Uma guerra silenciosa está se desenrolando nos bastidores do mercado de alto luxo esportivo no Brasil. De um lado está a Via Italia, importadora oficial das marcas Ferrari e Maserati e, desde outubro do ano passado, também representante oficial da Lamborghini para o Brasil. Do outro se encontra o empresário Natalino Bertin Junior, dono da Platinuss, o maior vendedor independente de Lamborghini do País.

Apesar de ninguém falar em valores, a disputa é por um mercado que movimenta milhões de euros. Os dois lados são poderosos, têm artilharia pesada e pedigree. A Via Italia pertence ao empresário Francisco Longo, que se especializou em vender carros para clientes abastados. Conhecido no mercado como discreto, mas extremamente atuante, Longo faz questão de mostrar aos seus clientes os detalhes e novidades do carro que está sendo vendido.
 

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Bertin Junior: o dono da importadora Platinuss acusa a Via Italia de vender carros com margens de lucro muito altas.
Por isso, as Lamborghinis que ele vende seriam mais baratas

 

É respeitado aqui no Brasil e em Maranello (sede da Ferrari) pelo trabalho que faz com a marca. Já Natalino Bertin Junior é novato nessa área de automóveis, mas o seu sobrenome abre muitas portas. Ele é herdeiro do grupo Bertin, um dos maiores conglomerados empresariais do Brasil, e começou a vender carros em 2007, quando passou a visitar diversas fábricas de automóveis superesportivos, nos mais variados países, para ser representante delas no Brasil.

Hoje, ele representa oficialmente as marcas Pagani (italiana) e Spyker (holandesa) e revela que também será o representante exclusivo da sueca Koenigsegg ?Vou vender o carro mais caro do Brasil. Vai custar R$ 6 milhões?, diz Bertin Junior. Mas seu grande sonho de consumo era mesmo a Lamborghini. Por isso, entre 2007 e 2008, esteve 12 vezes em Sant?Agata Bolognese, na Itália, para conseguir a representação oficial da marca. Em uma dessas visitas, descobriu que outros dois grupos tinham o mesmo interesse.

A Eurobike, revendedor autorizado de marcas como Porsche, BMW e Audi, entre outras, e Leonardo Senna, responsável por tornar conhecida a Audi no Brasil. ?Eles (os italianos da Lamborghini) sempre me disseram que, entre esses dois grupos, eu era o mais forte para representá-los. Gastei dinheiro inclusive fazendo testes de combustível e enviando relatórios para a Itália?, diz Bertin Junior.

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Máquina milionária: a Platinuss começará a vender carros da sueca Koenigsegg. Alguns exemplares custarão R$ 6 milhões
 

A decepção veio, no fim de 2008, com um telefonema direto da sede da Lamborghini avisando que o importador oficial seria a Via Italia. ?Ela não estava entre os concorrentes. Não sei em que fase ela entrou, mas posso garantir que não fazia parte do grupo que estava concorrendo inicialmente?, reclama o dono da Platinuss. ?Ninguém entendeu nada. O mercado todo foi pego de surpresa.?

O que pouca gente sabia, entretanto, é que, desde 2007, a fabricante italiana começou a nomear revendedores de Ferrari, nos Estados Unidos, para também venderem Lamborghini, só que em outro showroom. A iniciativa deu tão certo que logo que Chico Longo entrou na concorrência já tinha todas as credenciais para gerir o negócio no Brasil.

A Via Italia era a única entre seus concorrentes que tinha a experiência de trabalhar com o mercado de superesportivos de luxo no Brasil. Quase um ano depois, no final de outubro de 2009, a loja da Lamborghini, na avenida Europa, em São Paulo, começava a funcionar oficialmente a poucos quarteirões da Platinuss. A primeira ação contra o importador independente veio sob a forma de uma carta extrajudicial que pedia a retirada imediata do logo da Lamborghini da fachada da loja. Bertin Junior, por sua vez, diz que houve um telefonema da própria fábrica solicitando a retirada. Pedido que foi atendido imediatamente, sob pena de ele levar um processo.

Mas a entrada da Via Italia no negócio não fez Bertin Junior tirar o pé do acelerador. Muito pelo contrário. Em 2008, a Platinuss comercializou 22 Lamborghinis, 17 delas zero-quilômetro. Neste ano, foram duas unidades contra cinco da revenda oficial. ?Quem compra um carro fora do importador oficial não tem garantia de fábrica, que é de dois anos. Se aparecer um carro com problema que não foi vendido aqui na loja, nós não consertamos, diz Jaroslav Sussland, diretor de relações internacionais da Via Italia.

?Além disso, o nosso carro é o único que vem adaptado para a gasolina brasileira e nossos mecânicos são treinados na própria fábrica?, completa. Bertin Junior rebate dizendo que também dá garantia de fábrica ? não explica como ? e que está investindo R$ 1,5 milhão em uma oficina própria que será inaugurada até o fim do ano.
 

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Disputa acirrada: a loja oficial da Lamborghini (acima) já vendeu cinco unidades nos primeiros meses do ano.
A Platinuss (abaixo) já comercializou duas unidades

 

E vai além: ?Tenho o dossiê oficial da Lamborghini com tudo que era preciso para montar uma loja no Brasil. Eu sabia omo tinha que ser o showroom e até a política de preços pela qual os carros tinham que custar entre 5% e 10% a mais do que uma Ferrari. Nunca vi nada sobre adaptação para a gasolina brasileira.?

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O preço do carro também causa controvérsia. Na revenda oficial o modelo mais barato, o LP560 Coupe, sai por R$ 1,4 milhão. Na Platinuss, o mesmo carro custa R$ 150 mil a menos. Os concorrentes dizem que não sabem como ele ganha dinheiro. Bertin Junior diz paga todos os impostos corretamente, que ganha o suficiente para manter a operação no azul e que a margem de lucro dos outros é que é grande.

Para conseguir o carro, a Platinuss compra diretamente de uma concessionária italiana. Atualmente, seu fornecedor é o ADMilano, um concessionário em Milão que já foi descredenciado pela Lamborghini, mas que ainda pode comercializar os carros da marca por mais um tempo.

O problema é que esse tempo está expirando e a Platinuss, se quiser continuar vendendo Lamborghinis, terá de arrumar outro concessionário que aceite vender o carro para um importador que não é oficial. ?Só compro carro porque tenho demanda. Mas quero, aos poucos, concentrar meus negócios nas marcas que represento?, diz Bertin Junior.

O próximo round desta briga já tem data marcada. Acaba de ser lançada a Lamborghini LP 570 Superleggera. Na Europa, ela começa a ser vendida no próximo mês. Depois, são feitas as vendas para os Estados Unidos e, por último, para o resto do mundo. Enquanto o revendedor oficial fica de mãos atadas, os importadores independentes vão poder trazer a novidade bem antes.

E, neste mercado, ter a novidade antes conta muito. Bertin Junior quer ser conhecido no mercado brasileiro como o importador oficial de grandes marcas. Só precisa ter cuidado para no futuro não sofrer do mesmo mal que os revendedores autorizados estão sofrendo hoje.

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