O Brasil vai chegando a uma situação insustentável de miséria. Pelos dados que acabam de ser consolidados na Tendências Consultoria, o total de pobres irremediáveis no País deverá alcançar a impressionante marca de mais da metade da população neste ano de 2022. Isso deixa longe qualquer perspectiva de desenvolvimento sustentável, exigindo assim mais e mais programas assistenciais que remediam — embora não resolvam — o déficit social. Boa parte dessa fatia da população está alijada do consumo, comprometendo a cadeia produtiva e ampliando os gastos do setor público para manter sistemas de atendimento no campo da saúde, educação e bem estar. Para se ter uma ideia, as chamadas classes D e E, na base da pirâmide, somente retornarão aos níveis de qualidade de renda mínima de 2014 no ano de 2028 e encontram-se, no momento, no menor patamar de receita per capita jamais registrado na serie histórica do estudo. Nos últimos dez anos, com especial foco de aceleração nos anos do governo Bolsonaro, a parcela de pobres subiu significativamente. No número exato: o total de domicílios brasileiros sob tal condição chega a 50,7%. As projeções de longo prazo da Tendências mostram que, caso nada seja feito para reverter o quadro, a condição de subdesenvolvimento crônico tende a se consolidar. As denominadas classes D e E são aquelas cujo padrão de renda não ultrapassa os R$ 2,9 mil mensais — isso considerando o montante de recursos disponíveis para toda a família. Em outras palavras: quanto maior o número de membros da família consultada, ainda mais grave é o estágio de pobreza vivenciada nessas casas. A categoria dos extremamente pobres é a que mais engorda de uns tempos para cá, corroborando o quadro já verificado de fome intensa que leva milhares de habitantes a disputarem ossos nos caminhões de lixo das grandes cidades. Os efeitos acentuados da pandemia associados a uma recessão de impacto duradouro (em vigor desde 2015) são fatores a explicar parte dessa deterioração social. Mas não só eles. O que mais castiga esse segmento, e de maneira pesada, é a retomada da inflação, que acaba, mais uma vez, de registrar números recordes no mês, alcançando a pior marca verificada desde 1995. É um andar para trás que vem pesando fundamentalmente sobre quem não tem nada, ou quase nada, para sobreviver. A inflação está fora de controle por apatia federal que deixou de fazer as gestões na hora certa e da forma correta para contê-la. A bem da verdade, o fenômeno da carestia pós-Covid é mundial, mas aqui ele se verificou de maneira implacável. O Brasil é o terceiro país no ranking global dos que mais aumentaram preços, o que tem muito a ver com a completa ausência de políticas econômicas eficazes por parte do Estado. A mobilidade social por aqui, infelizmente, será bastante reduzida nos próximos anos, consagrando a desigualdade histórica. Na divisão do bolo, os ricos ficam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. O quadro clássico de um subdesenvolvimento que não cessa.

Carlos José Marques, diretor editorial