Um ar triunfante parecia cercar o americano Michael Dell em 2013. O empresário havia gasto US$ 24,9 bilhões na recompra das ações da fabricante de computadores que havia fundado em 1984 e que estavam nas mãos de investidores. Com isso, ele a retirou da bolsa eletrônica Nasdaq, onde era listada desde 1988. “Somos a maior empresa do planeta a fechar o capital”, afirmou, na época. “Em uma ou duas semanas, seremos a maior startup do mundo”. Michael parecia ter tirado um peso do tamanho do mundo de suas costas. Era a vingança perfeita contra Wall Street, que, na visão de empresário, subvalorizava sua empresa. Quatro anos depois do adeus, a Dell pode voltar ao mercado. Tudo por conta com uma dívida que chega a quase US$ 50 bilhões, segundo estimativas de analistas financeiros.

Há dois planos para isso. Um deles envolve uma fusão reversa com a VMWare, negociada na Nasdaq e da qual a Dell é dona de 80%. Esta empresa era uma subsidiária da EMC, gigante do armazenamento digital que foi adquirida pela Dell, em 2016, por US$ 67 bilhões, no maior negócio do mercado de tecnologia até agora. A transação foi uma tentativa da fabricante de computadores do Texas de diversificar seus negócios após o declínio nas vendas de computadores. Deu certo, mas essa compra bilionária foi responsável pelo buraco gigantesco nas contas da Dell. Por isso, a volta ao mercado de ações ajudaria a empresa a captar dinheiro de forma rápida para recuperar-se do rombo financeiro. “Esperamos que, como parte dessa transação que una as duas empresas, seja necessário vender ações para fazer caixa e pagar os débitos”, escreveu Mark Moerdler, analista da consultoria Sanford C. Bernstein & Co., em um relatório. A VMWare é avaliada em quase US$ 51 bilhões.

Adquirida pela Dell em 2016 no acordo com a EMC, a VMWare tem capital aberto e está avaliada em US$ 51 bilhões (Crédito:Divulgação)

A outra possibilidade que estaria sendo cogitada no conselho da empresa é a realização de uma oferta pública de ações. “Seria irônico ver a Dell voltar à disciplina do mercado depois de ter exaltado o quanto estava satisfeita por ter se tornado uma empresa fechada”, diz Roger Kay, da consultoria americana Endpoint Technologies Associates. “De certo, é uma tentativa de tentar captar dinheiro.” Analistas americanos acreditam que essa opção é a menos atraente. “Não acredito que eles possam captar US$ 15 bilhões”, afirmou Ivan Feinseth, chefe do banco de investimento americano Tigress Financial Partners, em uma entrevista à agência de notícias Bloomberg. “A Dell perdeu muito valor recentemente.”

Em ambos os cenários, fica clara a necessidade da empresa de captar dinheiro rapidamente para sair do vermelho. Há, porém, alguns elementos que dificultam esse retorno ao mercado. Michael Dell já declarou publicamente que despreza Wall Street por exigir resultados imediatos e não dar o tempo necessário para uma empresa se desenvolver. Os investidores, por sua vez, já acusaram o empresário de ter recomprado as ações da empresa em um período de baixa do preço, economizando 28% no valor. A acusação obteve vitória nos tribunais, mas a decisão foi anulada em dezembro do ano passado.

Procurada, a Dell afirma que “não comenta rumores e especulações”. Para Kay, que afirma ter conversado com membros da diretoria da empresa americana, há muita fumaça nestes rumores. “E onde há fumaça, geralmente, há fogo”, diz o consultor. Apesar de a Dell não querer comentar a notícia, o mercado não reagiu bem à possibilidade. Na segunda-feira 29, quando o assunto chegou ao público, as ações da VMWare caíram 16,5% e estavam sendo vendidas por US$ 118,74 cada, o menor valor desde o dia 7 de dezembro do ano passado. Chegou a vez de Wall Street vingar-se de Michael Dell, ao mesmo em tempo em que pode salvá-lo.