Será que “o acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído”, como propõe um dos maiores hits da banda Titãs? Espero que sim e que proteja a você também, caro leitor, nos momentos de distração, em que estivermos aproveitando bem a vida. Porém, não podemos confiar apenas no acaso quando o assunto é o mundo do trabalho no futuro.

Por essa razão arrisco lançar algumas luzes sobre o futuro do trabalho no século 21, as novas oportunidades, os novos comportamentos e as carreiras profissionais inovadoras que estarão em alta até o final desta década. E também aquelas que tenderão a deixar de existir.

Sabemos que a pandemia acelerou o futuro e trouxe mudanças que vieram para ficar. Isso abrange desde o comportamento das pessoas – como em relação ao consumo, que varia de alimentos ao vestuário – até a forma de aprender, se cuidar, se divertir e interagir socialmente. Além das novas relações de trabalho, evidenciadas pelo experimento forçado do home office.

Some-se a tudo isso o verdadeiro tsunami tecnológico que tem decretado a falência de vários modelos de negócio e diminuído o prazo de validade – não apenas de produtos e serviços, mas de empresas inteiras. Tenho afirmado há mais de dois anos que “negócios tradicionais estão sendo destruídos da noite para o dia por soluções disruptivas”.

Essas transformações têm levado a mudanças substanciais no dia a dia das pessoas. Uma verdadeira revolução que tem decretado a irrelevância de algumas profissões e carreiras, enquanto ao mesmo tempo tem criado novas oportunidades profissionais. As pessoas querem consumir de outras formas. E estão se acostumando a trabalhar de maneira bem diferente. A força de trabalho será drasticamente reduzida, pois muitas profissões perderão relevância.

Essa nova lógica do mundo do trabalho, inexoravelmente, jogará por terra conceitos e práticas que foram úteis no passado, mas não servem para uma realidade que não mais existe. Tomemos como exemplo o conceito de “supervisão”, expressão típica da era industrial. A existência de funcionários mais graduados controlando a produtividade de pessoas no chamado “chão de fábrica” não terá mais qualquer serventia no futuro.

A tecnologia e a pandemia também estão aposentando o termo “local de trabalho” (workplace em inglês). Deixe-me perguntar, leitor: Qual o seu local de trabalho? O meu já não consigo distinguir, pois trabalho em casa, no trânsito, no metrô, no táxi e até no banheiro. O local de trabalho está diluído em todo lugar.

Entende por que não podemos confiar apenas no acaso para nos proteger quando andarmos distraídos? Além do acaso e da sorte, vamos precisar de uma série de outros atributos e circunstâncias para ter sucesso no mundo do trabalho nessa nova ordem exponencial que começa a se impor a passos acelerados.

Listo abaixo seis tendências do mundo do trabalho:

1- Modelo híbrido (que mistura o virtual e o presencial) de trabalho ganha cada vez mais força. Com isso, as nossas casas serão cada vez mais adaptadas e tecnológicas para atender a demanda do trabalho remoto. Esta nova realidade já está exigindo das organizações o investimento em treinamentos, aquisição de softwares específicos, adequação da ergonomia dos espaços em home office e a revisão do modelo organizacional com valores mais orgânicos e flexíveis. O modelo presencial puro só deverá ser mantido para profissionais que atuam na linha de frente;

2- Viagens de negócios, congressos, convenções, cursos e treinamentos presenciais tenderão a diminuir, já que as videoconferências se mostraram eficientes e produtivas, além de reduzir o tempo e os gastos com deslocamento;

3- Plataformas permitirão contratação de profissionais em outras regiões e países, com a possibilidade de pessoas trabalharem em projetos de três turnos. Um em cada região do mundo, aproveitando o fuso horário para a complementariedade do fluxo do trabalho e das equipes;

4- A rápida ascensão das novas tecnologias, como a mecanização, a robótica, e a inteligência artificial, substituirão trabalhos repetitivos e burocráticos, garantindo maior produtividade e eficiência. O fator humano será para tarefas não maquinizáveis. A força de trabalho será drasticamente reduzida. Muitas categorias profissionais – e seus sindicatos – perderão relevância.

5- Profissões virarão um kit de habilidades: muito diferente da esteira tradicional de uma carreira. O profissional precisará ser multidisciplinar. O expert será uma espécie em extinção. As carreiras virarão “ciclos de aprendizagem”;

6- Empresas montarão “ecossistemas de inovação e venture capital”, formando assim um verdadeiro hub de soluções para seus fornecedores, clientes e até mesmo para seus concorrentes.

Além dessas tendências, vale destacar que a demanda dos meios eletrônicos ultrarrápidos, por exemplo, pode impulsionar profissionais com necessidades específicas e criar novos cargos, como o analista de soluções de alta conectividade, especialista em logística 4.0, e orientador para trabalho remoto.

Já as profissões de médicos, advogados, engenheiros, professores e artistas continuarão fortes no século 21, porém bastante modificadas. Um imperativo decisivo para a sobrevivência desses profissionais será o domínio dos recursos tecnológicos.

E algumas ocupações deixarão de existir ou estarão em baixa. Dentre elas encontram-se mecânicos automotivos, em virtude dos carros elétricos, profissionais de agências bancárias, arquivistas, carteiros etc.

Para complementar, acredito que mais importante que uma profissão específica, será a habilidade de carregarmos uma nova “mochila” de competências, com habilidades e atitudes que possibilitem a nossa sobrevivência. O saber pensar será mais importante do que o saber fazer.

Para concluir, gostaria de agradecer ao Sérgio Brito, autor da bela música imortalizada pelos Titãs com a qual comecei este texto. Composta como um recado para que aproveitemos bem a vida de forma a evitar arrependimentos no nosso momento final. Acredito que a canção serviu como uma espécie de queixa ao espírito divisionista que regeu as relações trabalho e vida do século 20. Escrita em 2001, a letra anteviu, de forma premonitória, a necessidade de uma relação muito mais convergente, no novo século que se iniciava, entre o trabalho e a vida pessoal, entre o lazer e a obrigação.

Com a nova realidade que se configura, quem conseguir se reinventar e fazer um reset na carreira e na vida terá a opção de, no seu epitáfio, em vez de escrever versos de arrependimento, tais como – “eu devia ter amado mais…” ou “ter feito o que queria fazer…”, poderá escrever: “Fui feliz trabalhando no que sempre amei fazer”. Como sempre gosto de propor alternativas, ofereço mais uma frase: “Fiz da vida um eterno aprendizado”. Esse o grande desafio do mundo do trabalho no século 21. Seja bem-vindo à Nova Ordem Exponencial!

César Souza é cofundador e presidente do Grupo Empreenda, consultor e palestrante em Estratégia, Liderança, Clientividade e Inovação. Autor de “Seja o Líder que o Momento Exige” (Best Business 2019) é também coautor do recém-lançado “Descubra o Craque que Há em Você” (Buzz,2020)