A arquiteta Nara Rosetto, de 29 anos, cresceu observando o Ipiranga da janela de um antigo sobradinho. Com o tempo, passou a desenhar e pintar o que encontrava durante andanças por essas e outras regiões de São Paulo, tudo para “consumo pessoal”. Em 2014, contudo, esse interesse deu origem ao projeto Janelas SP, “criado sem pretensão” nas redes sociais Facebook e no Instagram. Por meio de financiamento coletivo, deve virar livro até agosto.

Como Nara, dezenas de moradores mantêm perfis em redes sociais voltados a trazer novos olhares para São Paulo, com focos que vão da valorização da história até retratos do cotidiano dos bairros periféricos. No início do mês, 25 desses influenciadores digitais lançaram a hashtag #instasdesp, para reunir conteúdo sobre a metrópole paulistana.

“Esses projetos reconectam as pessoas com a cidade, as leva a reparar em detalhes que fogem no dia a dia”, conta a arquiteta, que costuma passar de duas horas a um dia inteiro em frente a prédios anônimos ou icônicos da cidade, desenhando suas janelas. Inspirado na página Windows of New York, o Janelas de SP reúne cerca de 2,5 mil seguidores em cada um de seus perfis em redes sociais.

Valorizar o patrimônio também é a proposta do Sampa Graffiti, página que reúne mais de 59 mil seguidores no Instagram desde 2013, mas que nasceu três anos antes com uma série de curtas postados no canal do documentarista Paulo Taman, de 37 anos, no YouTube. “O engajamento no Instagram é muito alto. Para quem gosta é um prato cheio, porque o grafite impressiona e, em São Paulo, está em quase todos os lugares. Muita gente olha, tira a foto e já marca a página”, relata. Ao todo, mais de 55 mil pessoas já utilizaram a hashtag #sampagraffitti.

Taman costuma postar de uma a duas imagens por dia para manter uma curadoria “com qualidade”. Em geral, na legenda, aponta apenas o nome do grafiteiro e a localização, além de marcar quem fez o registro (quando a imagem não é dele). “Até já pensei em escrever mais, descrever a arte, mas isso é muito subjetivo. Não quero influenciar o olhar de ninguém”, explica ele, que ressalta o potencial de registro das redes sociais. “O grafite é efêmero, pode não estar no mesmo lugar no dia seguinte. Mas, pelas fotos e pelos vídeos, ele continuará sempre existindo”, comenta.

Olhares para o invisível. Retratar aspectos que passam ao longe se estende, também, às pessoas, especialmente àquelas que estão em situações de vulnerabilidade social ou são vistas de forma estereotipadas. É o caso, por exemplo, do DiCampana Foto Coletivo, criado em novembro de 2016 com o objetivo de trazer imagens da periferia de São Paulo feitas por cinco moradores, que também são fotógrafos profissionais.

“A forma como a periferia aparece é tão perversa que cria uma imagem na cabeça das pessoas de que é só violência e miséria. A gente tem de falar disso também, porque é uma violação dos direitos humanos, mas a nossa prioridade é mostrar outros lados dessa realidade, dar rosto para esses moradores. Isso não aconteceu por muito tempo, porque a fotografia é elitizada e, o equipamento, caro”, diz o fotógrafo José Cícero da Silva, de 34 anos.

Segundo ele, moradores procuraram o coletivo, que tem 2,7 mil curtidas no Facebook, para indicar eventos e locais que deveriam ser registrados. O grupo também mantém banco de imagens na internet. “Se você analisar o mapa da cidade, vai perceber que São Paulo é uma periferia. O território central é um pequeno pedaço perto do tamanho das ‘bordas’.”

Visibilidade. Desde 2014, a página SP Invisível também se propõe a dar rostos a quem não é valorizado no cotidiano, reunindo hoje 341 mil seguidores no Facebook e 50 mil no Instagram. Ela é gerenciada pelos estudantes universitários de Jornalismo e Cinema, respectivamente, Vinicius Lima, de 21 anos, e André Soler, de 23. “A nossa ideia nasceu querendo mostrar a ‘vida real’, com ônibus lotado, buraco no chão, tudo o que não se vê no meio das fotos de gatinhos, cachorros e férias das redes sociais”, diz Lima. No momento de colocá-la em prática, contudo, os dois jovens repararam que a invisibilidade do cotidiano atinge principalmente as pessoas e especialmente as que vivem nas ruas. “Mais do que a imagem, queremos contar quem são elas, ouvi-las”, comenta.

Lima atribui a popularidade da página ao boca a boca virtual, o que os levou a lançar um livro no fim de 2016, financiado por crowdfunding. “Ao mesmo tempo que se nega a vida real, as redes também proporcionam criar uma empatia com essas histórias, quando se conhece elas, até se identifica, se vê naquelas pessoas. Eu gosto de pensar que essa mudança não fica só no digital”, afirma. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.