Imagine a seguinte situação. Um típico terminal aéreo estatal sucateado, com problemas que vão desde banheiro sujo até pessoas dormindo no chão por falta de uma infraestrutura elementar. Depois de privatizado, ele vira modelo de modernidade. Mas, embora moderno, não tem o movimento esperado. Financeiramente é um abacaxi, que está sendo devolvido ao governo. Essa é a síntese do Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP). Na última semana, um dos mais importantes hubs aéreos do País viveu uma situação inédita na história da aviação. Na quinta-feira (10), a Justiça decretou o encerramento do processo de Recuperação Judicial, iniciado em fevereiro deste ano, para que a concessionária que a administra, a Aeroportos Brasil Viracopos (ABV), possa dar início à devolução de concessão, como prevê a lei de relicitação. O processo é a esperança para que seja possível pagar as dívidas e multas acumuladas nos oito anos de gestão privada. O consórcio, arrematado em leilão por R$ 3,8 bilhões, é formado pela Infraero e pelas construtoras Triunfo, UTC e a francesa Egis.

A devolução de Viracopos, no entanto, não representa o fim dos problemas. Em especial pelo fato de que a relicitação, prevista pelo Governo Federal para o terceiro trimestre de 2021, não garante que um novo consórcio seja encontrado, o que impossibilitaria a quitação das dívidas ainda existentes com grandes credores, entre eles a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

R$ 11 bilhão dívida de viracopos à anac, entre multas e outorgas vencidas 

Toda essa turbulência foi originada pela ilusão, reforçada pelo Governo Federal à época, de um cenário favorável à concessionária. As altas expectativas de movimentação de cargas e passageiros não se concretizaram e renderam a Viracopos um terminal exorbitante e subutilizado, afetando diretamente a receita do consórcio. Além disso, a entrega com atrasos deu início a um processo de caducidade de concessão aberto pela Anac. Nele, o órgão regulador cobrava uma rescisão antecipada do contrato por culpa do consórcio, que reagiu entrando com um pedido de Recuperação Judicial no mesmo ano. A estratégia continuou com o anúncio, no fim de 2019, do pedido de relicitação, fato que suspende o processo de caducidade, mas que depende do encerramento da Recuperação Judicial para acontecer.

Em paralelo à relicitação, um processo de arbitragem deve ser iniciado entre Anac e a ABV para calcular o valor das indenizações. Segundo a Anac, o valor entre multas e outorgas vencidas está em mais de R$ 1,1 bilhão. Já Viracopos questiona a exigência contratual de construção de um terminal com capacidade para 25 milhões de passageiros ao ano quando a média anual no aeroporto é de 10,5 milhões.