Um trem-bala cibernético começa a trafegar nas próximas semanas pelos trilhos da América Latina Logística (ALL), estrela do recém-privatizado setor ferroviário brasileiro. Viajará na velocidade da luz e transportará, em vez de passageiros e carga, informação, na forma de dados, voz ou imagem. Na locomotiva, irá Jorge Paulo Lemann, maquinista do GP Investimentos, grupo controlador da ALL e de grandes companhias de diversos setores, como Ambev, Lojas Americanas e o site Submarino. GP, ALL e outros sócios minoritários reservaram R$ 1 bilhão para construir nos próximos três anos, ao longo dos 15 mil quilômetros de estradas de ferro por eles administradas, o que chamam de ?primeira operadora de banda larga via malha ferroviária do País?. Os primeiros 2 mil quilômetros de cabos de fibras ópticas já estão sendo enterrados a uma profundidade de 1,20 metro junto ao leito das ferrovias, que cortam todo o Sul do Brasil, parte de São Paulo e a fatia mais próspera da Argentina. Na área administrativa e operacional, cerca de 50 pessoas trabalham em silêncio há seis meses no projeto, que só deve ser anunciado oficialmente no final desta semana. Os últimos detalhes estão sendo acertados. Um deles, crucial: até a noite da quinta-feira 8 o nome da nova empresa estava indefinido.

?Ainda não fomos batizados, mas já nascemos como uma das maiores companhias brasileiras do setor?, afirmou à DINHEIRO Roque Versolatto, presidente da operadora. ?Com os acordos que firmamos com outras fornecedoras de banda larga, nossa área de abrangência já chega a 10 mil quilômetros. Não há rede deste porte interligando os dois maiores países do Mercosul?, completou Roberto L. A. da Costa, vice-presidente de Desenvolvimento de Negócios. O comboio tecnológico de Lemann entra nos trilhos de um dos mais promissores filões das telecomunicações.

Multinacionais de grande porte, como Embratel (leia-se MCI WorldCom), AT&T, Telefonica, Global One, MetroRed e 360Networks investiram bilhões para espalhar redes de fibras ópticas nas principais cidades brasileiras e marcar posição num mercado explosivo. Somente este ano, os serviços de transferência de dados e acesso à Internet em alta velocidade devem render às operadoras cerca de U$ 3 bilhões. A partir do ano que vem, quando as regras do setor de telecomunicações brasileiras passam a permitir uma competição ainda maior, o ritmo de crescimento deve superar a casa dos 50% ao ano.

No plano de negócios apresentado aos acionistas, os executivos da nova companhia, incubada dentro da ALL, garantem ser capazes de conquistar até mil clientes nos próximos três anos, o que lhes daria 10% de participação do segmento no País e uma receita total de R$ 3 bilhões. Se conseguirem obter na prática o que escreveram no papel, ficarão em situação invejável. ?Fugiremos do grande endividamento que as outras empresas têm de enfrentar e, assim, ganharemos maior flexibilidade para batalha de preços que vem por aí?, afirma Caio Graccho, vice-presidente de vendas e marketing. O negócio fica ainda mais atraente, lembra, quando se observa outra peculiaridade do setor: nas extensas teias de fibras ópticas que estão sendo tecidas no País, não há ninguém capaz de cobrir todo o território sem firmar parcerias com os donos de outras redes. ?Assim, todo concorrente é também um potencial cliente?, diz Graccho. Para a sua empresa, por exemplo, operadoras como Intelig e Telemar podem ser sinônimo de bons contratos. Afinal, para competir em caráter nacional, elas precisarão contar com a infra-estrutura de redes de outras companhias.

O projeto ferroviário do GP e da ALL é inédito no País. Até agora, o máximo que as concessionárias que arremataram os trechos privatizados da malha nacional fazem é cobrar para que outras operadoras passem cabos junto aos seus trilhos. A própria ALL fazia esse tipo de contrato, mas percebeu que o negócio de redes de alta velocidade poderia ser bem mais rendoso do que simplesmente alugar o leito de suas ferrovias. Nesse caso, Lemann, que moldou sua carreira seguindo a inspiração do megainvestidor Warren Buffett, segue os passos de outro bilionário americano, Philip Anschutz. Fundador da Qwest Communications, Anschutz tornou-se o sexto homem mais rico dos Estados Unidos a partir de um negócio revolucionário: uma grande rede de fibras ópticas correndo paralela aos trilhos. Fundada há seis anos, a Qwest é hoje uma empresa de US$ 60 bilhões, seis vezes o valor das ferrovias que abrigam sua infovia. Lemann espera seguir na mesma rota de sucesso com o novo negócio, na locomotiva do trem-bala do GP e da ALL.