Boa parte do ganho das estatais de saneamento básico com os reajustes tarifários foi repassada para salários. Um estudo feito pela consultoria Inter.B, com dados do Sistema Nacional de Informações de Saneamento (Snis), mostra que, entre 2014 e 2017, os serviços do setor subiram em termos nominais 30,7% e as despesas com empregados, 26,9%, em média. Nesse mesmo período, os investimentos das estatais – que administram a maior parte das atividades no País – caíram quase 3% e o volume de perdas de água aumentou de 36,67% para 38,3%.

Segundo a Inter.B, das 26 estatais analisadas, 14 registraram queda nos investimentos e 10 tiveram avanço das despesas com empregados acima do porcentual de reajuste das tarifas. Em apenas seis companhias, os investimentos foram maiores que o aumento dos gastos com pessoal. “O setor público investe relativamente pouco, mas a razão básica é que falta governança e gestão nas companhias”, diz o presidente da Inter.B, Cláudio Frischtak.

Para ele, os números do Snis declarados pelas próprias empresas são um reflexo dessa fragilidade que afeta a qualidade da gestão, retira autonomia do gestor e reduz o volume de recursos para investimento – quadro que pode mudar com a aprovação do Projeto de Lei 3261/19 do novo marco regulatório do setor.

“Há muitos anos, as empresas estão capturadas, numa situação que vem se agravando. Não é coincidência que os índices de saneamento são péssimos. Afinal, essas empresas (estatais estaduais) são responsáveis por mais de 70% do mercado (o resto está com estatais municipais e com o setor privado).”

Frischtak se refere ao fato de que cerca de 100 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à coleta de esgoto e 35 milhões não são abastecidos com água potável. Dados do Instituto Trata Brasil, mostram que 38,3% de toda a água pronta para ser distribuída se perde hoje pelo caminho, especialmente por causa de vazamentos e dos chamados “gatos”. A perda de faturamento representou prejuízo de R$ 11,3 bilhões para o País – mesmo valor investido no setor em 2017.

Na Cedae, concessionária do Rio de Janeiro, as perdas ficaram em 30% em 2017. Segundo a companhia, as principais causas são as ligações clandestinas e hidrômetros com mau funcionamento, além de vazamentos. Entre 2014 e 2017, de acordo com a Inter.B, a companhia reduziu em 62% os investimentos enquanto as despesas com empregados cresceram 55% – acima dos 22,3% de reajuste das tarifas.

Em nota, a empresa afirmou que a queda nos investimentos é decorrente da crise econômica que afeta o Estado do Rio, mas que tem preservado os projetos em andamento. Sobre os gastos com pessoal, disse que desde janeiro tem promovido diversas ações relacionadas à gestão de pessoal e que já conseguiu uma redução de 12% com essas despesas. O número de funcionários caiu de 5.422 para 5.234.

Ainda pelos dados da Inter.B, a Saneago – companhia de saneamento de Goiás – também teve uma queda brusca no volume de investimentos, de 68,7% entre 2014 e 2017. Nesse período, as tarifas da estatal subiram 51,5% e as despesas com empregado, 37,2%. Em nota, a empresa afirmou que “recentemente passou por uma reestruturação, com dois PDVs (Programas de Desligamento Voluntário), cortando 605 empregados do seu quadro de pessoal”. Isso foi responsável por economia anual de R$ 139 milhões. Além disso, afirmou que deve fechar 2019 com R$ 1,1 bilhão de investimentos em contratação de obras e em licitação.

Estiagem

Para o presidente da Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe), Marcus Vinícius Fernandes Neves, o custeio de uma companhia de saneamento é complexa e deve ser vista sobre várias vertentes, como o custo de funcionário por ligação ativa. Segundo ele, no Nordeste, por exemplo, houve uma das maiores estiagens da história no período, o que significou aumento no custeio das empresas – com produtos químicos para manter a qualidade da água, aumento no custo da energia, entre outros itens cotados em dólar. Isso influenciou na redução dos investimentos.

Pelo Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), o País teria de investir R$ 20 bilhões por ano para universalizar os serviços até 2033. Mas, pelo ritmo atual, essa meta só será alcançada com 20 anos de atraso.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.