Há alguns anos, apenas o espelho era suficiente para as mulheres experimentarem todo tipo de maquiagem. Com o desenvolvimento das tecnologias, os testes de batons, lápis, rímel, entre outros acessórios, passaram a ser feitos com uma foto, pelo celular. Essa é a nova fronteira para as mais importantes empresas do mercado global de saúde e beleza, um segmento que deve atingir US$ 675 bilhões em vendas, em 2020. As companhias estão investindo em inovação para se aproximar do desejo dos consumidores. “Essa é uma importante oportunidade para a companhia inovar em uma escala sem precedentes”, diz Lubomira Rochet, diretora digital da L’Oréal, em entrevista à DINHEIRO. “Os resultados moldarão a indústria da beleza nas próximas décadas.”

Empresa mais valiosa do segmento de higiene e beleza, a francesa L’Oréal, detentora de 34 marcas, desenvolveu o Makeup Genius, um aplicativo para o teste de suas maquiagens, em 2015. Mas o resultado não foi o esperado. No início de março deste ano, a gigante francesa adquiriu a canadense ModiFace, especializada em realidade aumentada e inteligência artificial para o setor de beleza. Fundada há 11 anos por Parham Aarabi, um especialista em tecnologia 3D, a ModiFace faz o diagnóstico da pele e suas características de maneira precisa para o teste de maquiagens. Era exatamente isso que a L’Oréal precisava desde que tentou desenvolver o próprio aplicativo, principalmente em um universo que se torna cada vez mais online. Em 2017, as vendas da empresa pelo e-commerce ultrapassaram a marca de € 2 bilhões, um crescimento de mais de 30% em relação ao ano anterior. Hoje, elas representam 8% das receitas do grupo. “A aquisição serve para ajudar nossos consumidores a descobrir, experimentar e escolher diferentes produtos e marcas”, diz Lubomira.

Uma nova era: Lubomira Rochet, da L’Oréal (no detalhe), diz que a empresa ModiFace, especializada em tecnologia 3D, ajudará a marca a inovar em uma nova escala (Crédito:Divulgação)

Essa mudança na forma de consumo da maquiagem é uma grande oportunidade para as empresas de cosméticos conhecerem melhor o seu público. “Com tanta precisão, as companhias terão acesso a informações que nunca tiveram por esses aplicativos”, diz Roberta Cipoloni Tiso, diretora de marketing da agência DPI. Com isso, elas conseguirão entender melhor as preferências, gostos e direcionar com mais assertividade o lançamento de seus produtos. Um diferencial bastante importante em meio à grande concorrência existente no mercado. Hoje, as experiências são valorizadas. Cerca de 80% das pessoas estariam dispostas a gastar mais em um produto caso a prova de compra fosse mais satisfatória, segundo levantamento da Capgemini, consultoria global especializada em tecnologia digital. “Antigamente, a cliente via uma propaganda aqui, outra ali e só depois decidia pela compra”, diz Murillo Boccia, diretor de negócios digitais da Natura. “O acesso aos produtos, também, era mais difícil.”

A própria Natura demorou a entender esse movimento de transformação. Mas, nos últimos dois anos, acelerou sua aposta em soluções digitais. Em 2015, a empresa desenvolveu, em parceria com a chinesa Meitu, o MakeUp Plus, um aplicativo que permite o teste e a compra de maquiagens da marca. Essa sociedade ajudou a empresa brasileira entender como funciona o software. Em abril deste ano, a Natura apresenta dentro do seu próprio aplicativo esse novo recurso para toda a linha de maquiagem para o rosto. A ideia é estender essa possibilidade de testes para os outros produtos da marca. “Ao mesmo tempo em que desenvolvíamos nossa própria tecnologia, começamos a desenvolver o trabalho com parceiros”, afirma Boccia.

Murillo Boccia, Diretor de negócios digitais da Natura: “Percebemos que o consumidor quer ter uma experiência de compra completa, do físico ao virtual.” (Crédito:Divulgação)

Os catálogos da Natura também vão ganhar um toque tecnológico. A empresa adiantou à DINHEIRO uma parceria inédita com a rede social Pinterest, que se consolidou como uma ferramenta de busca por imagens. Os produtos do catálogo Natura terão o botão “pin”. Ao mirar o smartphone na imagem, o consumidor será redirecionado para a página da marca dentro do Pinterest com looks de maquiagens e inspirações temáticas para a noite, o dia ou uma festa. Os produtos, claro, poderão ser comprados direto na rede. “O que percebemos é que o consumidor quer a experiência completa”, diz Boccia. “E a experiência física tátil e a do mundo virtual se completam.”

De 2002 a 2016, as vendas de maquiagens e cosméticos pela internet cresceram 602% no mundo. No Brasil, essa expansão foi de 408%, segundo a consultoria internacional Euromonitor. Além de L’Oréal e Natura, outras empresas do segmento também estão de olho nessas novas tecnologias, como a Avon, que criou o Espelho Avon, e a Sephora, que desenvolveu o Virtual Artist, aplicativos com diversas funcionalidades para o teste de produtos. “O que hoje começa como uma tendência, uma diversão lúdica de testar maquiagens por aplicativos, em pouco tempo vai ser o padrão do mercado”, diz José Sarkis Arakelian, especialista em estratégias de marketing da FAAP. “Isso vai ser parte da jornada da compra.” Há menos de meio século, o cenário atual pareceria um filme futurístico. Agora, esse é o momento de as empresas se perguntarem: “Espelho, espelho meu, existe tecnologia mais bela do que a minha?”