Em 1999, os americanos Sean Parker e Shawn Fanning criaram um programa de computador que permitia o compartilhamento de músicas pela internet. Batizada de Napster, a plataforma chegou a ter 80 milhões de usuários antes de ser fechada, em 2002, após uma série de acusações e processos por pirataria movidos por gravadoras e artistas como a banda de heavy metal Metallica e o rapper Dr. Dre. “Nós apenas preenchemos uma lacuna que as gravadoras se recusaram a ocupar”, disse Parker, em 2013. “Eles perderam a indústria inteira por isso.” Quase vinte anos depois de chacoalhar a indústria fonográfica, o Napster, que em 2011 se fundiu com a empresa americana Rhapsody, tenta voltar a ser relevante em um mercado que ele ajudou a criar e que, apenas com serviços de streaming, movimentou US$ 7,2 bilhões no ano passado. Ao contrário de suas origens, porém, a estratégia para sair da sombra de serviços como Spotify e Apple Music não está no usuário final, mas sim no mercado corporativo.

Mais do que buscar espaço em um mercado dominado por gigantes, a aposta no nicho empresarial é mais uma reinvenção do Napster. Dessa vez para atrair a atenção de grandes empresas do planeta, como as operadoras Vodafone, T-Mobile e Movistar e o grupo de e-commerce japonês Rakuten. “Nós sabemos como trabalhar com essas companhias”, diz Marcio Kanamaru, vice-presidente do Napster para a América Latina. Com diferentes acordos, essas parceiras utilizam a tecnologia fornecida pelo Napster para criarem suas próprias plataformas de streaming, seja pela associação da marca ao aplicativo ou pelo uso de recursos do serviço em programas distintos. “A aposta é coerente. É duro competir contra Spotify e Apple”, diz André Miceli, coordenador do curso de marketing digital da Fundação Getulio Vargas. “É um posicionamento que evita a competição e ocupa um espaço que hoje ainda está vago.”

Com receita de US$ 76,5 milhões no primeiro semestre e lucro de US$ 6,5 milhões – algo que o rival Spotify não conseguiu até hoje –, o Napster está provando que seu novo modelo de negócios funciona, inclusive no Brasil. Em 2013, a Telefônica Vivo firmou um acordo para o desenvolvimento de uma plataforma de reprodução online que ganhou o nome de Vivo Música by Napster. Vale destacar que, na última quarta-feira 19, a empresa de telefonia fechou um acordo com outra companhia do ramo, o Tidal, do rapper Jay-Z (veja mais detalhes na coluna Dinheiro em Ação). O modelo da Vivo foi replicado dois anos depois, em uma parceria com o Corinthians.

De olho no mercado: fundado por Sean Parker em 1999, o Napster chegou a ter 80 milhões de usuários em seu serviço

Celebrado com festa no estádio do clube alvinegro, o negócio não manteve a mesma empolgação inicial e foi encerrado dois anos depois. Apesar do revés, o Napster ainda espera aumentar a sua presença no País. “O streaming é o principal modelo de negócios da indústria fonográfica no Brasil e no mundo”, diz Eduardo Rajo, diretor financeiro da Pró-Música Brasil, associação brasileira de produtores fonográficos. “Há muito espaço para crescimento neste mercado.”Até o fim de 2018, a expectativa é fechar mais dois acordos. Existem negociações em andamento com uma rádio e rede de varejo. “Esperamos que nossa receita cresça 30% até o fim do ano”, afirma Kanamaru.

O trunfo para concretizar essa estimativa vai além de uma promessa de aproximar as marcas de seus consumidores. Mesmo porque, apesar de ter um nome forte no segmento, o Napster não está sozinho no Brasil. O Deezer, aplicativo de streaming francês utilizado por 14 milhões de pessoas, também atua neste nicho. O serviço rival, inclusive, tem uma parceria com a operadora TIM. “É um mercado estratégico e que está no DNA da nossa plataforma”, diz Bruno Vieira, diretor-geral do Deezer no País. Assim, para conquistar novos clientes, o Napster aposta em tecnologia. Há desde ferramentas que facilitam o uso dos programas enquanto o usuário estiver dirigindo até mecanismos para identificar pessoas que tenham um gosto musical semelhante ao do usuário e, com isso, permitir uma interação entre eles. “Nós temos o nosso Tinder musical”, diz Kanamaru.

Quem ainda não está dando match com as empresas são os aplicativos líderes de mercado. O Spotify, por exemplo, está avaliado em US$ 33,1 bilhões e faturou pouco mais de US$ 1,49 bilhão no segundo trimestre do ano. O montante é dividido entre a renda gerada com publicidade (US$ 150 milhões) e o valor obtido pelas 83 milhões de assinaturas da plataforma (US$ 1,34 bilhão). Para efeito de comparação, o Napster contava com 4,5 milhões de usuários em janeiro de 2017. A empresa não revela o seu número atual de clientes. Na mesma toada do Spotify, está o Apple Music, da Apple. Em junho, o serviço contabilizou 45 milhões de assinantes, mas continua sem interesse em entrar no mercado corporativo. O que faz com que as empresas ainda precisem esperar um pouco mais para terem a chance de dançarem com essas gigantes.