O clima estava pesado na sede da fabricante paulista de alimentos industrializados Yoki, em São Bernardo do Campo, na quinta-feira, 24 de maio. Naquele dia, a gigante americana de alimentos General Mills, dona dos sorvetes Häagen-Dazs, anunciava a compra por R$ 2 bilhões da companhia brasileira, fundada em 1960 pelo imigrante japonês Yoshizo Kitano. O anúncio deveria ser motivo de comemoração. Mas não foi, por causa do desaparecimento de seu diretor-executivo Marcos Kitano Matsunaga, 42 anos, neto do fundador da Yoki e filho do CEO Mitsuo Matsunaga. Ele não era visto desde o sábado 19 de maio, quando esteve no apartamento onde morava com a mulher, a bacharel em direito e técnica em enfermagem Elize Araújo Kitano Matsunaga, 38 anos, e com a filha de 1 ano de idade. 

 

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A dor da família: Mitsuo Matsunaga, CEO da Yoki, no enterro de seu filho Marcos,

no Cemitério São Paulo, na terça-feira 5.

 

Os piores receios da família foram confirmados de modo traumático no início da semana seguinte, quando pedaços do corpo esquartejado de Matsunaga, espalhados pela região de Cotia, na Grande São Paulo, foram encontrados embrulhados em sacos plásticos e identificados. O drama, no entanto, estava só começando. Na segunda-feira 4, os policiais do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) prenderam Elize, considerada a principal suspeita. Inicialmente, o motivo teria sido um seguro de vida de R$ 600 mil mantido pelo executivo, tendo a família como beneficiária. O esclarecimento só veio na quarta-feira 6, quando Elize confessou o assassinato. Ciúmes motivaram a tragédia, após ela descobrir uma suposta infidelidade de Matsunaga. 

 

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Marcos Matsunaga: ele foi assassinado com um tiro na cabeça após

uma discussão. O corpo foi esquartejado.

 

Os detalhes do crime impressionam pela brutalidade. Segundo a versão da polícia, na noite do sábado 19, o casal teria tido uma discussão, após a qual Elize atirou na cabeça do marido usando uma pistola automática calibre 380 – ambos tinham curso de tiro e Matsunaga era colecionador de armas. O corpo foi levado para o banheiro da empregada e lá teve seus membros serrados com uma faca. Os pedaços foram guardados em sacos plásticos dentro de congeladores. No dia seguinte, ela dispensou as empregadas, colocou os restos mortais em três malas e os desovou em matagais próximos à estrada que o casal usava para ir a uma fazenda em Ibiúna, no interior de São Paulo. Elize, que ainda não constituiu advogado de defesa, deverá seguir presa durante a conclusão das investigações, inquérito e julgamento. 

 

Apesar de toda a comoção gerada em torno do assunto, o crime não deverá atrapalhar a conclusão do acordo entre a Yoki e a General Mills. O que poderá acontecer é um adiamento do cronograma original, que previa o início da incorporação após as festas juninas, período do ano mais lucrativo para as operações da Yoki, especialmente na comercialização de pipoca. É possível que as empresas optem por um período maior, à espera de que “baixe a poeira” em torno do assassinato de Marcos. “É uma tragédia familiar, que não interfere no lado corporativo”, afirmou um profissional ligado à Yoki. Procurada pela DINHEIRO, a empresa não se manifestou oficialmente. Já a General Mills divulgou uma nota lamentando o ocorrido, dizendo que vai apoiar os familiares.


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Elize Araújo: ela confessou o crime, motivado por ciúmes, devido

a uma suposta infidelidade do marido.

 

“Nossos corações estão com eles.” Sobre a aquisição, a empresa americana acrescentou: “A General Mills já divulgou todos os detalhes que pretendia sobre a transação.” A tensão dentro da Yoki já durava anos. A empresa buscava um comprador desde 2010, por causa da dificuldade de formar sucessores para seu comando. Havia uma cisão na direção, em razão dos desentendimentos entre as duas herdeiras do fundador. De um lado estava Yeda Kitano Cherubini, casada com o vice-presidente da companhia, Gabriel Cherubini. De outro, Misako Kitano Matsunaga, mãe do executivo assassinado e casada com o presidente Mitsuo Matsunaga. 

 

Para o futuro, a expectativa é de que o crime não gere uma mancha permanente sobre uma empresa que começou vendendo cereais e farinha e diversificou suas atividades para uma gama de 620 produtos, superando a marca de R$ 1 bilhão de faturamento anual. Um exemplo de volta por cima pode ser encontrado na história da companhia: em 1989, quando ainda mantinha o nome Kitano, a empresa foi afetada pela crise econômica e vendeu a maior parte de suas operações para a Refinações de Milho Brasil, então dona da Maizena. Com o dinheiro da venda, reestruturou suas operações, abriu novas linhas de negócio e começou a exportar. Oito anos depois, recomprou – com lucro – a marca Kitano, hoje incorporada ao seu portfólio.

 

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