Uma antiga briga ganhou um novo capítulo na semana passada. O secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Daniel Goldenberg, determinou o início de investigações contra a maior empresa de internet do país, o Universo Online, por abuso de poder econômico. É a continuação da novela iniciada em janeiro do ano passado quando o UOL cancelou o contrato de parceria que mantinha com 150 pequenos provedores em todo o país. Pelo acordo, os provedores captavam novos assinantes para o UOL, divulgavam a marca localmente e eram remunerados pelo tráfego gerado a cada mês. Desse grupo, 80 companhias se reuniram em uma associação e entraram com o pe-
dido na SDE que determinará quem está com a razão. A etapa seguinte da investigação pode ser a abertura de um processo contra o UOL no Conselho de Defesa Econômica, encarregado de zelar pela livre concorrência empresarial no país. ?É a nossa primeira vitória depois de uma grande injustiça?, afirma Alexandre Coelho, diretor jurídico da Associação Brasileira dos Provedores de Acesso (Abraafi), entidade criada para defender os interesses do ex-afiliados. “O prejuízo estimado de todos
chega a R$ 120 milhões?, diz. A decisão da SDE poderá demorar até oito meses e nesse período tudo será acompanhado pelo Ministério Público Federal. ?Um parecer contrário da SDE não me impede de seguir adiante caso existam evidências suficientes?, afirmou à DINHEIRO o subprocurador geral da República Moacir Guimarães Filho. Procurado por DINHEIRO, o UOL não quis
se pronunciar sobre o assunto. A empresa alega que os provedores eram apenas prestadores de serviço e o fim do contrato encerra qualquer relação comercial.

 

A novela UOL teve seu capítulo inicial no final de 1998 quando foi assinado o primeiro contrato com o provedor BNO, de Macapá, no Amapá. A partir de então a cada mês novos parceiros eram cadastrados pelo portal. No auge dessa estratégia o UOL teve afiliados em 260 cidades do país. Enquanto durou, o acordo foi satisfatório para os dois lados. Os provedores ficaram com a operação local de uma grande empresa nacional e o retorno veio pela capacidade de deixar os clientes conectados por mais tempo na sua infra estrutura tecnológica própria, que seguia os parâmetros estabelecidos pelo UOL. Em janeiro de 2003 o divórcio se tornou inevitável. Nessa data, os afiliados foram comunicados que a parceria estava desfeita. Dali em diante, o UOL seguiria sozinho na prestação de serviços aos assinantes locais. Um acordo com a Telemar, a Brasil Telecom e Telefônica possibilitou a montagem da infra-estrutura de comunicação em todo o Brasil. Nas madrugada do dia 24 de janeiro, o UOL virou a chave. Os clientes que se conectavam ao provedor local eram redirecionados para a rede das operadoras. Em alguns pontos a operação deu certo, mas em outros os parceiros foram obrigados a manter seus computadores funcionando para fazer essa transição sob a ameaça de processo. Da noite para os dia, os afiliados ficaram sem receita e clientes. ?Golpe é um palavra amena para definir o que eles fizeram conosco?, afirma Alexandre Coelho, dono do Portonet, no Sul da Bahia. Ele recomeçou o negócio do zero. Hoje tem 250 usuários e um faturamento mensal de R$ 8 mil. Bem distante dos R$ 70 mil que conseguia com o UOL.

Os afiliados não tiveram nem apoio da Associação Brasileira dos Provedores de Internet. A atual diretoria não comenta o assunto e responsabiliza o ex-presidente Roque Abdo pelo silêncio da época. Mesmo os pioneiros na relação com o UOL não foram poupados. ?Fomos usados por uma empresa maquiavélica?, afirma Fábio Renato Alves, do provedor BNO, em Macapá, no Amapá. O BNO foi a primeira empresa no País a aderir em novembro de 1998 ao modelo proposto pelo UOL. Ele também chegou a ter um faturamento de R$ 70 mil mensais que caiu para zero quando houve o cancelamento do negócio. ?O UOL nos deve o fato de ter se transformado no maior da América Latina?, diz o diretor da BNO. ?Sem nossa ajuda eles não teriam conseguido.? Pelas contas da Abraafi, os afiliados contribuíram com aproximadamente 300 000 clientes para os atuais 1,2 milhão declarados pelo UOL. O modelo de expansão com a ajuda de empresas parceiras não foi uma invenção do UOL. Em 1995, o então provedor gaúcho ZAZ, atual Terra, montou um sistema de franquias para garantir o crescimento da base de assinantes. Quando quis encerrar a parceria, o Terra procurou seus franqueados e pagou por todos os ativos. Na época, em 1999, foram compradas 70 empresas em todo o País e os seus proprietários ganharam alguns de milhares de reais.

 

A investigação no Cade está longe de ser o único problema jurídico do UOL. Há quarenta processos em andamento na justiça de vários estados. Algumas dessas ações já chegaram, inclusive, ao Superior Tribunal de Justiça como o processo da paraibana Netway. A empresa que atendia o mercado da Paraíba e interior de Pernambuco exige a manutenção do contrato do UOL. ?Eles fizeram algo que é contra o mais elementar princípio ético e moral?, diz o diretor da Netway Adroaldo Markus. ?Eles nos jogaram
na lata do lixo.? Nesse turbilhão de ações, o UOL também enfrenta aquele que foi o seu maior afiliado no país, a Rantac que atendia 11 cidades no interior de São Paulo e duas em Minas Gerais e tinha 15
mil clientes. Nesse caso, a companhia quer anular um acordo do UOL com os antigos sócios que aceitaram o fim da parceria. ?Vou até o fim com essa briga?, afirma Roberto Biagioni. E parece que ela só está começando para o UOL.