As pessoas estão mais apegadas a seus pets. Essa é uma das muitas mudanças que a pandemia da Covid-19 trouxe para o convívio social — e que deve permanecer. Quem tem bicho de estimação em casa certamente passou a prestar mais atenção em fatores como bem-estar, alimentação, saúde e higiene. O envolvimento mais próximo impactou diretamente nos negócios. No ano passado, o setor como um todo faturou R$ 40,8 bilhões, segundo o Instituto Pet Brasil (IPB). A expectativa é de um crescimento em torno de 22,5% em 2021. “Deve ultrapassar a casa dos R$ 50 bilhões”, afirmou o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet), José Edson Galvão de França. “Teremos mais algum tempo avançando em dois dígitos.”

O executivo divide esse mercado em três pilares: indústria, venda de animais e serviços. E a atuação da Abinpet é basicamente voltada ao segmento industrial, que também tem três subdivisões (petfood, petvet e petcare), reunindo cerca de 500 empresas. Juntas, fatiraram mais R$ 27 bilhões em 2020. A maior participação nesse montante é, de longe, do setor de alimentação, com 70% do total. “Conforme essa indústria cresce, leva também os demais segmentos”, disse França, acrescentando que o avanço é um estímulo às inovações. “Lançamentos são uma constante em nutrição e produtos veterinários.”

Divulgação

“Planos de saúde para pets têm função muito mais estratégica, para fortalecer a relação com quem já é cliente da empresa” Elton Carluci Qualicorp.

E não faltam exemplos de inovações tecnológicas voltadas ao setor. A MSD Saúde Animal tem aumentado sua aposta global em novidades para promover o uso estratégico de soluções de identificação animal e de gestão de dados. Em janeiro do ano passado, a empresa criou uma unidade global de negócios chamada Intelligence, na qual já investiu mais de US$ 4 bilhões. É daí que vem a criação de algumas das novidades para o mercado pet, setor que representa 18% dos negócios da companhia e um faturamento anual de R$ 270 milhões. Boa parte dessas soluções garante aos tutores detalhes que normalmente não perceberiam sobre o comportamento de seus animais.

As inovações podem ajudar em vários níveis, da predição até o processo de tratamento de doenças do pet. Segundo Jayme Alexandre Dias de Lima, diretor de Estratégia e Inovação da MSD Saúde Animal, o aplicativo Pet Diabetes Tracker permite que o tutor compartilhe informações sobre o comportamento do animal com o veterinário para receber orientações quanto aos procedimentos. Algumas soluções chegaram ao mercado há pouco mais de um mês. A Sure Flap, por exemplo, é quase uma portaria eletrônica para os pets. Trata-se de uma portinhola automática que libera a saída e a entrada do animal na casa a partir de sua identificação por um microchip implantado ou uma tag em sua coleira. A Sure Feed tem funcionamento parecido: um comedouro com tampa acrílica que tem a abertura condicionada à identificação do pet.

Divulgação

‘Teremos mais algum tempo avançando em dois dígitos, não sei exatamente quanto, mas deve continuar” José Edson G. de França Abinpet.

RELAÇÃO DIGITAL A Pet2Pet, antes conhecida como Supermix, entrou no universo das soluções digitais para promover um reposicionamento no mercado, processo iniciado em junho de 2020. A companhia criou um hub de tecnologia para dar suporte a pet shops de pequeno e médio portes, lojas que não têm as mesmas condições de investir em atendimento e evolução como as gigantes do setor. “Esse lojista tem algo muito forte que é a relação com seus clientes, e nós vamos suprir o que não é tão sólido: a diversidade de produtos e a relação digital com o consumidor”, afirmou o CEO da empresa, João Scarpa.

As soluções oferecidas pela Pet2Pet envolvem ferramentas que otimizam a capacidade de gestão, a comunicação e a criação de novos canais de venda e relacionamento, como CRM (Customer Relationship Management), estrutura de VDIs (Vendedores Digitais Internos) e criação de Data Driven. “Temos até um banco de 2 mil templates prontos para o cliente utilizar em sua comunicação, desde uma homenagem ao Dia do Veterinário até um lembrete de vacinação”, disse Scarpa. O executivo não revela os investimentos feitos nessa modernização, mas deixa claro que não há modéstia nos planos de crescimento. Atualmente com três unidades de distribuição em São Paulo e uma no Rio de Janeiro, a Pet2Pet atende 13,7 mil lojas nos dois estados. Até o final deste ano, a operação paulista ganhará uma nova unidade, o que deve agregar mais 5 mil clientes. A meta para 2022 é abranger toda a região Sudeste e, na sequência, avançar para Nordeste e Sul do País. “Até o final do ano que vem devemos atender cerca de 27 mil pet shops no Brasil, ou seja, mais de 50% do mercado nacional de pequenas e médias lojas”, afirmou Scarpa.

