Imagine um leilão de uma nota de R$ 100 com duas regras bem simples. A primeira: quem fizer o lance mais alto, leva a nota. A outra regra: a segunda oferta mais alta também paga pelo seu lance, mas não leva nada em troca. O professor Max Bazerman sempre começa seu curso do MBA em Harvard com esse leilão. E nunca perdeu um centavo – muito pelo contrário.

Pensando racionalmente, ninguém entraria nesse jogo. É virtualmente impossível ganhar. A pessoa com o segundo maior lance, percebendo que terá que pagar sem levar o prêmio, segue aumentando a oferta. E os dois seguem assim por diante, até que um dos jogadores desiste e o professor leva o dinheiro dos dois para casa.

O que leva os alunos do MBA de Harvard a entrarem nessa cilada? Por instinto, veem ali uma oportunidade de ganhar um dinheiro às custas do professor, e ainda de se destacarem diante dos colegas. Entram no jogo sem pensar, impulsivamente.

Como regra geral, impulsos e reações instintivas nos levam a agir contra nós mesmos. Isso é verdade em todos os aspectos da vida, mas especialmente mais complicado quando o assunto é dinheiro. Os livros-texto de economia assumem que os mercados e as pessoas são racionais, e por isso as decisões são tomadas de maneira eficiente. O problema é quando o sistema límbico – aquele que forma as nossas respostas a ameaças iminentes e é responsável por emoções como a paixão – toma conta. Ele é a parte mais antiga do nosso cérebro, e, portanto, a menos eficiente. É ele que nos faz tomar as decisões mais irracionais.

O medo de ficar de fora (FoMO ou Fear of Missing Out) é um exemplo perfeito do nosso sistema límbico em ação. É aquela ansiedade que dá quando não estamos em algum lugar onde tudo está acontecendo, ou a aflição que temos ao não participar de algo que aparentemente todos estão participando. Neste caso, é o medo da Tesla ser a nova Amazon e o mundo todo ter percebido, menos você.

O movimento recente nos papeis da Tesla é causado, na minha opinião, pela cobertura de posições vendidas no papel potencializado por um razoável grau de FoMO.

A empresa fundada em 2003 pelo sul-africano naturalizado americano Elon Musk – que já tinha vendido o PayPal para o e-Bay por mais de US$ 1 bilhão – abriu capital na NASDAQ em 2010. Além de operar num setor intensivo em capital, a empresa demanda uma dose extra de CAPEX para continuar evoluindo com os modelos e suas funcionalidades, como os carros autônomos, as baterias e os supercarregadores, e oscila entre prejuízo e lucro. Por outro lado, tem conseguido superar uma série de dificuldades operacionais na fabricação dos veículos. Além disso, seu produto tem um apelo excepcional: são carros bonitos, rápidos, arrojados e acessíveis a bolsos que podem pagar a partir de US$ 35 mil, preço médio de venda de carros novos nos Estados Unidos. A demanda é crescente, o que prova que o conceito funciona: quem quiser comprar um Tesla hoje entra no site, monta seu carro e precisa esperar de 5 a 7 semanas para a entrega.

No fechamento do dia 4/2/2020, o valor de mercado da empresa apontou US$ 160 bilhões. No final de 2019, esse mesmo valor era de US$ 75 bilhões. O que aconteceu? No dia 29/1, a empresa anunciou que teve o segundo trimestre consecutivo de lucro, e prometeu entregar 500 mil veículos durante o ano de 2020 – número que também foi prometido em 2018 e 2019, porém sem sucesso. Foi suficiente para quem estava vendido, esperando um resultado pior, cobrir suas posições. Mas o que fez o valor da empresa pular mesmo foi o tal FoMO. Prova disso é que, nesse dia, digitando as palavras “Should I…” no Google, o buscador completava automaticamente a pergunta: “…buy Tesla stock?”.

A Tesla vale mesmo US$ 160 bilhões? Há gente muito boa por aí que acredita que vale bem mais. Já vi análises colocando a ação em US$ 6 mil em um horizonte de cinco anos. Do outro lado da moeda, há também gente muito boa dizendo que vale bem menos. Na minha opinião, o risco de execução de uma tecnologia nova produzida em escala é enorme. E esses valores estratosféricos somente se justificam se tudo, absolutamente tudo, der certo. Com um gestor como Elon Musk que é, com o devido respeito a ele, um personagem bastante caótico, a chance de tudo dar certo o tempo todo é bem baixa. O sistema límbico dele parece dominar a maior parte do seu cérebro.

E o Bitcoin? Esse mercado já teve o seu momento FoMO. Ao final de 2018 a moeda chegou a valer US$ 20 mil, num movimento muito parecido com o que vimos nesta semana com a Tesla. A correção que veio em seguida criou o que se chamou de “inverno das criptomoedas”. Como já escrevi no blog, sou otimista com esses ativos, e acho que este mercado está amadurecendo a cada dia. Consigo visualizar um momento em que a volatilidade desses meios de troca vai diminuir, com preços em patamares bastante mais altos.

Agir por impulso, instinto, ou por puro medo de ficar de fora pode funcionar por um ou dois dias, às vezes até por uma semana ou um mês. Mas a verdade é que a conta sempre vem – e ela é cara. Na minha longa experiência em mesas de operações, quando queria operar um ativo que subia ou caia sem qualquer motivo racional, o melhor conselho era: “vai tomar um café que a vontade passa”. No decorrer da minha carreira, tive muitos momentos como esse no café. E muitos momentos em que deveria ter ido tomar o café, e não fui. Me arrependo deles até hoje.

Por isso, se pudesse codificar a resposta no Google para “Should I buy Tesla stock?”, ela seria: “vai tomar um café”.