Por Ana Mano

SÃO PAULO (Reuters) – Uma alta expressiva no preço do milho tem feito com que grandes frigoríficos brasileiros se voltem ao trigo como um substituto do ingrediente na ração animal, de acordo com um representante da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

Francisco Turra, que preside o conselho consultivo da entidade, disse à Reuters na sexta-feira que a demanda das empresas de carne está levando a um aumento nas intenções de plantio de trigo em seu Estado, o Rio Grande do Sul.

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O trigo poderia substituir 100% do milho na alimentação de suínos e aves, disse ele. A indústria de carne fornece ração para os criadores de animais integrados.

Citando dados da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Turra disse que a área a ser plantada com trigo e outras culturas de inverno em 2021, a partir do próximo mês, pode crescer de 1 milhão de hectares para 1,4 milhão de hectares no Estado.

“A JBS e a BRF já anunciaram que vão comprar safras de inverno como trigo, triticale e cevada para usar como ração”, disse Turra. Ele afirmou que essas empresas já fizeram negócios para entrega futura.

Procurada, a BRF afirmou em nota que “o uso de cereais de inverno na alimentação animal é bem consolidado e amplamente utilizado em outras regiões do mundo, como a Europa”, e já é uma realidade e um diferencial da companhia.

“A BRF segue intensificando os estudos e avançando nas aquisições de ingredientes alternativos para encontrar o melhor equilíbrio na utilização das rações”, disse a empresa à Reuters.

A JBS não quis comentar o assunto.

Os contratos futuros do milho nos EUA atingiram seu maior nível em quase oito anos esta semana na bolsa de Chicago, impulsionados por preocupações com a produção do milho de segunda safra no Brasil. O tempo frio nos EUA, que afeta a germinação da safra de 2021 do cereal, também ajudou a elevar os preços.

Os altos preços e os atrasos na segunda safra de milho do Brasil têm pressionado as margens dos frigoríficos, levando algumas empresas a buscar suprimentos no Paraguai e na Argentina enquanto a oferta está restrita no Brasil.

Esta semana, o governo suspendeu temporariamente tarifas de importação de soja e milho de países fora do Mercosul, o que significa que o Brasil também poderia importar milho de nações como EUA e Ucrânia.

No entanto, com a “paridade de importação” acima de 30 dólares por tonelada, comprar milho de fora do Mercosul ainda não faz sentido economicamente, disse um trader.

Usar o trigo como ração animal é comum no Canadá e na Rússia, que não produzem milho nem o importam, disse Turra, que foi Ministro da Agricultura entre 1998 e 1999.

Além de ser uma alternativa para frigoríficos nacionais, o trigo na ração poderia ainda alavancar o potencial produtivo das lavouras no Rio Grande do Sul, que produz apenas 1,09 safra de grãos por ano, enquanto alguns Estados brasileiros produzem três.

Segundo dados da Farsul, a área plantada com culturas de verão no Rio Grande do Sul monta a 6,6 milhões de hectares, cerca de 6 vezes maior que a área destinada às culturas de inverno.

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