Compromisso?: Jerome Powell deve manter o ritmo de aumento lento e gradual da taxa de juros (Crédito:Alex Wong)

Desde que o nome de Jerome Powell foi confirmado pelo presidente Donald Trump, no início de novembro do ano passado, para ser o novo comandante do Federal Reserve (Fed), o banco central americano, a tensão do mercado financeiro global arrefeceu. Seu concorrente era o economista John Taylor, pai da Regra de Taylor, uma equação que mostra como a taxa de juros deveria se comportar para atingir seus objetivos de inflação baixa e máximo emprego. Taylor é ultraconservador e defende o aumento radical dos juros. Powell é um velho conhecido de Wall Street. Ele fez carreira no banco de investimentos Dillon Reed e tornou-se sócio do The Carlyle Group, em 1997.

Com uma fortuna estimada em US$ 55 milhões, Powell deixou o setor privado para trabalhar como voluntário no instituto de pesquisas de políticas públicas Bipartisan Policy Center, em Washington DC, por um salário simbólico de US$ 1 ao ano. E desde 2012 faz parte do conselho de governadores do Fed. Nesse período, ele sempre votou com a maioria e trabalhou em estreita colaboração com a presidente Janet Yellen, o que indica que ele dará continuidade à política de aumento lento e gradual dos juros. “Powell é a Yellen com um terno escuro”, diz o economista Gary Hufbauer (leia a entrevista ao final da reportagem).

Powell terá a difícil missão de manter uma postura de continuidade da política de Yellen. Ela foi a primeira mulher à frente do Fed num momento delicado. Seu antecessor, Ben Bernanke, havia reduzido a taxa de juros a zero para inundar o mercado de dinheiro e recuperar a economia americana da recessão provocada pela crise financeira de 2008. A missão de Powell é dosar seu poder de elevação de juros para garantir a criação de empregos (embora o desemprego esteja em apenas 4%), a manutenção da inflação baixa e garantir um crescimento de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). A situação ficou mais difícil após a aprovação da maior reforma tributária no país em 30 anos, que deve elevar a dívida pública para 75% do PIB em uma década. “O desafio de Powell será manobrar a economia para que não haja excessiva injeção monetária, que acarrete em uma rápida alta na taxa de juros”, afirma Istvan Kasznar, professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Se subir muito e rápido o juro, o crescimento dos EUA entra em xeque.”

Missão cumprida: Janet Yellen, a primeira mulher a presidir o Fed, conseguiu elevar gradualmente os juros sem prejudicar a economia global (Crédito:Divulgação)

Até assumir definitivamente a cadeira de Yellen, no início de fevereiro, todos os discursos e declarações de Powell estão sendo analisados com lupa pelo mercado financeiro. Nas últimas semanas, ele tem demonstrado uma postura diferente daquela que tinha quando conselheiro. Powell tem falado mais abertamente sobre a desregulamentação financeira. A lei Dodd-Frank foi um conjunto de reformas criadas para regulamentar os bancos após a crise provocada pelas hipotecas subprime de 2008. A lei criou regras que detalham desde o volume de recursos que pode ser emprestado até remunerações e bônus de executivos. A posição do novo presidente do Fed agrada Trump. “O sistema financeiro é, de longe, mais forte e resistente do que antes da crise”, disse Powell, em seu discurso de posse sobre a necessidade de desburocratizar algumas regulamentações impostas pelo Dodd-Frank, em especial para os bancos menores. “Esse era um dos pontos que separavam Yellen e Powell”, diz Gustavo Cruz, economista da XP Investimentos.

A posição mais liberal em relação ao mercado financeiro aliada à mudança fiscal nos EUA pode mexer com a economia global, principalmente de países como o Brasil. A expectativa é que Powell eleve, ao longo de 2018, em um ponto percentual a taxa de juros, que está em 1,5% ao ano. Os especialistas afirmam que o Brasil pode sentir o efeito nas importações e na taxa de câmbio. “Não é um cenário negro, mas é de potencial risco de mudança que exigirá uma nova ordem monetária no Brasil em pleno ano eleitoral e, ainda, de recuperação econômica”, diz Alex Agostini, economista da Austin Rating. Formado em Direito, Powell tem um extenso currículo em finanças, mas será o primeiro presidente do Fed desde Paul Volcker, que cumpriu mandato entre 1979 e 1987, a não ter um PhD em economia. Resta esperar pelo dia de sua posse, em 3 de fevereiro, para saber se diante das intempéries de Trump e de uma densa reforma da economia americana, Powell conseguirá dosar o seu poder.


“Powell não pode parar a maré”

Gary Hufbauer, economista do Peterson Institute For International Economics

O novo presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, vai manter a postura de sua antecessora?
Sim, ele é a Janet Yellen com um terno escuro. Isso significa que ele será lento para aumentar as taxas de juros e tolerará a inflação acima de 2% por um bom tempo.

Quais medidas econômicas Powell pode tomar para que a reforma tributária não impacte a taxa de juros?
Ele não pode parar a maré. Se ele tentar manter a taxa de juros em 1,5%, os outros governadores do Fed se rebelarão e, no longo prazo, a taxa aumentaria muito mais.

Então, como essa redução de impostos vai mexer com a economia?
Se a reforma fiscal estimular o investimento em pesquisa e desenvolvimento, juntamente com o aumento do déficit fiscal de mais 1% do PIB, a economia terá um estímulo de 2% do PIB. Isso é muito e, por si só, elevaria a taxa de juros. Em linhas gerais, a taxa de curto prazo dos Estados Unidos aumentará em pelo menos 1 ponto percentual, de 1,5% para 2,5% até o final deste ano.

Qual é a sua projeção para o PIB e a dívida pública?
Creio que a economia americana crescerá entre 2,7% e 3% durante vários anos. A dívida pública provavelmente aumentará de cerca de 65% do PIB para 75%, em uma década .

A crise financeira global, provocada pelo subprime, completa 10 anos neste ano. Era o momento ideal para o corte de impostos?
Foi um bom momento, mas por uma razão política. As estrelas políticas precisam estar alinhadas para reformar o sistema de imposto corporativo, o que significa controle republicano da Casa Branca, Senado e Congresso. Este foi o momento político, mas não econômico.