Geeks, publicitários, músicos, cineastas e afins. A princípio, a presença de um representante da construção civil poderia destoar dos frequentadores habituais do South by Southwest (SXSW), festival de tecnologia, arte e economia criativa realizado, anualmente, em Austin, no Texas. O paulistano Alexandre Lafer Frankel, no entanto, sentiu-se em casa em sua primeira participação no evento, há cerca de um mês. “Nossa filosofia se aproxima muito mais da nova economia do que do real estate tradicional”, diz Frankel, fundador e CEO da construtora Vitacon.

Criada em 2009 e com atuação ainda restrita à cidade de São Paulo, a empresa ficou conhecida pelos empreendimentos que combinam apartamentos compactos, a partir de dez metros quadrados, com serviços e espaços compartilhados pelos moradores. O modelo aposta também no fato de que as pessoas estão dispostas a trocar grandes unidades para morarem próximas de seus trabalhos e em áreas nobres da cidade. Depois de ganhar escala com esse conceito, a Vitacon prepara uma nova guinada para seguir se adaptando a essas mudanças de comportamento.

Da viagem ao SXSW, Frankel trouxe parte da inspiração para novidades que, pouco a pouco, passarão a integrar os próximos empreendimentos da Vitacon. Uma das prioridades, adiantada pela coluna MOEDA FORTE, de Carlos Sambrana, é a construção de áreas reservadas para a entrega de encomendas via drones, bem como de espaços para o embarque e o desembarque de passageiros em carros autônomos e de aplicativos como Uber e 99. Atualmente, a companhia mantém uma parceria com a locadora Movida para a oferta de carros compartilhados em seus prédios.

Outro projeto, já em fase de desenvolvimento, são os “armários inteligentes”. A proposta é permitir que, tanto a entrega como a retirada de itens – de um produto comprado no comércio eletrônico a uma camisa que precisa ser encaminhada a uma lavanderia – possam ser feitas em qualquer horário, sem a necessidade de intervenção humana. “Aideia é entregar um prédio que será uma plataforma aberta, em constante adaptação e atualização”, diz Frankel. “Esse será o apartamento do futuro.”

Na medida: apartamentos compactos, como essa unidade de 28 m², na Vila Olímpia, são o foco da Vitacon (Crédito:Rafael D'Andrea)

Sob o conceito de Internet das Coisas, uma gama de tecnologias já está sendo incorporada nos novos projetos da construtora, que prevê entregar dez lançamentos em 2018 e fechar o ano com um valor geral de vendas de R$ 2 bilhões, ante R$ 830 milhões, um ano antes. Recursos não faltam para que esse salto seja dado. Em 2017, a Vitacon recebeu aportes dos fundos Capital Land, de Cingapura, e Hines, dos Estados Unidos, nos valores de R$ 1,5 bilhão e de R$ 600 milhões, respectivamente. O ponto de partida dessa estratégia tecnológica é a parceria fechada, em dezembro, com as gigantes IBM e Intel.

Procuradas, as duas empresas não concederam entrevista. Ainda em fase inicial, o trabalho do trio consiste em atrair startups para desenvolver, em conjunto, aplicações específicas para os empreendimentos da Vitacon. A parceria também estima lançar, em 2021, um projeto desenvolvido 100% sob esse conceito. Com boa parte dos recursos controlados por comando de voz, a relação de aplicações já desenvolvidas inclui o uso do smartphone para abrir, via tecnologia bluetooth, a porta da unidade e, ao mesmo tempo, compartilhar a “chave” com outras pessoas. Equipamentos como aspiradores e cafeteiras podem ser acionados remotamente, bem como terem seus horários de uso programados. Ao mesmo tempo, o morador consegue conectar sua agenda com o sistema de automação do apartamento.

De posse de informações em tempo real das condições de trânsito, ele é despertado no tempo necessário para se arrumar, chamar um carro por aplicativo e chegar, sem sobressaltos, ao seu compromisso. No escopo da Vitacon, o volume de dados produzidos a partir dessas aplicações, o chamado big data, poderá ser usado para aprimorar e personalizar serviços ofertados aos moradores, como, por exemplo, a limpeza das residências. Assim como a questão dos apartamentos compactos, esse modelo de prédio inteligente ainda está restrito a alguns grupos sociais e etapas da vida das pessoas”, afirma José Augusto Aly, professor de arquitetura e urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Não é possível garantir que esse será o formato que prevalecerá no futuro.”

À parte das incertezas, Frankel recorre à tecnologia para batizar outro conceito que a Vitacon começa a estruturar: o “apartamento na nuvem”. A ideia é aplicar um modelo semelhante ao de uma assinatura, no qual os membros possam mudar para um apartamento de acordo com as suas necessidades no momento. Um assinante de outra cidade, por exemplo, que ficará dois meses em São Paulo, por motivos profissionais, pode escolher uma unidade próxima ao seu trabalho. “O apartamento deveria acompanhar as fases da vida da pessoa”, diz Frankel. “Estamos caminhando para essa ótica. Vamos deixar de vender tijolos para oferecer serviços de moradia.”