Quem foi ao Congresso Nacional, na quarta-feira 21, viu estampada no Jornal do Senado a seguinte manchete: “Reforma trabalhista é rejeitada em comissão”. O tabloide de oito páginas, distribuído gratuitamente aos visitantes, informava que havia ocorrido, no dia anterior, uma “reviravolta que surpreendeu os governistas”. De fato, foi uma surpresa. Enquanto o presidente Michel Temer cumpria agenda na Rússia (leia mais aqui), o núcleo político do Executivo focava as atenções ao Poder Judiciário.

O senador Eduardo Amorim (PSDB-SE), surpreendeu com voto contrário dos demais (Crédito:Edilson Rodrigues)

O Supremo Tribunal Federal (STF) apreciaria, naquela tarde, o pedido de prisão do senador Aécio Neves (PSDB-MG), mas o julgamento foi adiado. Na 12ª Vara Federal, seria julgada a queixa-crime de Temer contra o empresário Joesley Batista, que acabou rejeitada. Também entrou na lista o relatório parcial da Polícia Federal que apontava, “com vigor”, a prática de “corrupção passiva” pelo presidente. A menor das preocupações era com o Legislativo, onde a base de apoio é considerada sólida. No entanto, veio do Senado o susto do dia.

A Comissão de Assuntos Sociais (CAS) rejeitou, por 10 votos a 9, o relatório da reforma trabalhista, que havia passado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Um cochilo dos articuladores políticos e algumas traições na base explicam a primeira derrota do governo depois das bombásticas gravações da JBS. Assim que o revés político ocorreu no Senado, a Bolsa de Valores caiu e o dólar subiu. Em questão de minutos, Temer foi avisado, em Moscou, e reagiu. “Você ganha numa comissão, perde noutra, mas vamos vencer no plenário.”

As palavras do presidente ecoaram em Brasília. A ordem para minimizar o fato foi seguida à risca. Em vídeo, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que “é algo corriqueiro na lide parlamentar perder na comissão e ganhar no plenário.” A equipe econômica também se alinhou à mensagem. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, repetiu a expressão “corriqueiro” e ressaltou que “o nosso plano de trabalho está baseado na hipótese de que ela [reforma trabalhista] será aprovada, e estamos bastante serenos em relação a isso”.

“O estatuto do PMDB prevê a divergência interna e isso vale para as reformas” (Crédito:Geraldo Magela/Agência Senado)

O próximo passo será a votação do relatório do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), no dia 28 de junho, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).“Foi uma vitória de Pirro [da oposição]”, afirmou Jucá. Em seguida, o texto com as novas regras passará pelo crivo final do plenário. A reação negativa dos investidores ao placar na comissão deixou claro que o apoio velado do mercado financeiro ao governo Temer está diretamente relacionado à sua capacidade de aprovar as reformas estruturais no Legislativo. E o Executivo sabe disso.

No dia seguinte, em entrevista à DINHEIRO, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Wellington Moreira Franco, lamentou o que chamou de “tropeço”, culpou o PSDB pela derrota e afirmou “não ter dúvida de que a reforma trabalhista passa no plenário” (leia entrevista aqui). Na votação, o tucano Eduardo Amorim (SE) votou contra. Houve traições também no PSD e no PMDB, partido de Moreira Franco e do presidente Temer. O senador Hélio José (PMDB-DF) foi um dos dez votos contrários à reforma trabalhista.

No mesmo dia, o governo publicou no Diário Oficial a exoneração de duas pessoas indicadas pelo peemedebista. “É inadmissível que um governo mergulhado neste emaranhado de corrupção tome este tipo de atitude, de retaliação a quem quer fazer as coisas de forma correta”, reclamou o senador que, no ano passado, havia dito que conseguia indicar a “melancia” que quisesse para os cargos no governo federal. Crítico do governo, o seu colega de partido, Eduardo Braga (AM), diz ser favorável à reforma, mas com alterações.

“Eu não estou preocupada com a eleição de 2018. Estou preocupada com o futuro do Brasil e dos trabalhadores” (Crédito:Moreira Mariz/Agência Senado)

O senador considera natural haver racha entre os correligionários. “O estatuto do PMDB prevê a divergência interna e isso vale para as reformas”, afirma Braga, que é aliado do líder do partido no Senado, Renan Calheiros (AL), outro peemedebista que votou contra o governo federal. Já a senadora Ana Amélia (PP-RS), que defende a proposta do governo, destaca que a aprovação é um desejo dos 14 milhões de desempregados e de outros milhões que estão na informalidade. “Eu não estou preocupada com a eleição de 2018”, diz Amélia. “Estou preocupada com o futuro do Brasil e dos trabalhadores.” A partir de agora, a base governista promete mobilização total para aprovar as mudanças nas regras trabalhistas no plenário do Senado, no começo de julho, antes do recesso parlamentar.

Embora o projeto necessite de apenas a maioria simples dos votos (41 dos 81 senadores), o presidente Temer quer demonstrar força com um placar mais elástico. Para os investidores, as novas regras trabalhistas são um aperitivo para a reforma da Previdência Social, a mais importante de todas do ponto de vista fiscal e que demanda um placar muito maior para ser aprovada, de dois terços dos parlamentares em cada uma das Casas, em duas votações. Todo esforço do núcleo político visará evitar que o Jornal do Senado volte a estampar mais manchetes com “reviravoltas surpreendentes”.