus impulsos beligerantes, o presidente dos EUA não teria ido duas vezes à Ásia, em menos de oito meses, para apertar a mão do antigo desafeto Kim Jong-un. O mandatário republicano calculou os dividendos de sua ida até Hanói para posar de conciliador, Em junho passado, após assinar o primeiro acordo, Trump obteve uma aprovação recorde e voltou cotado para receber o prêmio Nobel da Paz. O Brasil não é os Estados Unidos. Por isso mesmo, se quiser se impor perante o mundo, Bolsonaro precisa aproveitar os exemplos corretos que vêm de lá. Talvez o maior deles seja saber criar fatos positivos mesmo diante das adversidades.