Uma das principais bandeiras de campanha do presidente Jair Bolsonaro, a redução dos incentivos fiscais e tributários a empresas entrou definitivamente na lista de prioridades da pauta econômica dos últimos dias. Na quarta-feira (9), em mais um episódio de vaivém de declarações desencontradas do time governista, o ministro da Economia, Paulo Guedes, deu sinais de que convenceu seu chefe de que não há mais espaço para expansão dos gastos com auxílio emergencial e de ajuda a empresas na atual conjuntura do País. O rombo fiscal nacional já cutuca juros e inflação. Em uma videoconferência com empresários e investidores internacionais, o 2020 Asia Summit, do Milken Institute, Guedes afirmou que o Brasil vai enviar um sinal de compromisso com o ajuste fiscal neste fim de ano com o corte das benesses do poder público para segmentos da sociedade.

“Depois de termos reduzido os gastos previdenciários, gastos com juros da dívida pública, com a folha de pagamento dos funcionários públicos, estamos enviando também um forte sinal de redução de subsídios”, afirmou o ministro, com um raro semblante de vitória sobre as questões políticas.

No ano passado, o governo concedeu R$ 348,3 bilhões em subsídios, cifra que corresponde a quase 5% do Produto Interno Bruto (PIB). Embora não tenha detalhado como será a redução deles, fontes próximas a Guedes e congressistas a par das negociações afirmam que a proposta a ser apresentada prevê a retirada gradativa, dentro de um período de cinco anos, de mais da metade do que hoje o governo abre mão em impostos. Com isso, a ideia é diminuir dos atuais 4,8% para em torno de 2% do PIB o custo para o governo com a renúncia de receitas e gastos com subvenções e programas de crédito. O plano de redução dessa dinheirama do setor público para o privado poderá gerar uma economia para o governo já no próximo ano de aproximadamente R$ 30 bilhões.

Guedes afirmou que, após a reforma da Previdência no primeiro ano de governo e da guerra contra a pandemia em 2020, a grande pergunta dos economistas é o que vem daqui pra frente. “Acho que isso vai acontecer antes do fim do ano”, afirmou o ministro. “Dois dias atrás, demos outro sinal, de que vamos acabar com o auxílio emergencial no fim desse ano. Estamos removendo gastos extraordinários e reduzindo subsídios.” A declaração de Guedes foi dada após reação negativa do mercado financeiro à divulgação na segunda-feira (7) de um suposto relatório preliminar da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) Emergencial que excluiria da regra do teto despesas financiadas com verba desvinculada de fundos públicos.

(QUASE) SEM INCENTIVO Benefícios fiscais que visam estimular a construção civil, criados a partir de 2013, serão revistos e poderão ser retirados de maneira gradual a partir de 2021. (Crédito:Rogerio Lacanna)

ACORDO O que provavelmente convenceu Bolsonaro a dar início a uma retirada paulatina dos incentivos é que a decisão representa uma bandeira branca com o Congresso. Segundo o líder do governo, Fernando Bezerra Coelho (MDB), congressistas e representantes da equipe econômica passaram as últimas semanas com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para arredondar os detalhes da nova PEC, que deve ser mais focada em diminuição de incentivos, extinção dos fundos públicos e fim dos gatilhos para corte de despesas e readequação orçamentária de União, estados e municípios. Foram retiradas mudanças como a sempre polêmica desvinculação de recursos em saúde e educação e a criação do Renda Cidadã.

O nó de qualquer política de estímulos está sempre no tamanho da dose. Para o economista Alcântara Macedo, da Universidade Federal do Ceará, o governo precisa avaliar com cautela o fim dos incentivos. “É salutar manter uma política equilibrada para ajudar na competitividade, mas criar dependência é um desastre”, disse. Já para Luiz Carlos Bresser-Pereira, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, o governo vai errar ao adotar uma postura liberal fora de hora. “Tem que mudar a política econômica, tem que abandonar o liberalismo econômico e voltar a ser desenvolvimentista”, afirmou. “Deve haver uma intervenção moderada do Estado na economia. É preciso ser nacionalista econômico.”

OCDE O arrocho fiscal defendido por Guedes visa, no fundo, reverter a deterioração da imagem do Brasil no campo internacional. O ministro disse que o País está bem na corrida para entrar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE. “Estamos à frente de todos os candidatos em termos de satisfazer os requerimentos de modernização”, disse. A Casa Civil informou que o Brasil é o país não-membro com o maior número de adesões a instrumentos da OCDE – de 245, diz o governo, o Brasil aderiu a 94 e aguarda autorização para outros 49. “Chegar na OCDE, para nós é um desafio e um estímulo”, disse o ministro Guedes, que após perder parte do apoio de economistas brasileiros, resolveu ver se consegue mais êxito no âmbito internacional.