Desde que foi levado para o Irã no domingo (5), o caixão do general Qassem Soleimani desfilou em meio a multidões em várias partes do país, imagem que dá uma ideia da popularidade do militar, e que não se limitaria aos partidários do regime.

Unidos em luto, revolta e oração, dezenas de milhares de iraquianos foram a Ahvaz (sudoeste) e a Mashad (nordeste), no domingo, assim como a Teerã e a Qom (centro), na segunda-feira (6), para prestar uma homenagem ao militar.

Morto na sexta-feira aos 62 anos por um drone americano em Bagdá, o general foi enterrado em sua cidade natal, Kerman, nesta terça-feira (7).

“A última vez que me lembro de tanta gente foi nos funerais do imã Khomeini”, disse à AFP Maziar Khosravi, ex-chefe da seção de Política do jornal reformista “Sharq”.

O aparecimento da unidade nacional mostrada em torno de Soleimani contrasta com o clima de apatia instalado por um mês e meio no país, após a onda de protestos violentamente reprimidos e que se espalhou por cerca de 100 cidades em novembro.

Chefe da Força Al-Quds, uma unidade de elite encarregada das operações estrangeiras da Guarda Revolucionária (o exército de elite iraniano), o oficial era o arquiteto da estratégia expansionista do Irã no Oriente Médio.

– Arash, o arqueiro –

Tão discreto quanto poderoso, impecavelmente vestido, ele era popular em vida. Em outubro, o Instituto de Estudos Internacionais e Segurança da Universidade de Maryland (Estados Unidos) chegou a afirmar que era a personalidade mais apreciada do Irã, com uma média de oito opiniões favoráveis a cada dez.

Declarado “mártir vivo” pelo guia supremo, aiatolá Ali Khamenei, antes de seu assassinato, Soleimani é considerado em seu país como um herói pela luta travada contra os extremistas do grupo Estado Islâmico (EI) no Iraque e na Síria.

Aos olhos de muitos iranianos, sua ação permitiu que a nação multiétnica evitasse a desintegração que Iraque, Síria e Afeganistão viram chegar às suas portas.

Na multidão que chorou na segunda-feira em Teerã, muitos foram os que o saudaram como o “vencedor do terrorismo”.

Ele é comparado a um “comandante a serviço do Islã”, ou mesmo a Arash, o herói do “Livro dos Reis”, o grande épico iraniano escrito no século X e fundador da literatura persa que estabeleceu a fronteira ao disparar uma flecha de seu arco.

Congregações em sua memória também ocorreram fora do Irã, estendendo-se a Bagdá, Beirute e Sanaa.

Em um gesto incomum, uma mesquita em Qom, cidade sagrada xiita e capital espiritual iraniana, hasteou em sua homenagem uma bandeira vermelha (cor do sangue dos mártires), geralmente reservada para celebrações ao mártir imã Hussein, uma das figuras sagradas mais reverenciadas do xiismo.

Tanto em Teerã quanto em Ahvaz, capital da província de Khuzestão (um dos grandes focos dos protestos de novembro), “grupos sociais muito diferentes estavam presentes para a homenagem ao general, e não apenas apoiadores do regime”, observa Khosravi.

Para o jornalista, isso se explica, principalmente, pelo fato de “Soleimani ser o único comandante da Guarda que não interveio no cenário político doméstico”.

“Também mostrou empatia pelas mulheres consideradas mal cobertas pelo véu, segundo o sistema político iraniano, estimando que elas não deveriam ser rejeitadas por causa disso”, completou.

“A maioria do povo iraniano acha que seu orgulho nacional foi pisoteado”, acrescentou Khosravi.

– Na primeira linha –

Como muitos outros, o advogado Hassan Razavi chegou para homenagear os restos mortais do oficial na segunda-feira na capital e compartilha dessa opinião.

Para Razavi, a principal razão para a extrema popularidade do militar deve ser explicada por seu passado, durante a guerra Irã-Iraque (1980-1988), onde, como um dos principais militares iranianos, desempenhou “um papel importante para expulsar Saddam Hussein do país”.

“O que as pessoas gostam é que, ao contrário de outros comandantes militares, que após a guerra foram para a política ou para a economia, ele continuou nas Forças Armadas. As pessoas testemunham que nunca teve o menor benefício financeiro pessoal de sua situação”, explica.

“Ao contrário, ele dedicou sua vida e suas ações à defesa do Irã … na linha de frente com seus soldados”, reforçou Razavi.

Segundo o advogado, ele era “muito duro com terroristas, mas mostrava grande bondade para com as pessoas comuns”.