US$ 1 trilhão. É a marca a ser batida. Qual será a primeira empresa a ultrapassar a casa dos 12 dígitos em valor de mercado? Esta é a pergunta que não quer calar e tem sido feita repetidamente pelos investidores e analistas financeiros com a rápida ascensão e consolidação nas últimas décadas das grandes de tecnologia como as maiores empresas do mundo, desbancando a soberania que parecia imbatível da indústria petrolífera.

Agora responda rápido: qual será o fator preponderante que irá definir nos próximos anos o vencedor desta corrida? Resposta: a sua voz. Mas, pasmem leitores, não são as operadoras de telecom que irão romper a barreira do trilhão, mesmo sendo elas que processam há anos o maior volume de tráfego em voz.

Tráfego, vale sublinhar, é a definição dada pelas operadoras. As empresas de software têm uma denominação diferente: “volume de dados de voz”. E o motivo é simples. Elas transformam sua voz em dados, que, cada vez mais, são matérias primas essenciais para estruturar e monetizar negócios em diversos setores.

A informação (transmitida também por sua voz) é o novo petróleo.

Por isso, elementar, as principais candidatas ao trilhão são todas do setor de tecnologia e ocupam o topo da lista em valores de mercado(1), segundo o ranking da S&P 500 – Apple (US$ 873,1 bilhões), Alphabet (Google) (US$ 715,8 bilhões), Microsoft (US$ 640,7 bilhões), Amazon (US$ 531 bilhões) e Facebook (US$ 522,9 bilhões).

Não chega a ser surpresa, a soma do “valuation” das empresas de tecnologia da informação já representa nada menos que 24,5% entre as 500 maiores do mundo. Em comum, todas as top 5 (e nenhuma delas é uma operadora) estão neste momento travando uma batalha nada silenciosa para dominar a próxima plataforma que se tornará a chave para conquistar market share no futuro nada longínquo da Internet das Coisas. E, não tenham dúvidas, ela será a VUI – Voice User Interface.

Basicamente, qualquer coisa poderá estar conectada na Web para receber e obedecer seus comandos de voz – seu carro, sua casa, seus eletrodomésticos e, você ainda vai ter um, seu robô. E é por isso que te OUVIR nunca foi tão importante e será tão determinante nesta nova revolução já em curso.

Até aqui, a interface predominante foi a gráfica, inventada pela Xerox na década de 70, aprimorada pela Apple nos anos 80 com o lançamento do Macintosh e popularizada pela Microsoft com o Windows nos anos 90. A partir de agora, é a vez da voz.

Foi a transformação das linhas de código em ícones e janelas, mais compreensíveis pelos mortais que nunca aprenderam programação, que levaram Steve Jobs e Bill Gates e suas empresas ao estrelato. Suas invenções permitiram a explosão nas vendas de computadores de mesa e criaram o grande universo de usuários que, tempos depois, se conectaram em rede e nunca mais largaram o mouse.

No auge, em 27 de dezembro de 1999, o valuation da Microsoft atingiu o recorde de US$ 613 bilhões (ou US$ 873 bilhões em valores atualizados, coincidentemente o mesmo valor de mercado atual da maçã arqui-inimiga). Se tomou uma rasteira do Windows, a Apple deu o troco com o touchscreen, que fez do iPhone um produto ícone, símbolo do novo milênio e um precursor seguido por todas as fabricantes de smartphones e tablets.

A invenção da interface por toque na tela abriu um novo mercado (de telefones inteligentes e tablets) e a Web foi parar nos bolsos, ao alcance dos dedos, a qualquer hora e lugar, trazendo bilhões de novos usuários (consumidores) para o mundo digital. Olhos grudados nas telas, não sabemos mais como (sobre)viver sem nossos apps e nos tornamos dependentes dos mobile devices para as tarefas mais rotineiras e, nunca é demais lembrar, para comunicação.

As mensagens de texto e os comandos por cliques ainda serão, por algum tempo, nosso principal meio de comunicação e de interface com as máquinas. Mas a transição para voz será rápida e sem volta. O motivo? É muito mais fácil falar do que teclar. É muito mais ‘humano’. E criar interfaces mais ‘humanas’ é o que hoje tira o sono das top 5 da tecnologia. Elas sabem que quem primeiro conseguir ouvir sua voz, compreender o que você diz e responder aos seus anseios será a primeira empresa trilhardária.

E agora? Quem estará mais preparado para ouvir sua voz?

Os robôs domésticos serão apenas mais um dos dispositivos conectados que estarão prontos para te ouvir e brigar pela atenção da sua voz. O mercado de voicebots é só a ponta do iceberg do que virá por aí. A VUI já está embarcada em smartphones, em laptops, em carros, em headphones (o Google acaba de lançar um que faz tradução simultânea em 40 línguas) e em muitas outras coisas que chegarão nas prateleiras nos próximos anos.

As top 5 dos Estados Unidos (FAAMG) estão todas neste jogo – o Facebook com o Messenger, a Amazon com o Alexa, a Apple com o Siri, a Microsoft com o Cortana e a Alphabet/Google com o Google Now,. Também estão nesta disputa ao menos outros três players importantes: a Samsung com o Bixby, a IBM com o Watson e o buscador chinês Baidu (um mercado com bilhões de usuários) com o DuEr.

Todas as postulantes ao trilhão querem te ouvir simplesmente porque sua voz diz muito a seu respeito – que músicas mais pede para tocar, o que costuma jantar aos sábados ou que notícias são do seu interesse. E quanto mais sabem sobre você, mais conseguirão sua fidelidade (e seu bolso) como consumidor.

As previsões para o mercado de voz são animadoras. De acordo com levantamento do Gartner, em 2021 o mercado de devices dotados de tecnologia de reconhecimento de voz será de US$ 3,5 bilhões. O mesmo estudo indica que os varejistas que investirem em sistemas de busca por voz, ainda incipientes, poderão ter aumento de 30% nas vendas online. É um crescimento de receita considerável e que certamente não será ignorado pelos lojistas.

As aplicações para voz são infinitas e várias indústrias serão impactadas.

Quer um carro que te escute? O setor automotivo é um dos que certamente passará por uma grande reviravolta com a voz se tornando a interface mais usada. Através do Nissan Connect Services, a montadora japonesa é a mais nova a colocar no mercado um automóvel que você pode ‘conversar’ com ele através do Alexa, da Amazon, para dar partida, abrir e fechar as portas, acender os faróis, regular o ar condicionado ou tocar a buzina.

Na mesma estrada, Hyundai, Mercedes-Benz, Ford, BMW e SEAT também fecharam acordo com a Amazon para integrar sua plataforma de voz ao cockpit. Elas prometem transformar o Amazon Echo em um voicebot “dirigível”, disponível para realizar seus desejos, como fazer compras na Amazon ou pagar suas contas no banco digital enquanto está no engarrafamento a caminho de casa.

Quanto maior o uso da VUI em “coisas conectadas”, maior será o valor de mercado das gigantes da tecnologia. Elas provavelmente se tornarão as maiores empresas de dados de voz (não de tráfego de voz) do planeta. Seu desejo é uma ordem e sua voz está no comando. É você quem irá dizer quem será a empresa do trilhão.

 

(*) Omarson Costa é formado em Análise de Sistemas e Marketing, tem MBA e especialização em Direito em Telecomunicações. Em sua carreira, registra passagens em empresas de telecom, meios de pagamento e Internet.