Você já parou para pensar quanto o mundo mudou, desde que o britânico “sir” Tim Berners-Lee criou a World Wide Web? Muita coisa, não? Aliás, nem é possível pensar o mundo sem essas letrinhas. A invenção é de 1989. O mesmo ano em que o Brasil, potência do agronegócio global, colocava em prática a sua lei 7.802, ou Lei dos Agrotóxicos. Naquele ano, as exportações do agronegócio trouxeram ao País US$ 13,9 bilhões. No ano passado, foram US$ 96 bilhões. Desde então, o campo se transformou baseado em tecnologias e muita coisa mudou na maneira de produzir. Menos a lei que rege os agrotóxicos.

Está aí a gênese da guerra que se instaurou no País desde o fim de junho, depois que a Comissão Especial da Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei 6.299/2002, de autoria do ministro da Agricultura, Blairo Maggi, e que até então estava esquecido em alguma gaveta federal. Com algumas poucas sugestões de mudanças em relação ao texto original, a lei que flexibiliza as regras para a aprovação de agrotóxicos utilizados no campo ainda precisa passar pelo plenário da Câmara e em seguida pelo Senado, onde será votado. Mas essa lei é adequada? Ela responde às demandas de quem produz e de quem consome alimentos? Qual a métrica do consenso? Infelizmente, essa negociação ainda não existe.

A lei proposta muda os prazos para a aprovação de agrotóxicos, altera a denominação dos produtos dessa categoria para pesticidas e tira dos processos de aprovação de uso a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama). E aí se instala o ambiente de discórdia entre os ruralistas, as ONGs e as várias comunidades científicas, sempre prontos a confrontos extremados.

Como já ocorre na maior parte de temas que interessam aos dois lados e que raramente se sentam para encontrar um denominador comum. No caso dos agrotóxicos, de um lado está a falta de tato dos ruralistas para conversar com os que se dizem ambientalistas. De outro, está um exército que pouco leva em conta a produção em escala e as boas práticas em sistemas industriais no campo, mas que estão em sintonia fina com a sociedade que deseja segurança no momento de comprar um legume, uma fruta ou um quilo de farinha de trigo. Isso acontece porque, na maior parte das vezes, os representantes do agronegócio falam para si mesmos e não para a sociedade.

O fato é que o Brasil precisa de uma nova lei que modernize o setor de proteção de culturas, defensivos, agrotóxicos ou pesticidas, seja lá o nome que se dê a esses medicamentos para as plantas. Moléculas utilizadas há quase uma década em outros países esbarram na burocracia brasileira. As aprovações ou rejeições de tecnologias estão empilhadas em alguma mesa. Somente de novas moléculas estão cerca de 30 pedidos na prateleira da burocracia. Enquanto isso, produtos defasados, que poderiam ser substituídos por agentes mais modernos e ambientalmente menos nocivos e sustentáveis, ainda reinam nas lavouras.

Mas como desburocratizar? O que precisa ser preservado e o que precisa de mudanças? É isso que a sociedade precisa entender, antes de tudo. É essa a tarefa das lideranças do agronegócio, antes de qualquer outra ação. Porque não basta frequentar os corredores de Brasília. Sim, é preciso comunicar ao consumidor de que com boas práticas no campo é possível produzir com segurança e em escala, para que não falte comida na mesa e que sobre volumes para exportar a outros países. E que é possível a convivência de várias sistemas de produção e que há mercado para os dois lados da questão, no Brasil e no mundo. A tarefa não é fácil, porque as ONGs conseguem se comunicar com a sociedade muito melhor que os ruralistas. Mas é viável. Basta aprender e não entregar os pontos.