Num país desigual em todas as frentes, o mundo digital não poderia ser algo à parte. A cada 100 brasileiros, 19 têm alguma restrição visual, sete possuem restrição motora, cinco têm problemas auditivos e uma pessoa sofre de limitação mental ou intelectual. São pelo menos 45 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência. Um contingente que não acessa ou navega pela web em sua plenitude. Esse é o foco de atuação da startup de origem israelense EqualWeb. “A tecnologia consegue dar escala e velocidade na resolução de grandes e complexos problemas da sociedade”, afirmou à DINHEIRO Jaques Haber, head de Impacto da empresa no Brasil.

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Haber, que é casado com uma cadeirante, é um dos quatro sócios que trouxeram a EqualWeb ao País, há um ano – ao lado de Edmundo Fornasari (head Institucional), Marcelo Herskovitz (head de Marketing) e Ricardo Hechtman (head de Inovação). Do ponto de vista de ausência de acessibilidade, o universo digital brasileiro é uma espécie de Oceano Azul de oportunidades. Segundo pesquisa da BigDataCorp em parceria com o Movimento Web para Todos (WPT), feita em 2020, dos 14,6 milhões de websites ativos no Brasil, apenas uma ínfima parte de 0,74% está em conformidade com os critérios de acessibilidade.

A questão está contemplada no Estatuto da Pessoa com Deficiência, lei de 2015 que, em seu artigo 63, diz que é “obrigatória a acessibilidade nos sítios da internet mantidos por empresas com sede ou representação comercial no País ou por órgãos de governo”. Isso tem impulsionado o mundo corporativo a se adequar também digitalmente. Hoje, a EqualWeb já tem clientes do porte de Coca-Cola, FGV, Motorola e Suvinil.

A empresa trabalha com um portfólio de 31 soluções – que vão de Comando de Voz (as funções são executadas por meio do microfone, ferramenta para pessoas com limitação motora, ausência de braço ou mãos, paralisia ou deficiência visual) até Descrição de Imagem (funcionalidade essencial a pessoas com deficiência visual). Para a criação das ferramentas, a EqualWeb utiliza inteligência artificial e machine learning, tornando a adaptação dos sites mais barata, simples e rápida. Não é necessária a reconfiguração completa do design, nem alteração do código fonte do site. “A tecnologia é hoje a maior aliada da inclusão”, afirmou Haber.

A seguir, trechos da entrevista com Jaques Haber, sócio e head de Impacto da EqualWeb.

Como estão os resultados da EqualWeb no Brasil?
Jaques Haber – Vamos fechar o primeiro ano com faturamento próximo a R$ 1 milhão e no próximo ano queremos quadruplicar a receita.

Qual é o modelo de negócios?
A Equalweb segue o modelo SaaS (Software as a Service), com valores mensais que variam de R$ 590 a R$ 5.999, dependendo da complexidade do site e do número de páginas que ele comporta. A empresa pode optar por contratar dois tipos de pacote: um com até 25 funcionalidades ou outro com todas as 31 funcionalidades. Sites com mais de 1 milhão de páginas ou mais de 5 milhões de visitas tem valores sob consulta.

Como evitar, também no universo digital, uma visão capacitista e não de acessibilidade, muito comum no mundo não virtual?
O sucesso alcançado por uma pessoa com deficiência é sempre tratado como ‘superação’. O capacitismo nada mais é do que um preconceito similar a tantos outros, como o racismo, a homofobia, a misoginia ou a xenofobia, e evidencia nossa dificuldade em tratar como iguais pessoas com alguma deficiência. O capacitismo deixa em segundo plano o debate essencial sobre a necessidade de tornar o mundo mais inclusivo. Sobre ofertar igualdade de oportunidades para uma sociedade composta por uma grande diversidade de pessoas. Isso vale igualmente para o universo digital.

O mundo da tecnologia ainda é imerso em muito preconceito, que muitas vezes migra para as soluções, não?
A maioria das pessoas que desenvolvem tecnologias são homens, muito provavelmente brancos, heterossexuais e sem deficiência. É difícil encontrar programadores cegos, surdos ou com alguma deficiência motora. Quem não vive a dor não consegue enxergar a necessidade de oferecer a acessibilidade. E não é só no time de desenvolvedores que se observa essa visão limitada, mas também entre as lideranças. É a falta de representatividade nas equipes de desenvolvimento e nas lideranças das empresas que perpetua o preconceito.