O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem, em Esteio (RS), que os apoiadores que participaram dos atos do 7 de Setembro foram às ruas contra “retrocessos”, mas ressaltou que os três Poderes “devem ser respeitados”. Foi a primeira viagem do presidente após as manifestações de caráter antidemocrático, na terça-feira, e a nota em que ele recua das críticas feitas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao ministro Alexandre de Moraes.

Bolsonaro recebeu a Medalha do Mérito Farroupilha durante uma feira do agronegócio. Ele chegou ao evento por volta das 11h, sem máscara, acompanhado da ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Cumprimentou apoiadores e não respondeu a perguntas de jornalistas. “Senti os reais motivos para esse povo ir às ruas. Em primeiro lugar, foi para dizer que não aceita retrocessos. O povo quer respeito à Constituição por parte de todos e, acima de tudo, eles sabem que não podem deixar de lado sempre a defesa e a luta pela nossa liberdade.”

O presidente não disse o que seriam os “retrocessos”, desconsiderando que a agenda golpista dos atos de 7 de Setembro partiu dele próprio. Na quintafeira, pressionado por ameaças de impeachment e por uma paralisação de caminhoneiros, Bolsonaro recuou e divulgou uma nota em que até elogiou o ministro Moraes, em um movimento que contou com a participação crucial do ex-presidente Michel Temer.

“Temos três Poderes, têm que ser respeitados, e buscar sempre a melhor maneira de nos entendermos para que o produto do nosso trabalho seja estendido aos seus 210 milhões de habitantes”, disse Bolsonaro, afirmando que o Brasil, aos poucos, “vai mudando”.

Em Esteio, Bolsonaro evitou críticas diretas à Corte, mas voltou a afirmar que uma eventual decisão do STF contra a tese do marco temporal na demarcação de terras indígenas resultaria no “fim do agronegócio” no Brasil. “Se a proposta do ministro (Edson) Fachin vingar, será proposta a demarcação de novas áreas indígenas que equivalem a uma região Sudeste toda. Ou seja, é o fim do agronegócio, simplesmente isso e nada mais do que isso”, disse Bolsonaro.

Na quinta, Fachin, relator do caso no STF, deu seu voto favorável aos povos indígenas e contra o reconhecimento da constitucionalidade da tese do marco temporal. O julgamento deve ser retomado na próxima terça-feira, quando o STF chegará ao 20º dia de análise, ainda sem definição clara de maioria.

A tese do marco temporal funciona como uma linha de corte ao sugerir que uma terra só pode ser demarcada se ficar comprovado que os indígenas estavam naquele território na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Caso seja validado pelo STF, o entendimento poderá comprometer mais de 300 processos que aguardam demarcação, conforme dados do Instituto Socioambiental (ISA) com base em publicações feitas no Diário Oficial da União. Fachin declarou que a Constituição reconhece como “permanente” o “usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos” preservados pelas comunidades indígenas.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.