Uma leitura dos números das exportações brasileiras revela que a poderosa China continua sendo, literalmente, o fiel da balança comercial do País. Entre janeiro e maio deste ano, os chineses importaram o equivalente a US$ 17,2 bilhões do Brasil, quase 10% a mais do que em 2011 ou 17,6% de tudo o que o País exporta para o resto do mundo. O apetite chinês pelos produtos brasileiros mostra que o gigante asiático está em plena forma, embora comece a reconhecer os sinais de um processo de desaceleração econômica. O índice de gerente de compras, que mede o desempenho da atividade de manufatura do país, por exemplo, teve a primeira queda depois de cinco meses de expansão, saindo de 53,3% em abril para 50,4%, em maio. 

 

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Já no primeiro trimestre, o crescimento do PIB de “apenas” 8,1%, diante dos 9% alcançados em 2011, mostrava um fôlego um pouco mais curto neste ano. Com a recessão nos países europeus, que reduziram suas encomendas, os chineses voltam-se para seu gigantesco mercado interno de 1,2 bilhão de pessoas, e se preparam para criar políticas de incentivo ao consumo, o que tende a beneficiar a produção agrícola brasileira, principalmente no segundo semestre. “A China vai importar cada vez mais comida”, diz Charlie Tang, presidente da Câmara Brasileira de Indústria e Comércio da China (Cbic). “Ao contrário do que se pensa, a economia chinesa não vai despencar.” 

 

Com US$ 3,3 trilhões em reservas cambiais – quase nove vezes mais que o Brasil – e uma dívida pública de 35% do PIB, o país tem, na verdade, muita pólvora para gastar, caso a economia caia para um ritmo indesejável. “Há margem para se fazer muitas coisas”, diz Gary Hufbauer, do Peterson Institute for International Economics, de Washington, especialista em Ásia. “A China vai alocar a maior parte dos incentivos para setores estratégicos, como o de alta tecnologia.” No fim de maio, o conselho de Estado, presidido pelo premiê Wen Jiabao, anunciou que sete setores industriais serão beneficiados, dentre eles, tecnologia, veículos, meio ambiente e novos materiais. 

 

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Murilo Ferreira, presidente da vale: “Veremos o fôlego chinês

nos próximos meses. Estamos confiantes.” 

 

Vinte projetos serão priorizados para aquecer esses sete setores. Trata-se de uma boa notícia para o mundo, em meio a um ano difícil para o comércio global, e ainda com as cotações das commodities em queda. Dessa forma, a nação asiática pode ajudar a atenuar os impactos da crise internacional para o Brasil, a exemplo do que ocorreu em 2009. Murilo Ferreira, presidente da Vale, se mostra otimista com a retomada econômica de seu principal cliente. “O governo da China trabalha com um crescimento de 7,5%, mas nós acreditamos em 8,5%”, afirma. Ferreira cita investimentos chineses em ferrovias e habitação como exemplos da retomada dos gastos em infraestrutura. “Veremos esse fôlego nos próximos meses, estamos confiantes.” 

 

A China respondeu por 31,4% das receitas da Vale no primeiro trimestre deste ano. As compras de minério, entretanto, já retratam a queda na cotação. Nos primeiros quatro meses do ano, o País manteve o volume de vendas do ano passado. Os preços, porém, registraram uma baixa de 19%. “Será um ano mais ameno”, diz José Augusto Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). O único produto que tem passado incólume pela crise é a soja cujo preço disparou com os problemas climáticos que atingiram a Argentina e o Brasil, dois dos principais produtores mundiais. 


A China se aproveitou do papel de maior parceiro comercial do País para garantir a compra da soja nacional. “Houve uma antecipação de embarques”, diz Castro, da AEB. Até abril, as vendas da soja haviam crescido 39%. O presidente da AEB vê esses números com cautela. “O resultado deve cair depois das compras antecipadas.” Tang, da Cbic, discorda. “A população rural continua migrando para as cidades, o que vai demandar mais e mais alimentos.” Na terça-feira 5, o índice de gerente de compras do setor de serviços, divulgado pela Federação de Logística, registrou alta pelo 19º mês seguido, apontando expansão de demanda no mercado interno. 

 

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Colaborou: Luís Artur Nogueira