Desde que começou a emitir seus primeiros títulos vinculados a práticas sustentáveis, conhecidos pelo termo em inglês Sustainability-Linked Bonds (SLB), em 2020, a Suzano vem notando um alívio em suas despesas. Pioneira em emitir os chamados títulos verdes, a maior produtora de celulose do mundo já captou US$ 2,75 bilhões a uma taxa média de retorno ao investidor de 3% ao ano. Numa das primeiras emissões a companhia conseguiu captar dinheiro pela menor taxa paga por uma empresa brasileira para títulos com prazo de dez anos. A demanda foi de US$ 2 bilhões, quatro vezes os US$ 500 milhões captados. Depois de quatro emissões com as mesmas características, cerca de 39% da dívida da empresa está atrelada a metas de governança ambiental, social e corporativa, ou ESG. Para comparar, no fim de 2019 essa participação era de apenas 9%. “A pauta ESG ganhou muita relevância, especialmente depois da pandemia. Já vemos bancos e fundos de investimentos exigindo das empresas mais cuidados com esses temas, especialmente em compromissos de longo prazo”, disse o economista e CEO da Veedha Investimentos, Rodrigo Marcatti.

E não basta apenas a empresa afirmar ser socialmente responsável. Para conceder esses créditos, os investidores internacionais exigem provas de que os conceitos ESG vão além do discurso e são aplicados na prática. Não é bondade, é pragmatismo. “Uma empresa alinhada aos princípios ESG indica que tem um risco menor em toda a sua operação, o que chama mais atenção dos investidores”, afirmou o sócio da PwC Brasil para mercado de capitais, Kieran McManus. Em uma pesquisa feita pela consultoria, com 325 investidores institucionais em vários países, a questão dos riscos de ESG foi considerada decisiva para 79% deles na hora de aportar seu capital. Cerca de 56% dos entrevistados afirmaram ter se recusado a investir em companhias pela ausência de práticas de sustentabilidade. “Essa é uma grande mudança na mentalidade no mercado de capitais e quem ignorar isso corre o risco de ficar para trás”, disse McManus.

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“Uma empresa alinhada aos princípios ESG indica que tem um risco menor em toda a operação, o que chama mais atenção dos investidores” Kieran McManus sócio da PwC no Brasil.

Empresas mais responsáveis acabam obtendo classificações de risco, ou ratings, melhores. O professor da Faculdade de Comércio de São Paulo (FAC-SP) Rodrigo Simões diz que elas acabam demonstrando uma preocupação como o todo. “Por isso conseguem benefícios também com crédito mais barato, porque bancos também as olham de forma diferente”, afirmou. Mas, enquanto a preocupação com a preservação do planeta cresce no mundo inteiro, o Brasil ainda está atrás. Os fundos ESG já representam 41,6% no total da indústria na Europa e 33% nos Estados Unidos, mas não chegam a 5% no Brasil, segundo a Global Sustainable Investment Alliance (GSIA).

No entanto, esse volume vem crescendo de forma mais acelerada nos últimos três anos. As captações bateram recorde em 2021, registrando R$ 78,1 bilhões de janeiro a novembro. Isso representa alta de 705% ante os R$ 9,7 bilhões de 2019. O resultado levou a indústria dos títulos verdes a um estoque de quase R$ 131,5 bilhões, conforme levantamento das emissões domésticas e internacionais feitas pela organização social de interesse público Sitawi Finanças do Bem.

R$78 bilhões foram captados no Brasil em 2021. Um recorde.

ATRASO O economista e consultor do Banco Mundial Guido Penido afirma que os mercados internacionais estão mais avançados, mas o Brasil está tentando fechar esse gap. “E o mercado vem respondendo, por isso devemos continuar crescendo”, disse. Segundo ele, a agenda verde, no entanto, é muito dependente dos movimentos políticos internacionais. “Por isso, essa questão do clima ficou parada quando os Estados Unidos decidiram sair do Acordo de Paris. Mas com a eleição do presidente Joe Biden o assunto recuperou relevância”, disse Penido.

Nesse cenário, mesmo quem ainda se questiona sobre a adoção de medidas sustentáveis pode ser colocado em xeque. A partir do próximo ano, as companhias abertas brasileiras terão de ser mais transparentes em relação a suas práticas ambientais, sociais e de governança. A Resolução 59, publicada em dezembro de 2021 pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), vai exigir mais clareza das companhias abertas sobre suas iniciativas. Elas terão de fornecer informações detalhadas sobre a metodologia utilizada, auditorias e indicadores, entre outras informações. O objetivo é ver se a empresa pratica o que diz e explica como está sendo feito. Marcatti, da Veedha, diz que “tudo vai se refletir em menos spread e menos taxas nos papeis emitidos. “E num momento de juros estressados, qualquer desconto é um ganho importante.”