A palavra securitização é um tanto quanto assustadora, mas o conceito é simples de entender. Securitizar é reunir pagamentos futuros, como aluguéis e recebíveis de cartões de crédito, em um título que rende juros aos investidores. Quem compra o título recebe os rendimentos. Quem tem os recebíveis antecipa os recursos, em geral a taxas mais amigáveis do que as cobradas pelos bancos para fazer o tradicional desconto de duplicatas. No Brasil, os primeiros títulos securitizados surgiram no início da década passada, e visavam antecipar pagamentos de aluguéis de grandes edifícios corporativos de alto padrão. Para atrair investidores dispostos a enfrentar prazos longos liquidez baixa, esses títulos oferecem duas vantagens. Uma delas são rendimentos polpudos, em geral inflação mais juros. A outra é a isenção fiscal dos rendimentos. Em tempos de Selic baixa e inflação em alta, essas características tornam-se irresistíveis, e o mercado está buscando novas alternativas. “A securitização como forma de investimento vem num crescendo, especialmente no segmento imobiliário,” disse a fundadora da empresa de securitização Fortesec, Juliana Mello.

Um projeto da Fortesec mostra isso. Em vez de edifícios empresariais de alto padrão, a empresa está lançando títulos baseados nos recebíveis de um condomínio multipropriedade no interior do Estado de São Paulo. “São cerca de mil apartamentos em um condomínio de lazer, usados por 20 mil proprietários”, disse ela. “Estamos securitizando a emissão de 20 mil boletos por mês.” Tempos atrás, tanta dispersão de recebimentos afugentaria os investidores. O risco de perda de controle do fluxo de pagamentos é elevado. No entanto, o aquecimento do mercado imobiliário fez muitos investidores concordarem em correr o risco.

Outro segmento que vem chamando a atenção dos investidores é o agronegócio, especialmente em tempos de alta nos preços internacionais das commodities. “Quando a Selic estava em 14% ao ano, os grandes investidores poderiam bater suas metas simplesmente comprando títulos públicos, mas agora é preciso diversificar esses portfólios”, disse o fundador da securitizadora Planeta, João Paulo Pacífico.

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“Demanda por papéis do agronegócio vem batendo recordes ” João Paulo Pacífico Planeta Securitizadora.

Segundo o executivo, atualmente a demanda por papéis do agronegócio está bastante elevada. Ele avalia que os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) estão crescendo na preferência dos investidores individuais, devido aos prazos de um a três anos, inferiores aos dos papéis correspondentes do setor de imóveis. Os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) em geral são emitidos com prazos a partir de sete anos, podendo chegar a 14 anos. “Os CRA oferecem a possibilidade de diversificar mais as operações, o que reduz o risco individual oferecido pelo produtor, e também permitem incluir cláusulas de sustentabilidade”, disse ele.

Os CRI movimentaram R$ 36,3 bilhões entre o início de 2019 e abril de 2021, ao passo que os CRA captaram R$ 19 bilhões. No entanto, os executivos avaliam que essa diferença tende a crescer. Pacífico calcula que em 2023 os Fiagro, fundos de investimento semelhantes aos imobiliários, mas dedicados ao agronegócio, vão começar a atrair capital de peso. “Será uma bola de neve, como foram os fundos imobiliários”, disse ele. “A liquidez é diferente e, com a diversificação, haverá menos volatilidade.”

@dus_hamandell

“Operações inéditas, como imóveis com 20 mil proprietários, estão sendo securitizadas ” Juliana Mello Fortesec.

Juliana Mello tem uma avaliação semelhante. Para ela, o investidor conservador que ainda está ligado a aplicações bancárias tradicionais vai se sentir cada vez mais estimulado a migrar para os novos produtos. “Mesmo quem é conservador vê o investimento em um imóvel como uma forma de investir melhor os recursos” disse ela. E nem mesmo a alta da Selic vai reverter esse quadro. “Os juros não vão subir para o patamar em que já estiveram, e nesse meio tempo o investidor teve uma curva de aprendizado.”