Os tubos em que pessoas entram e são transportadas em alta velocidade por longas distâncias são uma ideia comum na ficção. Apareceram em desenhos dos Jetsons e em filmes do James Bond. Mas a sua origem não tem relação com as histórias ficcionais. Na virada do século XIX para o XX, foi, assim como os automóveis, motocicletas e aviões, uma tecnologia em desenvolvimento para o transporte, que atraiu inventores do quilate de Robert Goddard, considerado o pai dos foguetes espaciais. Entre os motivos para ter sido deixada de lado, estava um estudo que dizia que velocidades acima dos 100 km por hora causariam danos fatais para o ser humano. Mais de um século depois a inovação está sendo ressuscitada por uma nova geração de empreendedores, especialmente dentre os baseados no Vale do Silício.

Uma das pessoas por trás de um dos principais projetos nessa linha, o italiano Bibop Gresta, fundador da empresa Hyperloop Transportation Technologies, esteve no Brasil, no começo de agosto, participando de uma conferência em São Paulo sobre futurismo, organizada pela empresa Aerolito. Também aproveitou para se encontrar com o ministro dos transportes, Maurício Quintella, que teria se comprometido em avaliar a viabilidade da tecnologia no País e apoiar a instalação de um centro local de pesquisa e desenvolvimento. “Será uma grande oportunidade para o Brasil pular a tecnologia do trem de alta velocidade, que é muito cara, perigosa e necessita de altíssimos investimentos.

E pode servir também para o transporte de carga, uma necessidade do País”, diz Gresta, de 45 anos, que tem como primeiro nome Gabriele, e adotou o apelido de Bibop em sua carreira anterior de músico e de apresentador da MTV Itália. Depois disso, ele criou uma startup que acabou vendida à Telecom Italia e fundou a maior incubadora de seu país, que resultou em três IPOs. Agora, Bibop e o seu parceiro, o inventor alemão Dirk Ahlborn, pretendem transportar até 27 pessoas em cada cápsula. A primeira delas está em construção e a promessa é de fazer o sistema funcionar apenas 38 meses depois de receber a aprovação de algum governo. Mas, para entender o projeto da Hyperloop TT, é preciso saber como uma tecnologia que parecia morta voltou a atrair a atenção pelo mundo.

Em agosto de 2013, Elon Musk, o inovador empresário por trás da Tesla, da SolarCity e da SpaceX, publicou um white paper explicando como essa tecnologia pode ser aplicada nos dias de hoje, utilizando o nome de hyperloop para descrevê-la. Segundo Musk, uma cápsula poderá ser levitada, por meio de magnetismo, e trafegar em um tubo com vácuo em velocidade acima dos 1,2 mil km por hora. Dessa forma, seria possível viajar de São Paulo ao Rio de Janeiro em menos de meia hora. O texto de Musk tinha o objetivo de evitar que a Califórnia gastasse US$ 68 bilhões num projeto de trem de alta velocidade, sendo que, segundo as suas contas, o hyperloop poderia levar pessoas em 36 minutos, de Los Angeles a São Francisco, com um projeto de US$ 6 bilhões.

Incentivador: Musk, fundador da Tesla e SpaceX, ressuscitou a ideia em texto publicado em 2013 (Crédito:Jason Merritt | Divulgação)

Musk escolheu não tocar o projeto, para se concentrar em seus planos de popularizar o carro elétrico, criar baterias para casas e levar passageiros ao espaço. Por isso, abriu a sua patente para que qualquer pessoa pudesse desenvolvê-la. Alguns inventores assumiram a missão e já existem três projetos. Além da Hyperloop TT, há as americanas Hyperloop One e a MIT Hyperloop, de professores do MIT. A empresa de Gresta parece a mais avançada. Por diversos motivos. Primeiro, por ter evoluído conversas com diversos governos. Ela ganhou da prefeitura de Toulouse um terreno de testes próximo da fábrica da Airbus.

Um sheik de Abu Dhabi se comprometeu a investir para conectar o emirado árabe à sua cidade, Al Ain. Há acordos para estudos na Coreia do Sul, Indonésia, Brno, na República Tcheca, e Bratislava, na Eslováquia. E recebeu permissão de construção na cidade Quay Valley, na Califórnia. Além disso, o modelo de crowdsourcing adotado pela empresa já virou motivo de estudo na escola de negócios de Harvard. “Mais que uma empresa, somos um movimento”, diz Gresta. O seu sócio e idealizador da Hyperloop TT, Ahlborn, decidiu abrir o projeto a todos que desejam participar.

Com isso, conseguiu, sem a necessidade de investimentos, a participação de 800 engenheiros de 42 países, incluindo gente da NASA, do próprio MIT e da SpaceX. Alguns deles trabalhando em período completo. Em troca por seus conhecimentos, eles recebem ações da empresa. “Já temos 60 mil horas de engenheiros, o que nos exigiria pagar centenas de milhões de dólares”, afirma Gresta. “Quando o meu sócio me convidou para criar a empresa, eu não achava que fosse dar certo, mas, em dois meses, já tínhamos US$ 8 milhões em horas doadas de engenharia e diversas soluções.” Se o hyperloop será uma realidade, em poucos anos saberemos. Mas o transporte da próxima década deve sofrer uma revolução.

“Devemos ter uma mudança de nível tectônico em mobilidade, já que as pessoas não desejam mais ter um carro”, diz o futurista Jacques Barcia, cofundador da startup Futuring.Today. “O conceito de hyperloop é uma dessas coisas, se pensarmos que poderemos viajar longas distâncias de forma mais rápida, com menos custos e gasto de energia irrisório em comparação com o avião. O grande obstáculo é a regulação.” E inovadores excêntricos como Gresta terão uma participação nessa mudança. “Estamos lidando com uma geração melhor do que a minha”, diz o empreendedor. “Fui inspirado por pessoas ‘más’, como os Rolling Stones, os jovens agora querem ser como empreendedores que desejam melhorar o mundo.”