Ainda são incertos os reflexos da trégua na guerra comercial entre a China e os Estados Unidos para o Brasil e o comércio internacional. Na última segunda-feira (1), Donald Trump e Xi Jinping hastearam bandeira branca por 90 dias.

Até 1º de março, os EUA prometeram não elevar para 25% as taxas sobre US$ 200 bilhões em produtos, enquanto os chineses se comprometeram a reabrir as portas para produtos norte-americanos, principalmente do agronegócio.

Exportação brasileira de soja deve bater recorde de 82,5 milhões de toneladas, afirma entidade

A escalada da guerra tarifária entre as duas superpotências econômicas não seria para bom para ninguém, afirmam os especialistas. Porém, ao Brasil, ao menos neste primeiro momento, foi bastante proveitoso.

As barreiras impostas à soja norte-americana fizeram a exportação nacional crescer. A Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) estima que a exportação de soja em 2018 alcance 82,5 milhões de toneladas, ante 68 milhões em 2017, tendo a China como principal destino.

“Mesmo que a China volte a comprar dos Estados Unidos, o melhor cenário para o Brasil em médio e longo prazo seria o fim dessa guerra”, afirma Lucas Ferraz, especialista em comércio internacional e professor da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Para ele, ter um concorrente direto na venda dos grãos é mais favorável ao Brasil do que as consequências de um possível agravamento nas relações entre os dois países e o enfraquecimento da economia em âmbito global.

“Essa análise de resultados positivos no curto prazo dificilmente se repete em longo prazo”, diz.

Também reconhecendo os avanços na exportação brasileira neste período de briga entre EUA e China, Carlos Braga, professor de economia da Fundação Dom Cabral (FDC), diz que as vantagens deste primeiro momento seriam ofuscadas futuramente.

“As retaliações da China favorecem a soja brasileira, mas a nossa preocupação maior deve se com o fluxo no comércio internacional, não apenas com os chineses”, afirma.

90 dias de incertezas

Os anúncios mútuos de Donald Trump e Xi Jinping de unirem forças para entrar em um acordo para a questão não são encarados com otimismo pelos analistas. Para eles, há muitas variáveis em questão para que a situação tenha um desfecho positivo em apenas 90 dias.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (E), e seu homólogo chinês, Xi Jinping, em 2017 – AFP/Arquivos

“Se fala muito na abertura do mercado chinês para produtos americanos, mais as questões de propriedade intelectual e espionagem. É improvável que essas coisas aconteçam, a China não vai mudar sua política de comércio em três meses”, diz o professor da FGV.

Além da mudança de todo um sistema que levou décadas para se montar, Ferraz destaca que o país asiático é membro da Organização Mundial do Comércio (OMC) e, caso abra as exceções para os produtos norte-americanos, também teria que fazer o mesmo aos outros membros da entidade.

“Isso torna ainda mais improvável essa abertura do comércio apenas aos Estados Unidos.”