A bordo de uma bicicleta, o argentino Federico Vega, 40 anos, percorreu estradas no Brasil, Argentina e Chile, para reencontrar amigos. A aventura rendeu a possibilidade de conhecer os encantos e os percalços na rotina de caminhoneiros que cruzam os respectivos países em busca do sustento. E, mais do que isso, o motivou a criar – em 2013 – a Cargo X, plataforma de tecnologia brasileira que faz a ligação dos ‘donos da estrada’ e de transportadoras com embarcadores de carga. O crescimento gradual da empresa, que em 2020 chegou a registrar alta de 75% na receita em comparação com 2019 – quando faturou R$ 500 milhões –, anima o empresário a iniciar o planejamento para a expansão do negócio pela América do Sul. “Estamos fazendo o mapeamento. A ideia é levar o modelo a países que fazem fronteira com o Brasil em 2021”, afirmou o CEO à DINHEIRO.

O fato de o Brasil ocupar área central do continente é visto com bons olhos pelo economista, que aponta circulação intensa de caminhões para os países vizinhos. “O maior tráfego de pesados entre países na América Latina está na fronteira entre Brasil e Argentina” , disse. De acordo com a Associação Brasileira de Transportadores Internacionais, cerca de 800 veícullos pesados seguem diariamente em direção ao país vizinho.

E os caminhões mostram-se essenciais no mercado nacional. Pesquisa da Fundação Dom Cabral revela que 76% do que é produzido no Brasil é escoado por estradas e rodovias. São, no total, cerca de 1,7 milhão de quilômetros que cortam o território e colocam o País no mesmo patamar de China, Estados Unidos e Índia, detentores das maiorias malhas rodoviárias do mundo. O segmento movimenta anualmente US$ 100 bilhões no Brasil. E a meta da Cargo X é aumentar a eficiência do setor, evitando que os caminhões circulem vazios, além de ampliar a lucratividade dos caminhoneiros, atualmente em cerca de 10% do valor do frete — calculado com base em custos de pedágio, combustível, segurança, entre outros fatores.

A ferramenta digital funciona por meio de aplicativo móvel e serve de ponte entre os caminhoneiros e as embarcadoras para a contratação de um serviço. São 200 mil motoristas ativos por mês conectados a 12 mil transportadoras. Apesar do cenário desafiador causado pela crise sanitária, o app registrou alta de 48,3% no número de usuários em 2020. E a expectativa do fundador é a de que o negócio cresça ainda mais em 2021. Apenas no mês passado, a Cargo X registrou alta de 60% no número de embarcadores na plataforma e de 65% no acesso de caminhoneiros, em comparação com o mesmo período do ano passado. “Estimamos um aumento de 80% no faturamento”, afirmou.

A aposta da companhia está na força do agronegócio, que no ano passado contratou 44% mais frete em relação a 2019. A alta do dólar favoreceu a exportação de commodities com valor recorde de US$ 100,8 bilhões. O setor acabou beneficiado pela redução no custo do diesel, provocada pela demanda menor e também pela queda no valor do barril de petróleo, o que diminuiu o custo operacional. “Tudo isso fez com que o agro tivesse impacto positivo no setor de transporte”, disse. Dentro do agro, segundo a Cargo X, os gêneros alimentícios, grãos, fertilizantes e químicos foram, respectivamente, os responsáveis pelas maiores movimentações financeiras na plataforma.

Para Vega, no entanto, o crescimento da plataforma foi estimulado, principalmente, por investimentos. Apenas em 2020, a Cargo X recebeu aporte de R$ 430 milhões da LGT Lightstone, além de R$ 15 milhões da Pattac Empreendimentos e Participações, para reforçar o caixa durante a pandemia. Parte desse montante foi utilizado na aceleração da transformação digital, o que incluiu melhorias no aplicativo com novas funcionalidades, como informações sobre custo de combustível e de pedágios, por exemplo. “Como estávamos capitalizados, enquanto todo mundo estava tentando economizar, investimos forte”, afirmou. “Crescemos e, em 2021, não está sendo muito diferente.”

A satisfação pelos resultados se transforma em preocupação ao abordar a situação financeira de transportadoras parceiras que, impactadas pela crise, encerraram as atividades ou encontram dificuldades para honrar os compromissos financeiros. Por meio do programa Capital de Giro, a empresa liberou R$ 400 milhões para o desenvolvimento desses negócios. “Temos muitas pessoas morrendo e muitos negócios quebrando.” A Cargo X estuda a criação de produtos financeiros que possam beneficiar os caminhoneiros, como financiamento de veículos e empréstimo pessoal.

A exemplo de qualquer outra empresa, a Cargo X não está imune a críticas. O executivo revela queixa dos caminhoneiros quando, por exemplo, não encontram na plataforma disponibilidade de frete para o tipo de carga que transportam. “Eles ficam bravos. Mas temos mais elogios do que reclamações.” Sinal de que, apesar das estradas sinuosas e nem sempre sinalizadas, a Cargo X acelera firme rumo à próxima parada. A aventura está só começando.