As cenas épicas do filme Entre Dois Amores (Out of Africa) conquistaram sete estatuetas no Oscar de 1986. Mas não só isso. Também arrebataram o alemão Jochen Zeitz, hoje com 55 anos. Dirigido pelo americano Sydney Pollack (1934-2008), a trama conta a história real da dinamarquesa Karen von Blixen-Finecke — interpretada por Meryl Streep —, uma mulher independente, que controla uma fazenda de café no Quênia e se vê fascinada pela rica cultura africana. Tamanho deslumbre visual despertou o interesse de Zeitz que, além de ter comprado biplano Gipsy Moth 1929, aeronave utilizada no filme, também procurou conhecer melhor as planícies da região. Em 2005, ele adquiriu uma área com mais de 50 mil acres no país e fundou, anos depois, o Segera Retreat, um ambiente de preservação e restauração da fauna e da flora local. Em 2008, criou a Zeitz Foundation, uma organização sem fins lucrativos (ONG) que apoia iniciativas sustentáveis e de responsabilidade social no mundo.

Localizado na região queniana de Laikipia, na linha do Equador, o Segera Retreat só foi aberto para a visitação pública em março de 2013. Pouco a pouco, ganhou ares de alto luxo. Hoje, seis vilas privativas estão compostas dentro da área. A maioria delas conta com quartos de alto padrão e piscinas. Todas as acomodações são movidas a energia solar. Também há academias de ginástica, alta gastronomia, bares e adegas que dispõem de alguns dos principais rótulos de vinhos europeus e africanos. Tudo isso é incluso na diária do lodge, que tem valor entre US$ 1,2 mil e US$ 1,8 mil. Pelo menos duas vezes ao dia, os hóspedes deixam seus aposentos para ganhar as pradarias da região. A vida selvagem pode ser vista a bordo de um veículo 4×4 ou, até mesmo, a pé — sob acompanhamento de um guia local. Elefantes, leões e zebras são alguns dos animais que vivem no Segera Retreat. “Às vezes, no safári que é realizado no meio da tarde, o guia escolhe um lugar especial, para o carro e serve taças de champanhe, uísque ou vinho. Enquanto você observa os animais, pode desfrutar de um bar completo”, diz Corinna Sagesser, ex-diretora de marketing da Mitsubishi, que visita o local ao menos uma vez por ano.

Além de oferecer uma vista privilegiada para a savana africana, o Segera Retreat busca valorizar a cultura do local. Cada vila é decorada com obras de artistas africanos. A ideia vem de seu fundador. Zeitz começou a adquirir as artes na década de 1990. Sob o comando da Puma, patrocinou eventos que valorizavam a cultura afro-americana. Mas foi recentemente que ele mexeu as peças para construir sua maior jogada. Em uma conversa com o amigo sul-africano Mark Coetzee, Zeitz decidiu criar um museu de arte africana contemporânea. Ele adquiriu, então, uma área de 9,5 mil metros quadrados, que antes era um gigantesco silo de grãos no século XIX, e ergueu o imponente Zeitz Mocaa, na África do Sul, em 2017. O museu foi projetado pelo britânico Thomas Heatherwick, e conta com mais de 100 galerias expostas – uma parte do acervo adquirido nas últimas décadas pelo empreendedor alemão foi repassada ao espaço.

Na natureza selvagem: os visitantes podem se servir de um jantar à beira da selva, em pleno pôr do sol (Crédito:David Crookes)

Antes de enveredar pelos lados da sustentabilidade, Zeitz dedicou duas décadas à companhia de materiais esportivos Puma. Ele se juntou à equipe de marketing da empresa alemã em 1990 e, três anos depois, tornou-se o CEO, o mais jovem a assumir uma empresa pública no país. Ele tinha 30 anos. Sob seu comando, a Puma enxugou o corpo diretivo, migrou parte da produção para a Ásia e apostou no patrocínio de times e seleções africanas de futebol. Essa foi a receita do sucesso da empresa que quase faliu no fim dos anos 1980. Conforme o tempo passou, Zeitz se viu cada vez mais dividido entre o cargo na Puma e seus projetos pessoais. Até que, em 2011, resolveu deixar a empresa alemã e assumiu a posição de liderança no grupo global de luxo Kering, detentor das marcas Gucci e Saint Laurent. Em 2012, ele se reuniu com o bilionário Richard Branson, fundador do grupo Virgin, para dar início ao B-Team, uma iniciativa de líderes empresariais que preconiza o bem-estar das pessoas e do planeta.

APOIO À MULHER Além de ter criado o Segera Retreat, o empreendedor apoia outras causas em solo africano. Uma delas é a Satubo Women Group, uma comunidade formada em 2011, por mulheres de três diferentes povos quenianos: Samburu, Turkana e Borana. “Essas mulheres moram próximas ao lodge. Elas fazem peças de miçangas e vendem aos hóspedes do Segera. Com o dinheiro arrecadado com a venda dessas peças de arte, conseguem melhorar o padrão de vida delas”, diz Corinna, que se apaixonou tanto pelo projeto que decidiu propor uma ajuda. Brasileira e filha de suíços, ela organizou uma mostra fotográfica das mulheres da Satubo em novembro de 2018. Acompanhada do amigo e fotografo paulistano Tuca Reinés, a exposição, realizada na Galeria Estação, em São Paulo, arrecadou US$ 18 mil, que foram revertidos para a construção de uma creche no Quênia. Uma mostra de que toda ajuda pode fazer a diferença no mundo.