Protegido com capacete e colete à prova de balas, Stanislav Shuj observa o mar calmo com o som de morteiros ao fundo. No leste da Ucrânia, os confrontos continuam, apesar do anúncio de Moscou da retirada de suas tropas da fronteira.

“Infelizmente, a escalada continua a ser palpável”, disse à AFP o soldado de 35 anos, mobilizado no vilarejo de Shirokine, no mar de Azov, perto de Mariupol, a última grande cidade do leste controlada por Kiev.

Outrora um popular balneário nesta região industrial, Shirokine foi abandonada pelos seus habitantes após o início da guerra com os separatistas pró-russos em 2014.

Atualmente em ruínas, o povoado tem trincheiras por toda parte e seus becos só são transitados por soldados que tentam evitar pisar nas minas.

Desde o início do ano, os confrontos entre as forças ucranianas e os separatistas aumentaram, após uma trégua globalmente respeitada durante o segundo semestre de 2020.

Cerca de trinta soldados ucranianos foram mortos desde o início do ano, contra um total de 50 em 2020. Os separatistas reportaram a perda de pelo menos vinte combatentes desde janeiro.

“A atividade do inimigo se manteve igual”, diz Shuj. “Eles investigam nossas posições. Poderíamos dizer que estão fazendo um reconhecimento por meio de fogo”.

– “Para sempre!” –

Gosha, um militar de origem georgiana, confirma esse cenário. “Você vê com seus próprios olhos que eles estão atirando”, disse ele a jornalistas da AFP, enquanto tiros de morteiro eram audíveis.

“Esta manhã, eram morteiros de 120 mm e lançadores de granadas”, disse ele, acrescentando que outro soldado nascido na Geórgia foi morto “uma semana atrás” por “disparos de lança-granadas em uma trincheira”.

De fato, na linha de frente como um todo, o número de violações da trégua não caiu, de acordo com uma missão de observação da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) implantada na região do conflito.

Em seu relatório de segunda-feira, a OSCE reportou 390 violações constatadas entre sexta-feira e domingo nas regiões de Donetsk e Lugansk, contra 332 no fim de semana anterior.

“No leste, não há mudanças”, disse uma autoridade ucraniana à AFP, sob condição de anonimato.

Enquanto isso, o anúncio da retirada das tropas que a Rússia mobilizou na fronteira não parece muito convincente para os ocidentais.

“Vimos algumas forças russas se afastando da Ucrânia”, mas “é muito cedo para ter certeza”, declarou o porta-voz do Pentágono, John Kirby, na segunda-feira.

No terreno, os soldados ucranianos também estão cautelosos.

“De acordo com nossos dados, parte das tropas russas deixou o território fronteiriço, mas todo o seu equipamento pode ser movido facilmente no caso de uma escalada”, segundo Shuj. “É apenas uma manobra”, acrescenta Gosha.

Para Oleksander Litvinenko, diretor do Instituto Ucraniano de Estudos Estratégicos, é provável que essa tensão com Moscou se repita com frequência.

“É para sempre!”, comentou o especialista, para quem o movimento de tropas perto da Ucrânia proporciona ao Kremlin “um bom instrumento de negociação com os americanos”, ao mesmo tempo que mantém a pressão sobre Kiev.