“Como estão os negócios na Ucrânia?” Como assim? Alguém está trabalhando em meio a bombardeios, destruição das cidades abandonadas de Bucha e Mariupol, ataques a depósitos de combustível nas regiões de Kharkiv, Mikolaiv e Donbass e ameaça constante de tomada do centro histórico e cultural de Kiev. Seis semanas depois do início da guerra iniciada pela Rússia, empreendedores ucranianos estão usando criatividade e senso de sobrevivência para manter seus negócios funcionando. Com fortes ligações com a, agora inimiga, Rússia e Oriente Médio, a Ucrânia está no coração da Europa e é um país com muita burocracia (estava ranqueada na posição de número 137 entre 185 economias com mais facilidade de se fazer negócios).

Empresas como a desenvolvedoras de aplicativos e websites Zfort, em Kharkiv, presta serviços para empresas nos Estados Unidos e outros países e seu chefe de operações, Roman Shekin, tentava tranquilizar seus clientes dizendo que estavam preparados para movimentos inesperados e que conviviam com guerras por alguns anos já, mencionando 2014, quando a Rússia anexou a Crimeia. Agora, site e instagram estão parados, sem sinal de vida, e o executivo diz que colocou os contratos em espera, mesmo tendo sua infraestrutura em nuvem em servidores na Europa. Os negócios tecnológicos levam essa vantagem da possível mobilidade, enquanto os mais tradicionais, físicos, em cidades sob ataques, praticamente fecharam suas portas. Por enquanto…

Empresas realmente estão vivendo o drama da evacuação – e o trabalho é parte da sensação de sobrevivência psicológica que o ucraniano tem na mão. Alex Yelenevych, cofundador da CodeGym.cc, empresa de ensino de Java para desenvolvedores, tinha grandes planos antes da guerra. Depois de lançar produtos gratuitos na China, Europa e EUA, estava prestes a lançar a Java University, versão paga, quando ouviu barulho de bombas em Kiev em 24 de fevereiro. Alguns de seus colegas de trabalho abandonaram a cidade em direção a vilarejos afastados, levando alguns poucos laptops do escritório. A preocupação de todos era dinheiro e o futuro. Um funcionário rodou 50 quilômetros de bicicleta, parando na metade do caminho para trabalhar por várias horas, e retomar sua jornada. “Ucranianos são inquebráveis”, disse Yelenevych em depoimento à Entrepreneur’s Handbook. A empresa também tem seus servidores fora, na Alemanha e Estados Unidos. Sua designer foi para uma vila com péssima internet. Para manter os salários, fizeram um brainstorm e resolveram dar 50% de desconto em seu curso de Java e trocar o Java University, de 12 meses, por um Java Fundamentals de três. “Nossos clientes de outros países nos deram fé, oferecendo ajuda, até acomodações para nossos colaboradores”, disse Yelenevych, que adotou três projetos sociais na Ucrânia, um de informações de banco de sangue, outro de ajuda psicológica para crianças em meio à guerra e o de evacuação de pessoas com deficiências físicas de hot spots.

A empresa aérea que produziu o maior avião de carga existente (até mísseis o destruírem), o Antonov, chamada Kharkiv State Aircraft Manufacturer, já estava em uma posição difícil, pois 70% de seus componentes vinham da Rússia, em conflito com a Ucrânia há tempos. Com uma dívida de US$ 170 milhões, não produzia um avião há oito anos. Com a guerra, possíveis investidores ocidentais sumiram. Seu diretor, Oleksandr Kryvokon, tem esperança que empresas na Ucrânia se mobilizem para a construção de aviões para defender o país – já imaginando um conflito longo.

Os efeitos do longo conflito com a Rússia desde 2014 já desmantelaram alguns negócios, até mesmo dentro do maior mercado da Europa Oriental, o Barabashovo, com 15 mil lojas e 60 mil funcionários. Uma vendia sistemas de aquecimento para a indústria de construção. Os leais clientes de Viktor Kuzmenko na Rússia, depois de 2014, desapareceram, perdendo 70% de seu volume de negócios. “Dependo de pessoas com muito dinheiro e ninguém investe em construção em um lugar com ameaças e, agora, em guerra”, disse à BBC. A Ucrânia, em poucas semanas, virou um lugar tóxico para investimentos.