Passados dez anos do surgimento do acrônimo Bric para definir o peso de Brasil, Rússia, Índia e China no cenário global, a expressão popularizou-se e se tornou uma espécie de síntese das mudanças na economia do planeta. “Quando Goldman Sachs cunhou o termo Bric, não havia a sugestão de que estes países pudessem atuar coletivamente”, diz Shyam Saran, membro do Centro de Estudos Políticos de Nova Délhi. “Mas a partir daí eles souberam usar essa atenção internacional para trabalhar em uma agenda de interesses comuns.” 

 

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O time dos emergentes: (da esq. para a dir.) Dilma Rousseff, do Brasil, Dimitry Medvedev, da Rússia,

Manmohan Singh, da Índia, Hu Jintao, da China, e Jacob Zuma, da África do Sul,

em reunião dos Brics, em Nova Délhi.

 

Os países dos Brics – o S foi acrescentado com a inclusão da África do Sul (South Africa, do inglês) – deram sua primeira demonstração de força logo após o estouro da crise financeira global de 2008, quando ficou claro que os emergentes teriam um papel importante no combate aos problemas enfrentados nos Estados Unidos e na Europa. “A maior ação conjunta feita por eles foi o aporte inédito de US$ 80 bilhões no Fundo Monetário Internacional (FMI) em 2009, para minimizar o contágio da crise sobre os países emergentes”, afirma o ex-embaixador e ex-ministro da Fazenda do governo do presidente Itamar Franco, Rubens Ricupero.

 

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Nova fronteira: em 2003, a China já caminhava

para ser o principal parceiro comercial do Brasil.

 

No final de 2010, durante a cúpula do G20, grupo que reúne as 20 economias mais importantes do planeta, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, dominou a agenda do fórum ao expor a “guerra cambial” que estava minando a competitividade de países distantes do epicentro da crise, num recado direto aos Estados Unidos. Não mais visto como mera potência regional, o Brasil dava o recado de que se fazia urgente uma reforma nas instituições econômicas globais. Durante a 4ª Cúpula dos Brics, realizada em março, em Nova Délhi, com a presença da presidenta Dilma Rousseff, o governo indiano reforçou o discurso ao lançar a proposta de um banco de fomento financiado pelos Brics. “O governo indiano apoia fortemente essa ideia”, diz Saran, do Centro de Estudos Políticos de Nova Délhi. 

 

“Se os esforços dos quatro países em ganhar voz no FMI e Banco Mundial não forem adiante, o banco pode ser uma alternativa importante de suporte técnico e financeiro às economias emergentes.” Do ponto de vista econômico, a locomotiva dos Brics permanece sendo a China, dentro e fora do bloco. Em março de 2003, a DINHEIRO registrou essa tendência de integração na reportagem de capa “China, a nova fronteira do lucro para o Brasil”. De lá para cá, o avanço é mais visível em números. Em 2009, a China ultrapassou os Estados Unidos como o maior parceiro comercial do País. No ano passado, a corrente de comércio bateu o recorde de US$ 64,4 bilhões. 

 

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O pai do termo: Jim O’Neill, do Goldman Sachs, criou a sigla Bric. Ele não imaginava,

na ocasião, que o grupo teria poder político e econômico.

 

O peso chinês nas vendas externas do Brasil foi de 17,3%. Há dez anos era de apenas 3%. “Grande parte do crescimento do Brasil se deve à China e, mesmo ameaçando a nossa indústria, eles são mais parte da solução que do problema”, afirma Ricupero. Por outro lado, o professor Yongjin Zhang, da Universidade de Bristol, na Inglaterra, destaca o papel de independência do Brasil dentro do clube. “Há diferenças históricas entre China, Rússia e Índia na Ásia Central”, diz Zhang. “O Brasil é visto pelo governo chinês como um importante aliado em potencial nos organismos globais.” Os indianos também vêm aumentando rapidamente sua corrente de comércio com o Brasil, que cresceu 20% no ano passado e fechou em US$ 9,28 bilhões. 

 

“O comércio bilateral era de US$ 3 bilhões em 2007 e a meta é chegar a US$ 15 bilhões em 2015”, afirma Saran. “Os dois países estão trabalhando em colaboração em áreas estratégicas.” O maior desafio dos cinco países agora é cristalizar sua unidade nos fóruns globais, considerando as diferenças políticas e econômicas. Mas a simples discussão de alternativas às organizações tradicionais – e a pressão para aumentar sua influência sobre europeus e americanos – mostra que os Brics já são muito mais que um baralho de letras. “Ainda é cedo para dizer que os Brics estão coesos, mas sem dúvida formam um bloco em plena construção”, diz Zhang.

 

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