Divulgação

“Nosso aplicativo Pet Diabetes Tracker permite ao tutor compartilhar informações com o veterinário para receber orientação” Jayme Alexandre MSD Saúde Animal.

Com uma carteira de clientes que soma 2,6 milhões de pessoas e mais de 470 entidades no segmento de venda e administração de planos de saúde, a Qualicorp se deparou com o mercado de pets durante a busca de potenciais setores para ampliar sua plataforma de negócios, seu novo marketplace. “Começamos uma pesquisa sobre vida e previdência e o mercado de pets surgiu no radar, entre as cinco principais opções”, disse Elton Carluci, vice-presidente da empresa. A entrada oficial nesse mercado aconteceu no início de novembro, a partir de uma parceria com a empresa Amigoo Pet.

COBERTURA Assim como no leque de planos de saúde para as pessoas, a Qualicorp reuniu diversas opções de atendimento para compor o produto de acordo com a necessidade dos clientes, ou a de seus pets: consulta com generalista ou especialista, transporte emergencial ao veterinário, atendimento ambulatorial, vacinas, exames, cirurgias e internação, acupuntura, fisioterapia. Os planos atendem cães e gatos de todos os portes e raças. “O custo mensal dos planos vai de R$ 34,90 a R$ 189,90, mas são semelhantes do ponto de vista da cobertura. O que muda bastante é o valor de reembolso por um atendimento”, afirmou Carluci.

Divulgação

“Até o final de 2022 devemos atender cerca de 27 mil pet shops, mais de 50% do mercado nacional de pequenas e médias lojas” João Scarpa Pet2Pet.

Segundo o executivo, a empresa quer oferecer uma condição imbatível para os clientes. Até porque o novo negócio tem uma função muito mais estratégica, para fortalecer a relação com quem já possui um plano de saúde, do que de impactar rapidamente na lucratividade. “Claro que em algum momento vai nos trazer esse retorno, mas se o cliente faz um combo de produtos, tende a ficar mais tempo com a gente”, disse o executivo da Qualicorp.

CUSTOS INDIGESTOS

Divulgação

O mercado pet também tem seus desafios. O setor de alimentação animal enfrenta dificuldades com o aumento de custo de produção, sobretudo pela alta de preço de suas principais matérias-primas. Segundo José Edson Galvão de França, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet), o grupo formado por vegetais — milho, trigo e arroz — teve aumento além de 70% no custo, enquanto as proteínas animais ficaram 160% mais caras. “O setor não pode repassar todo esse aumento de custo aos consumidores, no máximo chegou a 70%. As empresas estão no limite de sua lucratividade”, afirma.

FEIRAS REFORÇAM O MOMENTO DE RETOMADA

Marcelo Gonçalves

A volta da Pet South America e da Pet Vet, eventos paralelos que não foram realizados no ano passado por conta da pandemia da Covid, também reflete o aquecimento do mercado pet. Entre os dias 30 de novembro e 2 de dezembro, as feiras reuniram cerca de 400 expositores na São Paulo Expo, na capital paulista. A expectativa era receber 26 mil pessoas. Apesar do otimismo em alta, Diego de Carvalho, vice-presidente de Negócios da NürnbergMesse, empresa realizadora dos eventos, diz não poder falar sobre números gerais de faturamento. “Muitas empresas não abrem esses dados”, afirmou. Em números parciais, durante apenas duas horas do primeiro dia de evento foram registrados R$ 4,1 milhões em uma rodada de negócios, com 89 reuniões entre 18 expositores e 31 compradores.

A edição de 2019 teve índices mais altos: foram R$ 6 milhões em 108 reuniões entre 20 empresas e 30 compradores. Mas essa diferença não tira a satisfação dos organizadores, que levam em consideração o menor número de reuniões e o cenário econômico atual no País.