As ações da Vale interessam a todos que têm algum dinheiro em bolsa. A empresa é a segunda mais representativa no Índice Bovespa. Suas ações ordinárias e preferenciais respondem por 13,36% do índice (a Petrobras representa 13,37%), e estão, direta ou indiretamente, nas carteiras de cerca de 1,2 milhão de investidores.
 

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Mina da vale: a mineração é mais rentável do que a siderurgia 

Por isso mesmo, muita gente se assustou no início da semana, quando a mineradora anunciou a saída de Fabio Barbosa, diretor financeiro e de relações com investidores da companhia. A saída foi noticiada discretamente após o jogo do Brasil com o Chile, quando o movimento da bolsa praticamente se interrompe. Mesmo assim, as ações recuaram 2%.

No dia seguinte, outra baixa de quase 5% por causa da notícia de que a China, o mercado que mais compra o minério da Vale, estava revisando para baixo suas estimativas de crescimento econômico de 1,7% para apenas 0,3% em abril. Em junho, a queda acumulada é de 12% para as preferenciais e de quase 13% para as ordinárias, com direito a voto.

O que está acontecendo com a Vale? Uma turbulência passageira ou um movimento estrutural? “As ações vêm apresentando um desempenho ruim essencialmente em razão das más notícias da Ásia”, diz Clodoir Vieira, economista-chefe da corretora Souza Barros. “China, Japão e Coreia do Sul representam mais de 50% do faturamento da mineradora e qualquer sinal de desaceleração das economias asiáticas repercute imediatamente nas cotações.”
 

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Barbosa (à esq.) e Agnelli: uma parceria de oito anos, encerrada de forma discreta na semana passada
 

Os problemas da China são graves, mas devem ser de curto prazo. “A demanda do setor de construção civil chinês deverá continuar aquecida por mais alguns anos”, aponta Rodrigo Fernandes, analista da corretora Fator. Ele avalia que cerca de 200 milhões de chineses vão migrar do campo para as cidades nos próximos dez anos. “Essa multidão vai ter de morar em algum lugar, o que vai manter o setor de construção civil aquecido, puxando a demanda pelo minério da Vale.”

Na prática, o mercado se preocupa mais com as razões para a saída de Barbosa e o que isso vai significar na estratégia da companhia de agora em diante. O risco maior é que a saída de Barbosa, que será substituído por Guilherme Cavalcanti, tenha sido fruto das pressões de Brasília para alinhar a Vale, uma empresa privada, com as estratégias do governo. A companhia e o executivo  não deram declarações.

No mínimo, a saída representa a perda de um executivo competente. Barbosa vinha comandando as finanças e a interlocução com os investidores da Vale desde abril de 2002. Nessa época, o presidente Roger Agnelli o trouxe do Tesouro Nacional, onde foi secretário-executivo durante parte do segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

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No mercado, a atuação de Barbosa sempre foi elogiada. “Ele manteve os canais de comunicação com o mercado abertos em todas as aquisições da Vale”, diz Fernandes, do Fator. Mais do que isso, Barbosa era identificado com uma gestão da Vale voltada para a geração de valor para o acionista. Nos últimos meses, a empresa tem sido cada vez mais instada a investir em negócios de menor rentabilidade, como a siderurgia.

E a vantagem da mineração sobre a indústria do aço pode ser facilmente demonstrada. Um dos principais indicadores usados pelos analistas é a relação entre o valor de mercado de uma empresa e sua geração de caixa. Esse indicador, conhecido pela sigla EV/Ebitda, mostra em quantos anos o caixa gerado por uma empresa seria igual a seu valor de mercado.

Quanto menor o número, mais dinheiro a empresa gera – e melhor o negócio, portanto. “Esse múltiplo para a Vale é de cinco anos, e a média da siderurgia oscila entre oito e nove anos”, diz Luis Nuin, analista da corretora Fator. Ou seja, para os acionistas – que são os empregadores de Agnelli e eram os de Barbosa – investir em siderurgia nem sempre é o melhor negócio. A saída de Barbosa pode indicar que a Vale perdeu uma peça de resistência.