Conforme aumentam os casos e mortes causados pela Covid-19 no Brasil, cresce o número de pessoas em dificuldades financeiras, seja por falta de trabalho ou de renda. É uma situação que afeta indivíduos e empresas. Como forma de atenuar essa situação, o Banco Central publicou uma medida por meio da Circular 4009, de 28 de abril, que altera temporariamente algumas regras que regem os consórcios. Uma das mudanças autoriza as administradoras a pagar em espécie, no ato da solicitação, o crédito a que os consorciados têm direito. A possibilidade de receber em dinheiro já existia, mas era preciso aguardar um prazo de 180 dias. A decisão deve contribuir para injetar na economia até R$ 35 bilhões. Tem direito a receber imediatamente os recursos quem estiver com as obrigações quitadas para consórcios contemplados até 31 de dezembro deste ano.

Favorável à medida do Banco Central, o presidente-executivo da Associação Brasileira das Administradoras de Consórcios (Abac), Paulo Roberto Rossi, afirma que, antes da edição da circular, os consorciados usavam a carta de crédito para obtenção do bem ou do serviço do seu interesse. Apenas cerca de 10% pediam para receber em dinheiro. “Agora, estimamos que esse percentual possa subir para até 30% ao longo do ano”, diz Rossi. Isso significa que o impacto na economia será considerável. Segundo Marcio Kogut, CEO da plataforma de consórcios Mycon, a empresa já liberou cerca de R$ 2 milhões desde que a circular entrou em vigor e sua expectativa é de que chegue a R$ 5 milhões até o fim deste mês. “Não é um percentual alto porque nem todo mundo quer receber em dinheiro”, diz. “A maioria ainda tem a mercadoria como objetivo”. Sócio da administradora de consórcios Unifisa, Eduardo Figueiredo Augusto tem percebido um número maior de pedidos para liberação do crédito em dinheiro. “Esse tipo de solicitação aumentou, de 10% para cerca de 25%”, afirma.

 

Como o saque em dinheiro só é permitido para o consorciado que quitou todas as parcelas, é importante analisar o quanto falta pagar para que o recurso seja liberado. Quem já pagou 80% das parcelas, pode levar vantagem se quitar de uma vez os 20% restantes e receber o que tem direito. “Mas é preciso que o consorciado analise sua situação. É possível negociar, caso ele não tenha condições de quitar as parcelas restantes de uma só vez”, diz Kogut. “Essa negociação só tem sentido se ele já pagou mais da metade do valor e precisa muito de dinheiro em mãos.”

MOMENTO DIFÍCIL A expectativa é de que a medida do Banco Central não afete em nada a saúde financeira das administradoras, já que o crédito em questão pertence ao consorciado e fica depositado em um fundo específico. “A única mudança, neste quesito, foi o prazo de pagamento, que vai ajudar muito quem precisa neste momento tão difícil”, afirma Rossi, da Abac. Se essa alteração beneficiou diretamente o consorciado, outras modificações ajudam as administradoras. É o caso, por exemplo, do aumento do prazo para a formação de grupos de consorciados, que era de 90 dias e foi estendido de forma escalonada, com data limite até 31 de março do ano que vem. Para entender melhor: grupos que comecem a ser formados até 30 de setembro terão prazo de até 180 dias para serem constituídos. Se o início for entre 1º e 31 de outubro, serão até 150 dias e, entre 1º e 30 de novembro, até 120 dias. Se, mesmo assim, a administradora não conseguir fechar o grupo, as pessoas têm direito à restituição do que foi efetivamente pago.

Essa medida é reflexo da forte retração que o setor sofreu por causa da pandemia. De acordo com dados da Abac, o sistema de consórcios até registrou uma evolução de 9,7% (com 717 mil adesões) no primeiro trimestre, em comparação com o mesmo período de 2019 (653,5 mil). O resultado é fruto do desempenho obtido nos meses de janeiro (284,45 mil) e fevereiro (245,66 mil). A partir da segunda quinzena de março, quando a quarentena foi efetivamente adotada como meio de contenção das contaminações pelo novo coronavírus, as adesões caíram. O mês fechou com 187 mil contratos, retração de 23,8% no comparativo com o mês anterior. A expectativa é de que as iniciativas do BC focadas no sistema de consórcios junto de outras, de natureza fiscal e trabalhista tomadas pelo governo federal, surtam efeito positivo na economia e no segmento. “Esperamos que essas medidas sejam suficientes para manter a situação de liquidez no mercado”, afirma Rossi.