Imprensados ao longo de décadas pelo dilema de fazer protestos ou comemorações no 1º de Maio ? a data mais tradicional do sindicalismo mundial ?, pelo menos um milhão de trabalhadores brasileiros vão mostrar nesta terça-feira, em São Paulo, que o impasse está resolvido. Atraídos por sorteios de apartamentos mobiliados e carros zero quilômetro, a serem feitos nos intervalos de duas dezenas de shows musicais com artistas populares, eles estarão cercados por quiosques de empresas como as multinacionais General Motors e Telefonica, serão bombardeados por propaganda e, graças a esta fórmula, terão como rivais em número, no mundo todo, apenas os cubanos convocados a ouvirem por horas, na Praça da Revolução, em Havana, Fidel Castro falar. O custo deste gigantismo é de R$ 1,8 milhão, loteado entre os patrocinadores. Tem sido assim nos últimos quatros anos, desde que a Força Sindical mandou às favas um dos mais fundos dramas de consciência da esquerda. Afinal, na raiz do 1º de Maio há uma greve histórica, feita em 1886, pela jornada de trabalho de 8 horas diárias. Seus desdobramentos em Chicago, nos EUA, causaram a morte de dezenas de trabalhadores em conflito com a polícia. É politicamente correto fazer festa nesta data?

?Os atos tradicionais marcados por protestos e quebra-quebras são coisas do passado?, acredita o presidente da Força, Paulo Pereira da Silva. ?Entre um show e um sorteio vamos falar de redistribuição de renda, redução de jornada de trabalho e qualificação profissional. Se pelo menos 10% das pessoas que estiverem lá prestarem atenção nos discursos, teremos vencido.? O coquetel de festa forte e protesto leve administrado por Paulinho é pragmático. Hoje, segundo dados da Fundação Seade, é de R$ 863 o salário médio na Grande São Paulo, onde 70% das 7,5 milhões de pessoas empregadas com carteira assinada ganham abaixo desse valor. ?O nível de rendimento médio do trabalhador empregado é pré-Real?, diz Paula Montagner, economista e pesquisadora da Fundação.

?Metade da população economicamente ativa troca de emprego a cada 18 meses e apenas 25% dos trabalhadores freqüentam o mesmo local de trabalho há sete anos?, completa. Trata-se de um quadro acabado de instabilidade, onde greves nos moldes tradicionais só contam com adesão maciça em momentos especiais. Além disso, a polarização da renda revela um cenário em que poucos têm muito e a esmagadora maioria está alijada da sociedade de consumo. Mesmo com emprego.

Na quinta-feira, 26, o IBGE divulgou uma taxa de 6,5% de desemprego em nível nacional, a menor desde 1997. ?O fato de o índice não ter aumentado nesta época do ano, quando mais pessoas procuram inserção no mercado de trabalho, é bom?, comenta o secretário de Emprego e Relações do Trabalho de São Paulo, Walter Barelli. De acordo com informações tabuladas pela Secretaria a pedido da DINHEIRO, os maiores saldos de contratações de mão-de-obra em 2000 aconteceram em ocupações não qualificadas. ?A característica do novo emprego é ser volátil, exigir pouca capacitação do empregado, nenhum conhecimento técnico e oferecer baixa remuneração?, resume a economista Luciana Cristina Lenhari, assessora da Secretaria.

Entre as dez ocupações em que houve mais contratações, metade exigia mão-de-obra semi-qualificada e a outra metade, não qualificada. Na outra ponta, onde ocorreram mais demissões, cinco das ocupações atingidas necessitavam de empregados qualificados, com curso superior ou especialização, três pediam mão-de-obra semi-qualificada e duas, não qualificada. Houve, por exemplo, 46.720 contratações de trabalhadores braçais no ano passado. O segundo lugar entre os maiores saldos positivos de contratações foi ocupado por empregos em conservação e limpeza de edifícios e logradouros públicos, com 27.268 a favor. Entre gerentes de Pesquisa e Desenvolvimento, cargo considerado qualificado, ao contrário, ocorreu um prejuízo de 1.102 postos de trabalho. Nos EUA, enquanto isso, a demanda atual por empregos na área de biotecnologia computacional chama atenção da imprensa. Na visão do consultor João Guilherme Vargas Neto, é como se o recado da globalização fosse direto: ?Quer emprego no Brasil? Não estude. ?