Depois de três décadas trabalhando como enólogo da Vega Sicilia, vinícola famosa por elaborar o mítico Único, um dos rótulos mais prestigiados da Espanha, Mariano García Fernández decidiu abrir o próprio negócio de vinhos. Em 1999, ele se associou a Javier Zaccagnini para fundar a Aalto Bodegas y Viñedos. “O nome é uma homenagem ao arquiteto finlandês Alvar Alto”, afirmou Eduardo Ferrín, diretor geral da empresa, durante sua primeira visita a São Paulo, na semana passada. “Muita gente pensa que, por repetir a letra A no início, esse nome garanta que estejamos sempre na primeira posição em todos os guias de vinhos que usam a ordem alfabética”, prosseguiu Ferrín, em tom de brincadeira.

Ocupar a primeira posição entre as melhores vinícolas do mundo, contudo, não é algo que se deva atribuir às letras estampadas em cada um de seus rótulos. O que vai dentro da garrafa, sim, é que merece um lugar de destaque em qualquer pódio — sobretudo quando o vinho em questão é o AAlto PS. Foi essa a conclusão do grupo de especialistas que participou de uma degustação vertical de cinco safras dos rótulos da vinícola, importados para o Brasil pela World Wine. Nas palavras de Manoel Beato, sommelier do grupo Fasano, trata-se de um “clássico da modernidade”, por apresentar um estilo que honra a tradição dos grandes vinhos de guarda das melhores regiões produtoras adicionando personalidade própria e uma abordagem contemporânea do mundo enogastronômico.

SONHO REALIZADO Mariano García e o exterior da vinícola Aalto, inspirada na obra do arquiteto finlandês Alvar Alto. Opulência nas instalações e no vinho (Crédito:Divulgação)

As cinco taças de Aalto se destacaram no encontro Adega International Tasting 2019, no hotel Unique, em São Paulo, organizado por Christian Burgos, também responsável pela feira Provino, para profissionais do setor. A jornada teve quatro degustações: uma vertical de cinco safras do argentino Finca Bella Vista, produzido pela vinícola Achaval Ferrer; uma seleção de “maluquices” feita por Patricio Tapia, do Guia Descorchados, do qual Burgos também é sócio; cinco safras do Aalto e quatro do inusitado Il Caberlot. Trata-se de um vinho produzido na Toscana pela Carnasciale, criada por um casal de alemães para cultivar exclusivamente a raríssima uva híbrida que resulta do cruzamento de cabernet franc e merlot.

Todas as amostras surpreenderam, mas coube às cinco safras do espanhol a unanimidade nos elogios. “O sucesso na indústria do vinho se mede por séculos e não por anos”, afirmou Burgos ao comentar o quanto a Aalto conseguiu inovar e mexer com o imaginário desse mercado em apenas 20 anos. Nesse período, Mariano García e a equipe que ele dirige conseguiram eleborar vinhos de estilo marcante — e distintos a cada safra. Situada ao norte de Madri, a apelação Ribera del Duero é o reino da uva tempranillo, única usada em todas as garrafas de Aalto. Ainda assim, cada uma parece ter a própria história para contar. Como?

madeira A resposta é complexa, assim como as variações de coloração, aromas e sabores de cada uma das safras obtidas até agora. As 200 parcelas de vinhedos onde são colhidas as uvas que seguem para microvinificação em Quintanilla de Arriba ocupam 130 hectares, em nove cidades — e cada terroir tem um caráter. As altitudes variam de 750 a 950 metros em relação ao nível do mar. A idade das plantas também muda (entre 40 e 100 anos), assim como o rendimento das videiras.

LABORATÓRIO Os tanques em formato insólito onde ocorre a microvinificação e as safras 2006, 2010 e 2016 do PS: resultados distintos com a uva tempranillo (Crédito:Divulgação)

Em La Horra-Roa, terroir onde Mariano diz tomar “grandes decisões”, é de apenas 2,5 toneladas por hectare, menos de um terço do usual. Fertilizantes químicos e herbicidas são vetados. Na vinícola, em quatro pisos, todas as trasfegas ocorrem por ação da gravidade — até o engarrafamento. A experiência do enólogo define cada passo. No caso do Aalto PS 2006, foram 32 meses de estágio em barricas, 70% delas de carvalho francês novo. “A Espanha tem tradição no uso de madeira e o Mariano é um craque nisso. Ele conseguiu criar uma grandeza para o vinho”, diz Beato.

As pontuações confirmam: foram 97 pontos tanto pela avaliação da revista Wine Enthusiast quanto pela da Adega. O rigoroso Robert Parker concedeu 96 pontos. Ao descrever suas impressões da safra 2010, Arthur de Azevedo, diretor da Associação Brasileira de Sommeliers de São Paulo (ABS-SP), foi bem generoso: “O final é opulento. Apesar de ter nove anos, ainda é jovem. Pode atingir seu auge em dez ou 15 anos”. A safra do Aalto PS 2016 chega agora ao Brasil em apenas 200 garrafas, ao preço de R$ 1.290,00 para o consumidor final. Apesar do valor elevado, mercado não falta. Segundo Eduardo Ferrín, a produção é exportada para 45 países e 100% dela é vendida antecipadamente.