“O prazo de validade da sua empresa está vencendo. Se você não mudar o seu modelo de negócios e de gestão, sua operação não passará de dois anos. Desculpe-me pela crueza das palavras, mas alguém precisa fazer esse alerta. Sua empresa está me lembrando aqueles tradicionais tanques russos T72B3M, de quase 50 toneladas, que não estão resistindo aos modernos mísseis antiblindagem usados pelos ucranianos!”

Com essas palavras recebi a liderança de uma grande empresa familiar brasileira para um café da manhã, em um hotel no Rio de Janeiro. Ele concentrava em si as responsabilidades de ser o principal acionista, presidente do Conselho de Administração e CEO da organização.

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A conversa foi pesada e teve momentos tensos. Entretanto, eu tinha feito meu dever de casa e levei material, demonstrando o círculo vicioso no qual a empresa dele se encontrava, formado por perda de receita, rentabilidade decrescente, caixa abaixo da linha saudável, endividamento alto, clientes se afastando, concorrentes se aproximando, equipe interna pouco profissionalizada e insegura, entre outros fatores.

Como é difícil argumentar contra dados e fatos, o gestor ficou mais acessível a ouvir e pensar. Eu não sentia nenhum prazer em tratar daquele assunto e, tampouco, de falar daquela forma, mas tinha refletido muito sobre a situação da empresa e decidi dizer o que estava pensando de forma clara, porém, elegante, e não o que ele gostaria de ouvir.

Me sentia como um médico ao revelar para o paciente que suas taxas de glicemia, colesterol e pressão arterial estão funcionando como uma bomba relógio destinada a um AVC ou infarto fulminante.

Somente consegui relaxar quando ele tocou no meu antebraço e disse: “grato pela coragem de conversar assim comigo. Percebo que está preocupado, mas deixe-me tranquilizar você, pois a analogia com os mísseis e os tanques soviéticos foi perfeita. Minha fortaleza está sendo bombardeada, mas, além dos mísseis externos, meu negócio está sendo atingido também por algumas granadas internas da própria empresa. O que devo fazer?”.

Aí, enumerei para ele sete alavancas que podem ajudá-los a virar o jogo no negócio deles, que atua no B2B2C. Ou seja, a fábrica produz bens vendidos a distribuidores que, por sua vez, vendem para consumidores:

  1. Conheça com profundidade os usuários dos seus produtos. Vocês têm se limitado a trabalhar com distribuidores e pouco conhecem os hábitos dos consumidores. Precisam entender suas expectativas, desejos, hábitos de compra e de consumo, bem como os benefícios que esperam. Esses usuários não compram apenas produtos. Compram benefícios e soluções. Seu negócio é B2B2C, mas vocês tem parado no B2B. Precisam ir até o “C” – o Consumidor!
  2. Estreite a proximidade com seus distribuidores. Vocês os tratam como CNPJ e e não estão familiarizados com as dificuldades dos seus distribuidores. Consequentemente, não têm ajudado a eles vender mais e melhor. É necessário treinar e capacitar as equipes de vendas dos distribuidores para isso. Ajude o distribuidor a melhorar o atendimento ao cliente.
  3. Mude o seu modelo de negócio. Após conhecer melhor seus consumidores e aprofundar relacionamento com os distribuidores, você estará mais apto a ajustar o modelo de negócio da sua empresa, que funcionou no passado, mas está perdendo relevância no momento e ficará ultrapassado em dois anos.
  4. Assegure a qualidade do seu produto. A pergunta é direta: os funcionários da sua empresa estão consumindo os produtos que fabricam? Cada um deles aceitaria comprar o produto da forma como está saindo da fábrica? O que falta para melhorar?
  5. Garanta a produtividade e a eficiência operacional. Só assim você poderá segurar os preços, pois já basta o aumento crítico nos custos de insumos e combustíveis, além da elevada taxa de juros que vocês pagam dos bancos. Se tiver de aumentar os preços ainda mais devido à ineficiência interna, você sairá mais cedo do mercado.
  6. Treine e capacite. Sua área de recursos humanos precisa entender que patrimônio humano não é sinônimo de folha de pagamento. Assim, precisa investir nos funcionários que ficam no “chão da fábrica”, mas também nos revendedores e no “chão das lojas” dos distribuidores.
  7. Profissionalize sua empresa. Certamente, a parte mais sensível da conversa foi mostrar a necessidade de promover pessoas competentes, com base na meritocracia. Além disso, é imprescindível estruturar melhor a governança, para que não engesse a empresa e traga oxigênio para o processo decisório. No exemplo dessa empresa, o mesmo indivíduo desempenha os papéis de acionista, chairman do Conselho e de CEO da empresa há anos. As três funções concentradas em uma só pessoa, como se fosse a “Santíssima Trindade”.

Essas sete sugestões não são genéricas. Embora saibamos que cada caso é um caso, elas servem para ilustrar as complexas e delicadas iniciativas que os líderes precisam tomar para garantir o amanhã das suas empresas nesse momento intenso, veloz e repleto de incertezas que constituem o atual ambiente corporativo.

Quem não for protagonista dos acontecimentos, estará se condenando a ser coadjuvante do protagonismo de terceiros.

César Souza é presidente da Empreenda, consultor e palestrante em Estratégia, Liderança, Clientividade e Inovação. Autor de diversos best sellers e do novo livro “O Jeito de Ser Magalu” (Rocco,2021).